A ideia em um segundo
A popularidade do presidente Jair Bolsonaro cai a cada pesquisa. Ele é alvo de diversas acusações feitas pela CPI da Covid. Há mais de cem pedidos de impeachment dormindo na gaveta do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) avalia processos que pedem a cassação da sua chapa com o vice, Hamilton Mourão. A despeito de tudo isso, porém, tem 76,5% de probabilidade de concluir o mandato. O número foi obtido a partir de projeções dos especialistas do Congresso em Foco Insider, utilizando a técnica Delphi. Este Farol lista as razões pelas quais se chegou a essa estimativa.
Previsão ou profecia?

Quais são as chances reais de Bolsonaro ter seu mandato interrompido? Essa é a análise deste Farol [fotografo]Marcelo Camargo/Agência Brasil[/fotografo]
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Foi assim que os especialistas do Congresso em Foco Insider foram estimulados a apontar as chances de Jair Bolsonaro terminar o mandato presidencial. Cada respondente apresentou a sua projeção de forma independente, sem conhecer as projeções feitas pelos demais, juntamente com suas razões, de forma sintética. Posteriormente, os participantes foram apresentados à média aritmética das projeções recolhidas, bem como a uma síntese das razões apresentadas, tendo a oportunidade de refazer sua previsão, chegando-se a uma nova média.
A média final resultou no índice de 76,5%.
Presidência da Câmara: uma peça-chave

Arthur Lira é a peça-chave em torno da possibilidade de impeachment: o avanço depende unicamente dele [fotografo] Cleia Viana/Câmara dos Deputados [/fotografo]
O deputado Arthur Lira (PP-AL), atual presidente da Câmara, além de ter sido explicitamente apoiado por Bolsonaro em sua eleição, tem interesse na permanência da situação atual – seu partido, o Progressistas, logrou obter cargos estratégicos; o orçamento público tornou-se um manancial de emendas parlamentares; e a pauta legislativa fica praticamente em suas mãos, dada a fraqueza crescente do Executivo.
Como fracassaram todas as tentativas de romper a lógica do “juízo de oportunidade e conveniência” da presidência da Câmara para análise dos pedidos de impeachment, inclusive junto ao Supremo Tribunal Federal, não se deve esperar que Arthur Lira “acione o botão amarelo”, conforme suas próprias palavras.
A coalizão funciona
Apesar de não conduzir a coalizão de modo tradicional, o presidente Bolsonaro, a partir de 2020 abriu enorme espaço ao centro político, com indicações para cargos estratégicos e viabilização de verbas em quantidades e valores consideráveis. O nível de pagamento de emendas parlamentar está em um patamar elevadíssimo e a tendência é que cresça, como se pode ver no quadro a seguir (elaborado com dados do Portal da Transparência).
Ano |
Quantidade de emendas |
Valor empenhado |
Valor pago |
2017 |
5.569 |
R$ 10,7 bilhões |
R$ 2,24 bilhões |
2020 |
8.386 |
R$ 35,18 bilhões |
R$ 16,11 bilhões |
Para 2021, até o presente, temos um total de 4.482 emendas, um empenho de R$ 15,78 bilhões e um pagamento de R$ 7,12 bilhões.
De fato, conforme também apontado pelo Farol, nas análises do Índice Congresso em Foco, os projetos apoiados pelo governo têm tido margens confortáveis de votação na Câmara dos Deputados – há inclusive quem se refira aos 300 do Lira, em alusão ao filme sobre o episódio da batalha de Termópilas.
A aliança com o deputado Arthur Lira na Câmara e as nomeações da deputada Flávia Arruda como ministra-chefe da Secretaria de Governo e do senador Ciro Nogueira, como ministro-chefe da Casa Civil, são exemplos de utilização de outra ferramenta de gestão da coalizão reunida em torno do atual presidente.
Finalmente, o movimento de aproximação com o ex-presidente Michel Temer, conhecido por suas boas relações tanto no Judiciário quanto no Legislativo, complementa a rede de segurança que protege Bolsonaro.
Os inimigos não se apresentam

A divisão das forças contrárias a Bolsonaro resultou em dispersão e enfraquecimento das manifestações no 12 de setembro [fotografo] MBL [/fotografo]
Em que pesem as quedas sucessivas de aprovação ao governo, a gravidade moral e jurídica do comportamento de Jair Bolsonaro, sobretudo na condução da pandemia e no desempenho do papel constitucional de presidente da República, parece não ser sentida por grande parte da população brasileira.
O tempo escorre
Entramos na reta final de setembro. Parece haver uma equação informal que expressa:
Qualitativamente: seja qual for o nível de desgaste provocado pelo impeachment, esse se torna maior quando os meses que faltam para o fim do mandato vão diminuindo (experimente dividir 10 por 10 e 10 por 5, por exemplo). O fato é que, quanto mais se aproxima o final do mandato, menos vale a pena investir em um processo de impeachment.
Paradoxalmente, a essa perspectiva soma-se a questão da crise econômica: alta da inflação, crise hídrica, desemprego alto e perspectiva de redução do PIB. Houvesse mais tempo de mandato, maior tenderia a ser o desejo de mudança. Havendo pouco tempo para o fim do mandato, as elites econômicas tendem a preferir caminhar até o fim, evitando-se turbulências ainda maiores.
E os 23,5%?
Uma probabilidade de 23,5% de que o presidente não conclua o seu mandato tampouco é baixa. Essa estimativa se deve, por sua vez:
-
à ilimitada capacidade demonstrada por Bolsonaro de produzir crises e eventos desgastantes, como a malograda escalada golpista do último Sete de Setembro;
-
os atritos constantes com o Poder Judiciário podem acabar ensejando uma ação mais efetiva por parte do Tribunal Superior Eleitoral, culminando na cassação da chapa (um afastamento que não depende do Congresso Nacional);
-
a possibilidade de uma deterioração muito rápida dos indicadores econômicos, suficiente para reverter a percepção de que a manutenção do presidente até o final do mandato seria melhor para se evitar turbulências mais intensas.
Termômetro
por Rudolfo Lago
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