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A ideia em um segundo
As vitórias de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco na Câmara dos Deputados e no Senado Federal trouxeram novas possibilidades ao Legislativo. Nesta edição do Farol apresentamos as previsões de analistas e nossas próprias sobre o que 2021 reserva para o campo político-econômico. Alguma mudança fiscal limitada pode acontecer, assim como mais energia e calor na pauta de costumes. Quanto às reformas estruturantes, pouco otimismo em relação a elas. Já a eleição de 2022 parece ainda estar onde sempre esteve: esquerda fraca e fragmentada, centro indefinido e Bolsonaro desgastado mas apostando nos apoios residuais e em um possível segundo turno contra a esquerda.
A vitória de grupos pretensamente mais alinhados ao presidente Bolsonaro no Senado e especialmente na Câmara dos Deputados pôs em funcionamento a máquina de futurologia político-econômica voltada às reformas, ao equilíbrio fiscal, às eleições de 2022 e outros fenômenos relacionados ao mundo parlamentar. Muitas boas cabeças se manifestaram nas últimas semanas sobre o que pode vir da política nos próximos dois anos. Nesta edição do Farol confrontamos essas previsões e nos posicionamos em relação aos principais pontos de interesse.
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Na boca do vulcão
Dizem os entendidos que, quando se está na boca de um vulcão ativo, a primeira medida de segurança é não tirar os olhos do mar de lava abaixo. As ejeções voadoras de massa incandescente podem acontecer a todo momento e se lançarem em qualquer direção, incinerando um transeunte desavisado. De olhos postos nos maciços de lava voadora, os espectadores preveem sua trajetória e podem se mover para um lado ou outro fugindo do acidente fatal.
Futurologia político-econômica aqui tem sentido positivo. Trata ela de buscar trazer para o presente razões para tomada de posição. Isso não quer dizer que se preveja com certeza o futuro. Como se diz, “diante do melhor conhecimento disponível” a reação deve ser tal ou qual. Assim como os olhos atentos na boca do vulcão, a futurologia política e econômica procura posicionar o interessado em relação a movimentos futuros. Embora não se saiba onde a lava vai pousar, estar alerta permanentemente diminui os riscos de incineração ou perdas de capital econômico e político.
Nesta edição do Farol consideramos as previsões apresentadas pelo professor da Unicamp Marcos Nobre, presidente do Cebrap (em entrevista ao Congresso em Foco), o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman (em entrevista ao Estadão), os professores da FGV Cláudio Couto (entrevista à Agência Pública), Carlos Pereira (em live da FGV-Folha de S.Paulo e entrevista ao Valor) e Samuel Pessoa (em live da FGV-Folha), e da UFPE Marcus Melo (em live da FGV-Folha) e as posições da Eurásia Consultoria (em entrevista ao Valor).
Executivo fraco e base ilusória
Todas as previsões gravitam em torno de três elementos: os problemas do Brasil são muitos, a vitória nas duas casas não configura uma base governista ou reformista e o Poder Executivo apresenta em si próprio diversos problemas de direcionamento e atitude.
É consensual no grupo a visão de que a vitória de Rodrigo Pacheco no Senado e de Arthur Lira na Câmara dos Deputados não caracteriza a formação de uma coalizão de governo ou mesmo de uma coalizão pelas reformas. No caso do Senado, Pacheco obteve o apoio da oposição, e Lira na Câmara amealhou seus 302 votos muito mais em cima de promessas de ganhos imediatos em cargos e verbas do que uma agenda de governo. Como se diz no jargão da Ciência Política ressaltado por Carlos Pereira, montar uma coalizão é bastante diferente de geri-la. No caso, se até a montagem é questionável, aumentam em muito os desafios para uma gestão exitosa.Pontos não tão explorados pelo grupo, mas para nós cruciais, são o compromisso e a capacidade estratégica e operacional do Poder Executivo em conduzir reformas de monta. Algo que já comentamos aqui diversas vezes, a pauta do presidente é eminente destrutiva e, quando propositiva, foca em questões menores e direcionada a seu grupo de apoiadores mais radicalizado. Já a tradicional “casa de força” dos governos reformistas, o Ministério da Economia, tem se mostrado muito aquém da expectativa no governo Bolsonaro. Por falta de liderança e de clareza em seus planos, suas propostas têm surgido atrasadas, tímidas e mal formuladas ou retoricamente megalomaníacas, duas posturas que não incentivam um comportamento adequado dos parlamentares.
