Desde criança eu gosto de política. Início dos anos 1980, assistia às declarações oficiais do Ministro Delfim na televisão afirmando que o Brasil lidava bem com a crise, que produzia os dólares necessários para superar o desafio cambial. Acompanhava também com interesse as discussões sobre política que os adultos tinham, provavelmente mais livres na ocasião, impulsionados pela abertura democrática. Lembro bastante também da campanha das Diretas Já, da vitória de Tancredo no colégio eleitoral e do profundo pesar de todos com aquela morte altamente simbólica. Curiosamente não tenho lembranças do período constituinte, afora uma grande palestra ocorrida na escola, em que centenas de alunos no pátio ouviam o que seria uma constituinte e uma constituição.
De lá pra cá acompanhei com muito interesse a eleição de 1989, com a vitória de Collor, a URV (e medos surgiram pois me lembrava do finado Plano Cruzado e vários outros), o primeiro governo FHC e suas políticas públicas – naquele momento eu entrava na vida profissional, especificamente no governo federal. Marcante a vitória de Lula, quando me parecia, e provavelmente para milhões de nós, que uma nova etapa da política começava no país. No entanto, em 2006 já me frustrava com os erros de um governo que matava a esperança ao repetir práticas do passado. Depois disso, muito imerso na vida profissional, a crônica fica miúda, com uma infinidade de fatos a preenchê-la, dos quais agora é melhor poupar o leitor.
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Contudo, o que desejo destacar é que no Brasil se fez política desde que eu passei a entender os acontecimentos. Quando olhávamos para a alta esfera, a presidência da República e seus adversários ou apoiadores, havia um debate. O plano econômico terá sucesso? As privatizações estão corretas? Quais os desafios na educação? Estamos lidando com a pobreza da forma correta? A esperança podia desfalecer momentaneamente, mas as grandes questões se sucediam.
Tudo isso foi esquecido no período Bolsonaro. Quando desejávamos saber o que aconteceria da Amazônia desmatada ou do Pantanal em fogo aberto, o foco estava em alguma micro questão milhares de quilômetros distante. O maior problema de saúde pública que conheci em minha vida era, e ainda é, tratado pelo governo em suas bordas, em questiúnculas que alimentam apenas teorias da conspiração. Fake News, “realidades alternativas”, passaram a ser o problema do momento, o sorvedouro da ignorância e da má fé travestido em “opinião”.
O resultado cabal é que a política grande se perdeu. Podemos chamar de política a busca de votos via factóides, querelas vazias e discursos do mundo da lua, afinal, de votos se fazem governos. No entanto não podemos dizer que se discute o bem-comum, o futuro da sociedade, as transformações que ocorrem e nos cobram posicionamento. É a política de baixa estatura, rasteira, a que nos envergonha em praça pública.
Minha esperança assenta-se agora na corrida eleitoral, saber se a política de verdade voltará a acontecer por aqui. Tudo indica que 2022 ainda nos trará boa dose do pauperismo de 2018, em que acusações sem provas, invenções e mentiras de toda ordem formarão a disputa abaixo da cintura.
Contudo, diante dos desafios que nossa sociedade enfrenta, e da esperança de um futuro tratado com responsabilidade, anseio pela volta da Política. Que eu discorde do que ela apresentar será um mal menor, mas que ela ressurja, que nossas cabeças possam se erguer da lama da mediocridade em que se encontram.
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Ricardo, torço mesmo para que a volta da política inclua o debate de um plano de governo. E diria mais: de um que considere soluções do séc. XXI. Como dizia um consultor que conheci nos anos 1990: “crie o caminho. O que passou é só referência”. Penso que o Brasil tem de ultrapassar essa pequenez de girar sempre em torno de um nome. “Fulano para derrubar Beltrano”; “Sicrano é a única solução”. Estou cansada disso tudo.