“Conhecereis a Mentira, e a Mentira vos engambelará”
( J. Messias, 17.28)
Responda depressa: qual é o principal inimigo de Bolsonaro? Ah, essa é fácil: claro que é o PT de Lula. Aliás, seu sonho de consumo é ter o PT como adversário nas eleições de 2022. Já que conta com a polarização para repetir o embate de 2018, seus índices de popularidade estão em alta e até aqui nenhuma força de centro ou centro-esquerda despontou no cenário com musculatura suficiente para enfrentá-lo. Nada melhor do que ter como adversário um partido até hoje atordoado com as denúncias de corrupção – leia-se mensalão, para ficar num único exemplo. E que ainda não teve a dignidade de se redimir de seus erros, condição essencial para se reposicionar com um mínimo de chances de vitória na linha de partida.
Ah, mas há outro adversário que Bolsonaro elegeu como alvo prioritário: o comunismo. Adversário cômodo, não reclama de nada. Está sempre disponível. Pois se até Donald Trump lá nos Estados Unidos já associou Joe Biden ao comunismo, porque Bolsonaro agiria de maneira diferente?
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A mentira vos engabelará.
As duas respostas acima estão corretas. Mas nem de longe se equiparam ao maior inimigo de Bolsonaro, contra o qual ele terça armas diariamente: a verdade, inimigo preferencial e que só tem um incômodo. É um inimigo concreto e por isso terrivelmente perigoso.
Por essa razão o capitão e sua tropa usam todos os métodos de neutralização de seus estragos. De novo, responda depressa: qual é a principal arma que Bolsonaro e seus apoiadores usam contra o inimigo chamado verdade? Adivinhão, acertou de primeira: isto mesmo, é uma velha senhora chamada… mentira.
Bolsonaro vem usando a mentira como arma prioritária e permanente de atuação política, muito mais do que as articulações partidárias, os acertos e conchavos de pé de ouvido, para os quais não tem muito pendor, e muito além até dos artifícios do marketing político.
A mentira associada ao populismo mais rasteiro e diário vêm dando a tônica de sua atuação e explicam a sua subida nas pesquisas mais recentes. Em relação a alguns temas, Bolsonaro não apenas mente, mas se repete na mentira, fiel à tese defendida por Goebbels, o ministro da propaganda de Hitler, segundo a qual uma mentira repetida mil vezes vira verdade.
Indiferente às evidências científicas, aos institutos de pesquisa e aos próprios dados de seu governo, Bolsonaro, por exemplo, nega sistematicamente a devastação da Amazônia, inclusive em fóruns internacionais como a Assembleia Geral da ONU, numa constrangedora e vergonhosa cara de pau diante do mundo.
O pior é que ele mente compulsivamente sobre tudo e sobre todos o tempo todo! Um levantamento feito pelo site de checagem “Aos Fatos” indicou que até o dia 1º deste mês de outubro, ou seja, em 639 dias como presidente, Bolsonaro deu 1.728 declarações falsas ou distorcidas, o que dá uma média de mais de duas mentiras por dia.
Como o nariz dele não cresce como o de Pinóquio, como a população acostumou-se a naturalizar a mentira como prática comum e aceitável pelos políticos e como a justiça não dispõe de meios para impedir que continue usando a mentira como arma política, Bolsonaro continua mentindo. Churchil dizia que a mentira dá uma volta inteira no mundo antes mesmo de a verdade se vestir. E olha que falou isso antes de se imaginar uma engenhoca planetária chamada internet, que impulsiona informações à velocidade da luz, sendo que as falsas correm numa velocidade 70 vezes superior às verdadeiras.
O “mito” (mentira, ele nunca foi mito porque o apelido se deve apenas às suas pernas de “par-mito”) tornou-se o maior mitônomo da história. Quando apanhado na mentira, nega ter dito o que disse. E acusa os que o flagram na mentira de espalharem fake news contra ele. Daí a ojeriza que tem aos jornais e jornalistas, pois esses profissionais podem até errar, mas têm por obrigação profissional o compromisso com a verdade.
Nem um décimo das mentiras de Bolsonaro caberia num espaço como o desta coluna. Já disse e repetiu que não houve ditadura no Brasil. Foi a Jerusalém negar o Holocausto. Diz e repete que os dados do INPE sobre o desmatamento são divulgados propositalmente errados para prejudicar o Brasil. Que o país é exemplo no enfrentamento da covid, mesmo tendo trocado três vezes de ministro da Saúde. E ter desprezado publicamente e continuar desprezando as recomendações mundiais de distanciamento social e de ter jogado na conta dos governadores as 145 mil vidas de brasileiros que foram perdidas para o vírus. Que o trabalho escravo é um exagero. E mais isso e mais aquilo.
É claro que dois mais dois são cinco!
O problema atinge um perigoso grau de gravidade pelo fato de as mentiras saírem da boca do principal mandatário do país, cargo que carrega elevadíssima taxa de credibilidade. Como seus apoiadores só acreditam na palavra do “par-mito”, é praticamente impossível desmentir o arsenal de mentiras proferidas diariamente por ele. Sem falar nas milícias digitais que o apoiam e que diariamente despejam milhões de mensagens fraudulentas nas redes sociais para reforçar o moral dos apoiadores.
De nada adianta saber desde que o diabo usava fraldas que dois mais dois são quatro. Se o “par-mito” disser que a conta está errada e dois mais dois são cinco, seus apoiadores acreditarão nele e espalharão que os que acreditam que dois mais dois são quatro dizem isso para derrubá-lo do poder.
Uma das maiores aberrações dos bolsonaristas foi a imbecilidade de difundir por aí que a Terra é plana. Cacete, só nos faltava essa! Nem o ministro astronauta abriu a boca pra negar essa bizarrice. Basta fazer uma busca rápida na internet pra descobrir a enorme quantidade de “cientistas” bolsonaristas de araque que vêm sustentando o terraplanismo.
E nós, coitados, achando um exagero aqueles malucos lá dos Estados Unidos que não acreditavam que o homem esteve na Lua e que aquelas imagens da TV foram produzidas pelos criadores de efeitos especiais de Hollywood. O que prova que a verdade, sim, é que tem pernas curtas. A mentira, não. Ela tem mesmo são longas e rápidas pernas, que lhe permitem dar a volta à Terra enquanto a verdade se veste. Ou enquanto Bolsonaro bate continência.
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