Diante de tal ponto de partida, as cruciais reformas não receberam prognósticos positivos dos nossos futurólogos. Nenhum deles vê no horizonte a possibilidade de sucesso de reformas como a administrativa e a tributária. Os vestígios de otimismo encontrados aqui e ali são de algum avanço da reforma administrativa na Câmara e talvez a aprovação de mudanças nas regras do PIS/Cofins apenas, o que está muito distante de configurar uma reforma tributária. Alinhamo-nos a esse otimismo diminuto, pois como já apontamos em outras edições do Farol, ambas as reformas são muito complexas, com muitos grupos discordantes e pontos de veto, um desafio enorme para a frágil base constituída.A questão fiscal, premente em 2021, oscila entre o desmoronamento do teto e a deterioração do ambiente econômico e a construção de uma solução coordenada capaz de preservar as expectativas e apoiar os ainda necessitados da crise pandêmica. Em termos concretos, alguns acreditam que é possível casar um novo auxílio emergencial com regras fiscais positivas de longo prazo, como aprovação de dispositivos da PEC Emergencial ou segregação crível de créditos extraordinários – o que não contaminaria as expectativas. Para nós, essa possibilidade benigna segue a regra da moedinha para o alto, 50% de chances.
Outro ponto ressaltado foi o retorno da pauta de costumes. Diante da perda de popularidade de Bolsonaro, a aproximação das eleições e a dificuldade na economia, a retomada de projetos caros à direita mais conservadora deve ganhar força. Se terá sucesso, os futurólogos apontam não só as dificuldades criadas pela oposição como também uma postura contrária do Judiciário. O que parece claro é que falar de costumes servirá para o presidente e muitos apoiadores como uma cortina de fumaça para os problemas de emprego e renda a serem fortemente sentidos pela população em geral.
Sobre o impeachment, ele paira no ar, mas só pode se consolidar diante da clássica conjunção de crises econômica e política e recrudescimento da impopularidade, o que ainda está longe de se consolidar.
As eleições de 2022
Quanto a 2022, a fragilidade da oposição de esquerda é reconhecida, assim como a derrota do centro não-bolsonarista sobretudo na Câmara dos Deputados. Prevê-se para Bolsonaro perdas significativas de apoio devido ao ambiente econômico ruim em 2021, que pode melhorar um pouco em 2022, e o enfraquecimento de sua base mais radical, hoje acuada. Ainda, vê-se que as próximas eleições devem voltar à natureza usual das eleições brasileiras, quando vai se falar da economia, do desempenho do incumbente na gestão e no trato da pandemia e quando tempo de TV, palanques regionais e recursos financeiros deverão novamente ganhar importância. A natureza polêmica e adversarial de Bolsonaro o prejudicará mais numa eleição “ordinária”, contam.Em resumo, prevê-se uma esquerda fragmentada, um centro não-bolsonarista com grandes desafios para colocar em pé uma candidatura capaz de aglutinar forças, e um Bolsonaro com um desempenho provavelmente ruim em todos os aspectos. Volta assim o velho diagnóstico de que Bolsonaro sonha com um segundo turno contra uma candidatura de esquerda tradicional, se possível do PT, o que será sua grande chance de novamente catalisar emoções e vencer o pleito.
Deixaram a desejar
As previsões mostram que há um profundo fosso entre o que o Brasil precisa e o que a política posta pode lhe oferecer. Os problemas e desafios são enormes, mas o sistema político vira em volta de si mesmo carente de coragem, novas ideias e espírito público. Fragmentação de forças e falta de luzes na gestão e nos planos políticos deverão nos manter naquilo que chamamos semanas atrás de “tempo das gambiarras”, quando perderemos oportunidade de lidar com problemas incontornáveis.
Termômetro
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Geladeira
Arthur Lira assumiu a presidência da Câmara dando um tiro na transparência. Com a decisão de transferir o comitê de imprensa, hoje instalado em espaço contíguo ao plenário, para uma sala longe dos deputados, transmite a mensagem de que quer distância de jornalista. Lira reivindica para si a sala do comitê, mudança que o blindará de responder a perguntas muitas vezes inconvenientes da imprensa no trajeto entre seu gabinete e o plenário. Sua decisão repercutiu mal e é alvo de protestos.
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Chapa quente
A aprovação da autonomia do Banco Central pelo Congresso, após três décadas de discussão, pode fazer de Roberto Campos Neto o seu presidente mais longevo, com mandato até 2027. O neto de Roberto Campos tem demonstrado capacidade de articulação política e tem se destacado em meio a um Paulo Guedes cada vez mais enfraquecido no Ministério da Economia. Em janeiro, foi eleito pela revista britânica The Banker, do Financial Times, o presidente do Banco Central do ano em todo o mundo.
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O Farol Político é produzido pelos cientistas políticos e economistas André Sathler e Ricardo de João Braga e pelo jornalista Sylvio Costa. Design: Vinícius Souza.
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