O porta-voz da Presidência da República, general Otávio Rêgo Barros, confirmou há pouco a exoneração do agora ex-ministro Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral), um dos principais coordenadores da campanha eleitoral vitoriosa de Jair Bolsonaro. Em nota curta, o presidente se limita a agradecer pela dedicação do ex-aliado à frente da pasta e a desejar “sucesso na sua nova caminhada”.
Em coletiva de imprensa no Palácio do Planalto, Otávio também se restringiu ao anúncio da demissão. “O motivo da exoneração do ministro é motivo de foro íntimo do nosso presidente”, declarou, acrescentando que o general Floriano Peixoto Vieira Neto será o substituto de Bebianno. O porta-voz se esquivou ainda de responder, por exemplo, à pergunta sobre a razão da demissão ou sobre as investigações de fraude eleitoral envolvendo o PSL, partido do presidente (leia mais abaixo).
Assim, com a chegada de Floriano Peixoto, o governo Bolsonaro chega ao seu oitavo membro das Forças Armadas entre os membros da equipe ministerial – militares, aliás, que têm ampliado espaço no governo. Em 9 de fevereiro, por meio do Twitter, o presidente anunciou o general Jesus Corrêa no comando do Incra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – órgão que tinha, até a atual gestão, a reforma agrária como uma de suas principais atribuições.
Leia também
Durante o anúncio da demissão, o porta-voz do governo, general Otávio Rêgo Barros, evitou dar detalhes sobre o rompimento da relação entre Bolsonaro e Bebianno. Uma das questões que ficaram sem resposta é a suspeita que recai sobre outro ministro a respeito das práticas eleitorais do PSL.
Ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL) também é acusado de ter usado candidatas laranjas em benefício próprio em Minas Gerais. Reportagem da Folha publicada em 4 de fevereiro revelou que quatro candidatas do PSL em Minas receberam R$ 279 mil do comando nacional do partido, por indicação do próprio Marcelo, justamente com o objetivo de disputar a eleição.
Marcelo também é presidente do diretório do PSL em Minas Gerais. Daquele total, informa a reportagem, R$ 85 mil foram destinados oficialmente a empresas de assessores, parentes ou sócios de assessores do ministro. Bolsonaro não apresentou qualquer explicação sobre a razão de não dar tratamento isonômico aos casos, protegendo o ministro do Turismo.
A saída de Bebianno é concretizada às vésperas da apresentação da reforma da Previdência. O próprio Bolsonaro, segundo membros do governo, vai ao Congresso entregar o texto de quase 40 páginas com as sugestões de alteração nas regras de aposentadoria. O desafio agora é impedir que o desgaste causado pela crise envolvendo o ministro, suspeito de estar à frente de fraudes eleitorais, contamine o ambiente de votações no Parlamento.
Fator Carlos
A exoneração era dada como certa desde a última sexta-feira (15), quando veículos de imprensa começaram a noticiar a irreversibilidade da situação e o acirramento dos ânimos entre os ex-aliados. Bebianno desemprenhou diversas funções durante a campanha presidencial e até poucos dias atrás era um dos principais homens de confiança de Bolsonaro. A importância ficou explícita quando o agora ex-ministro foi alçado, interinamente, ao posto de presidente do PSL de Bolsonaro durante o pleito.
Nessa condição, era ele quem tinha a responsabilidade de capitanear o caixa de campanha e o manuseio do fundo partidário, justamente o elemento que culminaria com sua demissão: a acusação de que dinheiro público foi usado para justificar candidaturas laranjas. A denúncia, publicada em reportagem da Folha de S.Paulo, foi o estopim para a entrada do vereador Carlos Bolsonaro, filho de quem o nome sugere, entrar no circuito para desmentir Bebianno.
O ministro havia negado, em entrevista ao jornal O Globo, que vinha protagonizando uma crise no Palácio do Planalto em decorrência de denúncia publicada pela Folha. Segundo a reportagem, o PSL criou uma “candidata laranja” para usar R$ 400 mil da verba pública do fundo partidário –, Bebianno garantiu que conversou com Bolsonaro, por meio de mensagens, três vezes na última terça-feira (12).
“Não existe crise nenhuma. Só hoje falei três vezes com o presidente”, disse Bebianno ao jornal fluminense, acrescentando que a suposta conversa foi por meio de mensagens de WhatsApp.
