A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) já se lançou pré-candidata à prefeitura de Porto Alegre para as eleições 2020, mas ela assume que, em caso de aliança da esquerda, não descarta apoiar outra candidatura no lugar da sua. Para ela uma união da esquerda anti-imperialista é necessário.
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A deputada, que assumiu a liderança do partido na Câmara no último dia 3, ficou com o 18º lugar no voto do júri no Prêmio Congresso em Foco 2019. Natural de Alegrete (RS), tem graduação em Biblioteconomia, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e especialização em História do Brasil Contemporâneo. A deputada foi vereadora em Porta Alegre por 10 anos e é uma das fundadoras do Partido Socialismo e Liberdade.
Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, a deputada fez críticas ao PT, afirmou que as manifestações de 2013 não geraram Bolsonaro e criticou à própria esquerda: “não se superou ainda pela esquerda, a ideia deste regime político apodrecido para construir um sistema diferente”, declarou.
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“No primeiro governo Lula, quando houve a reforma da previdência em que a então senadora Heloísa Helena, a Luciana Genro, em quem eu me inspiro muito, o Babá, o João Fontes, então deputado, votaram contra a reforma da previdência e começaram um movimento por um novo partido, eu me senti expulsa também. Porque aquela reforma tirou direito dos trabalhadores. Claro que ela ainda entrou num conjunto ‘dum’ pacote de associação dos partidos do regime, enfim. E a expulsão de uma parte da esquerda socialista fez com que eu me sentisse, como muitos militantes daquela época, expulsa também. Comecei ali, eu tinha 19 anos e já comecei a construir o Psol desde o início.”
Junho de 2013 gerou Bolsonaro?
“Era uma miríade de muitas pautas e eu não tenho dúvida de que o signo geral era um signo progressista. Nós não teríamos a latência da primavera feminista que depois ocorreu e as ocupações das escolas sem junho de 2013. Nós não teríamos uma série de movimentos que depois aconteceram sem essas experiências de ocupar as ruas e transformar as ruas nos espaços de grandes transformações. Eu discordo frontalmente de muitas análises de que junho foi inventado pelo imperialismo, como o próprio Lula falou, ou que junho gerou Bolsonaro. Eu vejo que junho foi uma janela de oportunidades e quem tava na rua (…) sabia o que negar, mas não sabia que programa defender (…).
A história já nos ensina, né? Quem diz que governo com a burguesia, governa para a burguesia. E quando tu não é mais funcional eles simplesmente te rifam, fazem um golpe parlamentar como fizeram no Brasil. Porque durante 13 anos o governo governou neste condomínio de poder, claro que com nuances, com diferenças, com projetos, inclusive medidas compensatórias e assistenciais que são meritórias mas sem nunca atacar profundamente o sistema político, o sistema econômico de dominação dos ricos e a ideia de uma nova democracia, de avançar na ampliação da democracia popular. Quando deixou de ser funcional o Temer arquitetou um golpe (…).
Havia uma fissura no modelo de nova república construído pós-ditadura civil-militar. Esse presidencialismo de coalizarão… E de fato, esse sistema foi rechaçado, só que nada nasceu, ficou um vazio, um interregno, né? Uma crise econômica profunda com uma crise de representação, em que a extrema direita, de uma forma demagógica e mentirosa, se vende como antissistema e infelizmente um setor do povo comprou gato por lebre (…). Não se superou ainda pela esquerda a ideia desse regime político apodrecido para construir um regime diferente. Então ficou um vazio e eu acho que nisso o Bolsonaro se vendeu.”
Riscos à democracia
“Eu não tenho nenhuma dúvida de que Bolsonaro quer fechar o regime político por dentro do regime político brasileiro. Ele quer reverter as liberdades democráticas. Ele não só quer, como está fazendo, perseguir a arte, a produção de conhecimento, a ciência. É um governo que quer mexer na estrutura jurídica e política, quer controlar a imprensa para ter um sistema de dominação. Quer perseguir os movimento sociais populares, quer soltar as forças do atraso.
Em 2019 teve uma posição social importante, principalmente na educação que conseguiu ser vitorioso na liberação dos recursos. As lutas democráticas contra as censuras dos livros, das próprias artes. A latência da luta das mulheres, teve lutas importantes. Ele não conseguiu fechar o regime ainda por dentro do regime, mas ele segue tentando (…).
É a nossa vez de lutar e garantir que não haja uma ditadura de outro tipo, sem tanque na rua. Mexendo na lei, fechando o regime, prendendo adversário, prendendo ambientalistas e criando notícias fakes como aconteceu em Alter do Chão. Tentando prender jornalistas como estão tentando fazer com Glenn Greenwald que cumpriu um papel fundamental ao mostrar um conluio dos poderosos na Vaza Jato.”
União da esquerda
“Quando a gente pensa na crise que o Brasil vive, a gente também tem que pensar na própria necessidade de construir uma nova esquerda. Uma esquerda crítica e autocrítica. Uma esquerda que não seja contaminada pela política de conciliação de classes. Uma esquerda que não seja sectária e que não se ache a dona da verdade. Uma esquerda capaz de unificar o conjunto das pautas, sem diminuir nenhuma das pautas, mas dando ligação a elas com respostas estruturais, como são necessárias para enfrentar este grau de exploração capitalista que estamos vivendo no Brasil e no mundo, né?”
Outros temas
Fernanda Melchionna também falou sobre o apoio que membros do partido deram nos últimos tempos para ditadores, uma possível união da esquerda em 2022 e a pré-candidatura à prefeitura de Porto Alegre. Assista a entrevista na íntegra.
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