Ninguém nega que o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro foi decisivo para a votação e eleição de Tarcísio de Freitas, até então totalmente desconhecido no estado de São Paulo.
É também inegável que Bolsonaro tem apoio majoritário dos componentes das forças de segurança no Estado – polícia civil, militar e guardas municipais e que seus eleitores, quase sem exceção, querem uma polícia fundamentalmente repressiva.
Esse expressivo apoio não decorre de nenhuma proposta concreta de atuação, uma vez que Bolsonaro e os políticos que o apoiam se limitam a dizer, genericamente, que a polícia deve ser prestigiada e valorizada e que o crime deve ser combatido com rigor.
Apesar desse discurso genérico, o fato é que em quatro anos de governo, Bolsonaro não tomou nenhuma medida concreta para a valorização dos quadros policiais ou mesmo para o combate ao crime, limitando-se a facilitar a aquisição de armas à população civil, o que, como era previsível, só aumentou a facilidade de acesso a armas pesadas e com alto poder vulnerante para as organizações criminosas.
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De resto, a demonstrar a ausência de visão prioritária, nos quatro anos de governo o número de policiais em serviço diminuiu de maneira expressiva, de acordo com matérias publicadas nos principais jornais no final de fevereiro.
Ora, se sequer houve reposição de quadros, é evidente que as condições de trabalho dos policiais só pioraram, apesar das reiteradas promessas de prestígio.
PublicidadeEm verdade, ao longo dos últimos quatro anos, além da “terceirização” da segurança com a facilidade de acesso a armas das “pessoas de bem”, o que se viu foi a tentativa de restringir, felizmente sem sucesso, medidas corretíssimas, tais como as audiências de custódia e o uso de câmeras corporais.
Pois bem. Passado mais de ano de ano de sua posse, já é possível se avaliar o governo estadual na área da segurança pública.
O saldo é bem negativo a demonstrar que o suposto endurecimento no combate ao crime não dispensa estratégia e planejamento.
O governador Tarcísio, que, em alguns momentos, procura se diferenciar de seu criador com um comportamento mais civilizado, na área da segurança não tem nenhum constrangimento em repetir a narrativa bolsonarista.
Durante a campanha, é bom lembrar, criticou o uso de câmeras nas fardas.
Eleito, deixou de investir no programa que, diga-se, tem (ou pelo menos tinha) o apoio do comando da Polícia Militar e que redundou na diminuição da letalidade nas operações policiais.
A escolha de Guilherme Derrite para o cargo de Secretário da Segurança é sintomática.
Derrite, por diversas vezes, disse que um bom policial deve, necessariamente, ter em seu prontuário a morte de civis em confronto (é verdade, que, ao invés de civis, usa a palavra marginais ou bandidos). Orgulha-se, a propósito, de seu próprio prontuário.
O suposto rigor nas ações policiais não produziu nenhuma diminuição na criminalidade.
Ao contrário, o aumento de crimes contra o patrimônio- furtos, roubos e latrocínios-, durante a gestão Tarcísio/Derrite, é sentida por toda a população das principais cidades do Estado.
Aliás, o governador, para justificar os péssimos índices de criminalidade, chegou a sugerir que o problema estava nas saídas temporárias (aqui é oportuno dizer que só tem direito a saída temporária quem já progrediu para o regime semiaberto e, portanto, já cumpre parte da pena fora do regime carcerário).
Em verdade, só retórica dura não produz qualquer efeito na diminuição da violência.
Também em São Paulo não há reposição nos quadros policiais, pelo que o efetivo policial só diminui o que tem, como consequência lógica, a queda na qualidade do serviço (ninguém ignora o martírio que é um simples registro de ocorrência).
Recentemente, o secretário fez profundas modificações nos principais comandos da Polícia Militar, o que, ao menos à primeira vista, sugere o reconhecimento de pouca eficiência no seu primeiro ano na Secretaria da Segurança.
É cedo, ainda, para qualquer análise, mas o certo é que Derrite, ao promover as mudanças, questiona um dos pontos mais respeitados, desde sempre, na Polícia Militar: o respeito à hierarquia.
Um destaque especial merece a atuação da Secretaria da Segurança na Baixada Santista.
Como é sabido, por conta da morte de policiais em serviço, duas operações foram deflagradas: Operação Escudo, entre 28 de julho e 5 de setembro, e Operação Verão, a partir de fevereiro deste ano e ainda em andamento.
O governo tem dito que a polícia tem agido de maneira profissional e com o uso de inteligência para o combate ao crime organizado.
Diga-se, de início, que a morte de policiais em serviço é, de fato, intolerável, e a prisão dos autores do crime passa a ser questão de honra.
Daí a se dizer que toda conduta é legítima vai uma enorme distância.
Há vários relatos de mortes injustificáveis (verdadeiras execuções) nas duas operações.
O número de mortes – 28 pessoas na Operação Escudo e cerca de 40 na Operação Verão – sugere excesso.
A ausência de câmeras corporais impede que se confira a alegação da cúpula da Secretaria da Segurança segundo a qual todas as mortes se deram em razão de reações injustificadas a legítimas abordagens. A propósito, em depoimento na Assembleia Legislativa, o secretário não teve o menor pudor ao afirmar que a presença de câmeras limita o “trabalho” da polícia.
De outro lado, recentes notícias dão conta que tem sido praxe a não preservação do local e a remoção dos corpos de pessoas já mortas aos hospitais, mais um sério indício de que a tropa, respaldada pelo discurso Secretário da Segurança e do próprio Governador do Estado, age sem seguir os protocolos estabelecidos pela própria corporação.
Em boa hora, o então procurador-geral Mário Sarrubro constituiu grupo de trabalho no Ministério Público do Estado de São Paulo para acompanhar a atuação policial nas duas operações na Baixada Santista.
Ao contrário do que já foi dito, o controle externo da atividade policial é tarefa que cabe ao Ministério Público, pelo que não há aqui qualquer interferência descabida na atuação da polícia.
Em suma: os índices de criminalidade, máximos no que se refere aos crimes contra o patrimônio, não favorecem o governo, assim como a atuação na Baixada Santista, para dizer o mínimo, é bastante questionável.
Aplica-se, pois, ao governador Tarcísio a mesma crítica endereçada ao governo Bolsonaro: só retórica não é suficiente e inexiste, ao menos até agora, uma política de segurança pública.
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