Nas rodas políticas de Brasília o que se fala é que, em queda livre nas pesquisas, que hoje o situam com menos de 22% de aprovação, Bolsonaro já estaria cogitando em desistir da disputa pela reeleição para buscar uma cadeira na Câmara ou no Senado. Dizem que assessores próximos estariam cochichando em seu ouvido que essa seria uma boa opção.
Difícil acreditar, primeiro, que algum assessor tenha a coragem de cochichar um absurdo desses no ouvido dele. Seria repelido a tapa ou à bala. E, segundo, que Bolsonaro, com seu proverbial orgulho e aquela empáfia de boneco de Olinda aceite descer do pedestal onde o acaso o colocou para retornar à planície do Parlamento, onde nunca deveria ter estado e sempre foi um zero à esquerda. Até porque, de volta ao Congresso, seria infernizado dia e noite pela oposição e até por antigos aliados com a exibição ostensiva do rol de seus fracassos à frente da presidência da República. Há de se lembrar que a imunidade parlamentar é um bom anteparo para quem está debaixo de uma saraivada de processos em foros nacionais e internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Tribunal de Haia, entre outros, onde correm processos contra ele. Mandatos parlamentares sempre serviram de anteparos às punições aplicáveis ao comum dos mortais. Basta olhar para o ex-ministro da Saúde e líder do governo Ricardo Barros (PP-PR), que está onde sempre esteve, apesar das provas e dos indícios de envolvimento em falcatruas na aquisição das vacinas.
Ocorre que, mesmo desapeado da presidência, Bolsonaro continua contando no Congresso com apoios muito mais sólidos do que o que consegue contar neste momento junto à opinião pública. Não por outra razão criou a versão da possibilidade da fraude nas urnas eletrônicas e várias vezes se referiu à possibilidade de não aceitar o veredito das urnas de 2022 se elas lhe fossem desfavoráveis. Porque sabe que aquela cadeira é o que lhe garante a impunidade. Com a cabeça a prêmio aqui e alhures, despido do manto presidencial, Bolsonaro corre sérios riscos de receber uma ordem de prisão como as que foram aplicadas a aliados próximos, como o ex-deputado Roberto Jefferson, aquele que apareceu nas redes sociais fantasiado de Rambo depois da gripe desancando o STF, e o blogueiro Allan dos Santos, o terraplanista fakeiro, preso e processado por pregações golpistas.
Dinheiro é bicho forte
Mas é bom considerar, em favor da ideia de Bolsonaro disputar uma cadeira no Parlamento, que pesquisas recentes, como a realizada pelo site Congresso em Foco, com uso do método Delphi (baseado em consultas a especialistas, e não na simples aferição de tendências junto à opinião pública), indicam que ele teria, hoje, 75% de chances de concluir o atual mandato. Isto levando em conta, é claro, o perfil do atual Congresso, onde dormitam os mais de cem pedidos de impeachment, e é o único poder em condições de impor seu afastamento. Aliás, é sempre bom lembrar que, se a erosão da popularidade de Bolsonaro já leva assessores dele a comentar em off que o melhor seria disputar uma cadeira no Congresso do que insistir no segundo mandato à presidência, ele continua tendo no bolso os deputados e senadores que cooptou a peso de polpudas emendas e cargos importantes. Claro que esses parlamentares não se incomodariam, como não se incomodaram até agora, em apoiá-lo em qualquer ação que vise a sua permanência naquela cadeira do Palácio do Planalto. Até que saia de lá para disputar a reeleição ou outro cargo. Como se diz no meu Nordeste, dinheiro é bicho forte…
De qualquer forma, é bom observar os últimos momentos do capitão, para daí tirar algumas conclusões. Os mais recentes foram o recuo estratégico com a carta à nação escrita por Michel Temer; a baixada de bola nas declarações bombásticas contra o STF, principalmente contra o ministro Alexandre de Moraes, provisoriamente esquecido em suas falas no cercadinho; o pronunciamento mentiroso mas discreto e ameno, sem qualquer ataque digno de nota, que fez na abertura da Assembleia Geral da ONU, além da suspensão das motociatas semanais. Como é um impulsivo incapaz de segurar a língua, muito provavelmente Bolsonaro deve estar, finalmente, concordando em ouvir a orientação de algum especialista tipo Steeve Bannon, ex-conselheiro de Trump e seu novo guru depois que rompeu com o filósofo de araque Olavo de Carvalho. Iludem-se os que acham que, adotando um tom mais moderado, Bolsonaro torna-se mais inofensivo. Pelo contrário: é aí que mora o perigo, porque suas ações agora passam a ser planejadas com profissionalismo e com jogadas de longo alcance, que o tornam ainda mais perigoso.
Um compadre das antigas, estudioso do adagiário e das paremiologias gosta de repetir um velho refrão desconfiado: “aí tem…”. Acrescenta: “passarinho na muda não canta”.
E eu completo: quando menino levado some e fica calado demais, pode ir atrás, meu doutor: está fazendo arte. Ou cocô.
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