> Partido de Bolsonaro criou “candidata laranja” para usar R$ 400 mil de verba pública
“Ontem estive 24h do dia ao lado do meu pai e afirmo: ‘É uma mentira absoluta de Gustavo Bebbiano que ontem teria falado 3 vezes com Jair Bolsonaro para tratar do assunto citado pelo Globo e retransmitido pelo [site] Antagonista'”, declarou Carlos por meio do Twtitter. Instantes depois, na mesma rede social, Carlos Bolsonaro postou outro conteúdo (veja abaixo) com um áudio encaminhado por Bolsonaro a Bebianno.
Ontem estive 24h do dia ao lado do meu pai e afirmo: “É uma mentira absoluta de Gustavo Bebbiano que ontem teria falado 3 vezes com Jair Bolsonaro para tratar do assunto citado pelo Globo e retransmitido pelo Antagonista.” pic.twitter.com/AqzZ0YPNOO
— Carlos Bolsonaro (@CarlosBolsonaro) 13 de fevereiro de 2019
“Não há roupa suja a ser lavada! Apenas a verdade: Bolsonaro não tratou com Bebianno o assunto exposto pelo O Globo como disse que tratou”, reiterou o vereador fluminense. Na mensagem de voz em questão, o presidente se nega a conversar com seu ministro. “Gustavo, está complicado eu conversar ainda. Então não vou falar. Não vou falar com ninguém, a não ser estritamente o essencial. Estou em fase final de exames para possível baixa hoje, tá ok? Boa sorte aí”, afirma Bolsonaro no áudio.
Diante das mensagens públicas de “fritura” no transcorrer da semana passada, Bebianno passou a se queixar a aliados durante o fim de semana. Segundo os jornalistas Lauro Jardim (O Globo) e Gerson Camarotti (GloboNews), ele disse a interlocutores que se arrependeu de ter viabilizado a eleição de Bolsonaro e que o presidente é “um louco” e “um perigo para o Brasil”.
Na última quinta-feira (14), em declaração à revista digital Crusoé, Bebianno já havia demonstrado que seria difícil continuar no governo. O ex-ministro disse à publicação que seu chefe vinha lhe dirigindo ataques públicos porque estaria com “medo de receber algum respingo” da denúncia sobre uma candidata laranja em Pernambuco. “Não sou moleque, e o presidente sabe. O presidente está com medo de receber algum respingo”, fustigou.
> Bebianno fala sobre laranjas na eleição e diz que Bolsonaro “está com medo de respingo”
Candidata fantasma
A reportagem da Folha informa que o PSL criou em Pernambuco uma “candidata laranja”, nas eleições de 2018, para ter acesso a dinheiro público. Ela recebeu R$ 400 mil do PSL durante o pleito. E apenas 274 votos do eleitorado pernambucano.
Aos 68 anos, Maria de Lourdes Paixão concorreu ao posto de deputada federal. Desconhecida do público, inclusive regionalmente, ela foi a terceira mais contemplada em todo o país com verba do PSL – nem a famosa “digital influencer” Joice Hasselmann (PSL-SP), a deputada federal recém-eleita na condição de mais votada da história (1,079 milhão de votos), ou mesmo o presidente Jair Bolsonaro foram tão beneficiados quanto Maria de Lourdes.
Segundo a reportagem assinada por Camila Mattoso, Ranier Bragon e Joana Suarez, a direção nacional do partido enviou os R$ 400 mil do fundo partidário para a conta da candidata em 3 de outubro, a quatro dias da eleição do ano passado. Naquela ocasião, Gustavo Bebianno coordenava a campanha de Bolsonaro e reverberava as falas do presidenciável a respeito de luta contra a corrupção, honestidade e nova política.
“No caso de Lourdes Paixão, a prestação de contas dela, que é secretária administrativa do PSL de Pernambuco, estado de Bivar, sustenta que ela gastou 95% desses R$ 400 mil em uma gráfica para a impressão de 9 milhões de santinhos e cerca de 1,7 milhão de adesivos, tudo às vésperas do dia que os brasileiros foram às urnas, em 7 de outubro”, diz trecho da reportagem, destacando que a candidata só teve acesso ao dinheiro três dias antes da eleição.
> Ministro suspeito de usar candidatas laranjas é exonerado, mas vai voltar após posse na Câmara