O presidente em exercício do Tribunal de Justiça de Alagoas, desembargador José Carlos Malta Marques, derrubou nesta sexta-feira (29) a decisão de uma juíza de primeira instância que havia suspendido a eleição indireta para a escolha do governador-tampão do estado, prevista para a próxima segunda-feira (2). O desembargador atendeu a um pedido da procuradora-geral do Estado, Samya Suruagy, que alegou que o adiamento da disputa por tempo indeterminado poderia causar graves lesões à ordem pública jurídico constitucional e administrativa de Alagoas.
A eleição foi suspensa na quarta-feira (27) após o PSB entrar com uma ação questionando a constitucionalidade do pleito. O advogado do partido, Henrique Vasconcellos, entrou com um mandado de segurança para reverter a decisão do desembargador. Ele adiantou ao Congresso em Foco que vai recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). A eleição indireta é uma prévia da disputa de outubro e acirra a rivalidade entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), e o senador Renan Calheiros (MDB).
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O PSB sustenta que há inconstitucionalidades e ilegalidades nas regras definidas pela própria Assembleia Legislativa para a eleição do dia 2. Entre os pontos apontados estão a obrigatoriedade do voto aberto, a realização de eleições separadas para governador e vice e a decretação da vitória por maioria simples. Os argumentos foram rebatidos pela Procuradoria-Geral do Estado e acolhidos pelo presidente interino do Tribunal de Justiça.
Segundo a procuradora-geral, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente, numa Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que a unidade federativa tem autonomia para estabelecer as regras para eleições indiretas para os cargos de governador e vice, como é o caso de Alagoas.
“Na verdade, o legislador estadual exerce sua competência legislativa para tratar sobre organização dos poderes, dentro do âmbito da autonomia constitucionalmente atribuída para regrar o modelo e o procedimento da eleição indireta”, argumentou Samya Suruagy. A lei que estabeleceu a forma de votação foi aprovada pela Assembleia em janeiro deste ano. A contestação, no entanto, só foi apresentada esta semana.
Na última quarta-feira, a juíza Maria Ester Fontan Cavalcanti Manso, da 18ª Vara Cível da Capital, determinou que a Assembleia suspendesse a eleição e que o governador em exercício, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Klever Loureiro, continuasse no cargo. De acordo com a Constituição Federal, quando há vacância de governador e vice, na segunda metade do mandato, a escolha dos substitutos deve ser feita por votação indireta, com participação exclusiva de deputados.
Filho do senador Renan Calheiros, o governador eleito em 2018, Renan Filho (MDB), renunciou ao cargo para disputar uma vaga do Senado em outubro. O estado não tinha um vice-governador, pois Luciano Barbosa (MDB) foi eleito prefeito da cidade de Arapiraca em 2020.
Pela linha de sucessão, o presidente da Assembleia Legislativa, o deputado estadual Marcelo Victor (MDB), assumiria o governo do estado. No entanto, o parlamentar renunciou ao cargo, pois tentará a reeleição de deputado estadual. Se assumisse o governo, ficaria impedido de tentar novo mandato no Legislativo. Com isso, a chefia do Executivo recaiu sobre o presidente do Tribunal de Justiça.
Ao todo, foram registradas até o momento 16 candidaturas a governador e seis para vice. Para se candidatar ao mandato-tampão, o postulante não precisa ser filiado a partido político, basta ter 30 anos e apresentar certidões negativas na Justiça. Os candidatos eleitos ficarão no cargo até 31 de dezembro de 2022.
A confusão criada em torno da eleição indireta indica como será disputada a eleição de outubro entre os dois políticos mais poderosos do estado: Renan Calheiros e Arthur Lira. O candidato de Renan e do ex-governador Renan Filho nas duas eleições é o deputado estadual Paulo Dantas (MDB). O prefeito de Maceió, JHC, é do PSB, partido que pede a suspensão da votação. Ex-deputado federal, JHC é aliado de Lira e adversário do grupo político da família Calheiros. O prefeito e o presidente da Câmara vão apoiar a candidatura a governador, em outubro, do senador Rodrigo Cunha, que recentemente trocou o PSDB pelo União Brasil, partido controlado por Lira no estado.
Interlocutores de JHC e Lira tentam barrar a eleição indireta de Paulo Dantas por temer que, no comando da máquina administrativa, com a visibilidade e outras benesses que o cargo oferece, ele assuma o protagonismo da disputa em outubro e se eleja, mantendo o estado sob o comando da família Calheiros. A eleição de Dantas, que exerce o seu primeiro mandato de deputado estadual, é dada como certa. O seu partido, o MDB, ocupa 17 das 27 cadeiras da Casa. Ou seja, ele só perderá a disputa se houver traição entre os emedebistas, já que basta a maioria simples (14 votos) para vencer o pleito. Aliados de Renan afirmam que a intenção de Lira e JHC era dar um golpe para manter o presidente do Tribunal de Justiça no comando do estado, como forma de fortalecer a candidatura de Rodrigo Cunha.
Apesar da liminar da juíza, o presidente da Assembleia, Marcelo Victor (MDB), havia mantido a eleição para segunda-feira. O PSB entrou, então, com pedido na Justiça para que policiais fossem deslocados para a sede do Legislativo para impedir a realização da votação, em cumprimento à determinação da magistrada.
O advogado do PSB, Henrique Vasconcellos, prepara recurso a ser apresentado ao STJ. “Há ataque frontal ao devido processo legal. A chapa para governador e vice teria de ser única, não pode haver eleição para governador separada da eleição para vice. É muito curto o prazo para contestação e defesa de candidatura. A eleição deveria ser feita por maioria absoluta, jamais simples. Também deveria ser por voto secreto. Há flagrante inconstitucionalidade e violação ao regimento interno da Assembleia”, disse o advogado ao Congresso em Foco.
A reportagem procurou Renan e Arthur Lira, mas nenhum deles quis se manifestar sobre a eleição indireta.