Ao respaldar manifestação que pedia a volta do AI-5 (veja explicação ao final deste texto) e a intervenção militar contra uma completa ficção, o suposto golpe que o Congresso estaria preparando contra ele, o presidente Jair Bolsonaro voltou a incomodar a cúpula militar.
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Nenhum chefe militar da ativa se manifestou sobre o assunto até o momento em que é publicada esta notícia. Segundo apurou o Congresso em Foco, isso ocorreu por fidelidade ao sentimento de obediência a que os militares se julgam obrigados a cumprir em relação a quem, na condição de chefe de governo, é o comandante máximo das Forças Armadas.
Apesar disso, fontes militares revelaram que o comportamento de Bolsonaro causou desconforto, até pela ideia de empurrar a crise para, literalmente, dentro do Exército. No mesmo dia (19 de abril) em que a instituição completou o seu 372º ano de existência, cujo marco é a data da primeira vitória alcançada contra os holandeses em Pernambuco, o presidente resolveu discursar em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília. Mesmo que o pronunciamento não fosse de ruptura com a ordem constitucional, disseram essas fontes, o local seria inapropriado.
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Oficial reformado do Exército e coordenador das candidaturas de militares nas eleições de 2018, o deputado federal General Peternelli (PSL-SP) aceitou conversar com este site sobre o tema em on – isto é, assumindo a paternidade do que disse e autorizando a sua reprodução.
PublicidadeSempre medindo as palavras, como de hábito, eis suas principais declarações:
Nem AI-5 nem impeachment
“O momento não era para ter aglomerações, no meu ponto de vista, porque a pandemia ainda preocupa. Quanto menos polemizar agora, melhor. Há aqueles que acham que o Rodrigo Maia quer dar o golpe e outros começam a defender o impeachment do presidente da República. Não há motivo nem para AI-5 nem para impeachment. E não tem respaldo para nenhuma das duas coisas no contexto atual. O momento é de se concentrar no combate ao coronavírus. Falar em medida de exceção [como a volta do AI-5] agora não contribui. Não creio em nenhuma medida de exceção desse tipo. Entendo as manifestações, no contexto atual, mas considero que não é adequado se falar agora em impeachment, seja do presidente, seja de governadores ou de prefeito, como alguns têm defendido aí”.
Rodrigo Maia e a Câmara
“Não vou falar em Rodrigo Maia, prefiro falar da Câmara dos Deputados, cujo trabalho acompanho porque estou lá dentro. Vejo que a Câmara desenvolve um trabalho democrático. Gosto do trabalho da Câmara como um todo. Uma coisa boa que aconteceu neste momento de crise foi que o Supremo autorizou um rito mais rápido e muitos projetos bons para o país foram aprovados quase com apoio unânime. Mas é claro que também há problemas. Não considero adequado cair medida provisória, por exemplo. Tem que cair por votação, não porque não foi pautado. A MP da carteira de estudante, por exemplo, eu achava que era boa. O uso do fundo eleitoral para destinar mais algum dinheiro ao combate ao coronavírus, que foi aquela proposta do Novo, também considero algo válido. Mas, de maneira geral, a Câmara faz um bom trabalho e o presidente Rodrigo Maia fez coisas importantes não digo nem para o governo, mas para o país, como foi o caso da aprovação da reforma da Previdência”.
A saída do isolamento social
“Temos que procurar formas de sair do isolamento. Precisamos voltar a trabalhar, produzir, mas isso tem que ser respaldado por uma visão científica, pelo que dizem os especialistas e de acordo com a situação de cada localidade. Cidades como São Paulo têm uma situação mais grave, precisa olhar com cuidado, e há municípios que estão numa situação melhor. Tudo isso precisa ser visto com muita serenidade. Vamos seguir as orientações do Ministério da Saúde, das autoridades sanitárias, mas também vejo que é preciso começar a trabalhar. A própria Câmara ainda não está com as comissões funcionando. Temos que olhar isso. Veja o caso de pessoas que trabalham com aplicativo, por exemplo. A pessoa ganhava R$ 3 mil, R$ 4 mil por mês, claro que R$ 600 [do coronavoucher] é pouco, é uma diferença grande. Temos que pensar na situação delas”.
O comportamento de Bolsonaro
“Não vou polemizar quanto a uma atividade do presidente, isso não vai ajudar em nada. Defendo serenidade e a união para enfrentar o coronavírus. Veja que o governo federal tem uma tarefa grande pela frente. Considerando o auxílio emergencial que será pago durante a pandemia [o chamado coronavoucher], o Bolsa Família e o BPC [benefício de prestação continuada pago pela União a portadores de deficiência e outros grupos vulneráveis], são 70 milhões de pessoas beneficiadas. Não é fácil organizar isso. Tive até uma indicação ao Ministério da Economia, aprovada pelo presidente da Câmara e que será encaminhada ao governo, para que se tente viabilizar ao máximo procedimentos eletrônicos, de maneira a evitar tanto quanto possível aglomerações em agências da Caixa Econômica Federal. Sugiro inclusive que se priorize o pagamento por meio de processos digitais ou cartão, porque o próprio dinheiro em espécie se tornou uma fonte muito grande de transmissão de vírus”.
Executivo e Legislativo devem se unir
“Defendo o apoio do Legislativo ao Executivo federal, mas também aos estados e municípios. A União tem que estar preocupada não é com o estado A, B ou C, mas com todos os 27 estados. Tanto isso é verdade que o próprio governo Bolsonaro mandou uma proposta através do Plano Mansueto, que a Câmara mudou porque neste momento é importante uma ajuda maior. A União vai ter que pensar depois num planejamento para adequar esse apoio, como era o Plano Mansueto originário. O estado tem certas vantagens, mas é obrigado a cumprir pré-requisitos. A conversa tem que ser entre os três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, não só do Congresso com o presidente. E precisa envolver os governadores e prefeitos. A realidade é diferente em cada lugar. São Paulo, que eu represento aqui em Brasília, tem 645 municípios, e eles têm condicionantes diferentes, isso precisa ser olhado. A melhor solução é a conversa”.
O que foi o AI-5
Considerada a mais autoritária de todas as normas legais impostas pelo regime militar de 1964/1985, o Ato Institucional número 5 foi baixado em 13 de dezembro de 1968 pelo então presidente, general Artur da Costa e Silva (1899/1969). Na prática, ele jogou no lixo a Constituição Federal em vigor, dando ao governo poderes para:
– fechar o Congresso Nacional e as assembleias legislativas, como ocorreu logo em seguida à sua edição;
– intervir em estados e municípios para garantir a “segurança nacional”;
– censurar obras e espetáculos artísticos e culturais, sob o pretexto de combater a subversão da moral e dos bons costumes;
– proibir reuniões políticas;
– suspender o instrumento do habeas corpus (que permite garantir a liberdade de alguém que seja alvo de perseguição) para crimes de motivação política;
– cassar mandatos de parlamentares;
– destituir sumariamente servidores públicos ocupantes de qualquer cargo, incluindo políticos eleitos, juízes, membros do Ministério Público e funcionários dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário);
– proibir a revisão judicial de qualquer ato adotado sob o amparo do AI-5.
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