Vilson Antonio Romero *
Entre 2013 e 2022, a Previdência Social deixou de arrecadar cerca de R$ 133 bilhões, por conta da desoneração da folha, medida que permite às empresas recolherem a contribuição previdenciária sobre receita bruta em vez de sobre salários.
Tudo isso começou em 2011, com quatro setores desonerados, aumentando no ano seguinte para 12 e atingindo o auge em 2014, ao beneficiar mais de 50 segmentos econômicos.
Hoje são 17 setores: couro e calçados, call center, comunicação, têxtil, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, fabricação de veículos e carroçarias, máquinas e equipamentos, proteína animal, tecnologia da informação e de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, rodoviário coletivo e de cargas.
Apesar de parte dos recursos terem sido compensados, há um inequívoco sangradouro das verbas, contribuindo para o alardeado “rombo na previdência”.
A aprovação em 30 de agosto na Câmara dos Deputados do PL 334/2023, relatado por Any Ortiz (Cidadania-RS), além de prorrogar a desoneração até 2027, trouxe junto um “jabuti”.
A relatora na Câmara acolheu em seu texto uma emenda do deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), que estende a redução da contribuição previdenciária para todas as 5.570 cidades brasileiras, com alíquotas entre 8% a 18% — quanto menor o PIB per capita, menor a taxa.
As lideranças municipais se queixam das agruras orçamentárias, com mais da metade das prefeituras “no vermelho”. Dívidas de R$ 200 bilhões com a previdência, represamentos nas áreas de saúde e educação, impacto do reajuste real do salário mínimo na folha de celetistas e terceirizados, são preocupações dos gestores.
Mas, em vez de buscarem alternativas mais consequentes, como elevação do FPM, parece que a estratégia foi “desnudar un santo para vestir otro”.
Com o “jabuti”, a renúncia fiscal vai a mais de R$ 19 bilhões anuais. Num momento em que o governo se empenha para obter “déficit zero” no próximo ano, buscando tributar setores alternativos, autoridades criticaram a aprovação.
O texto volta ao Senado para mais uma rodada de votações, por ter sido alterado.
A Fazenda desejava incluir a redução de encargos trabalhistas e previdenciários na reforma tributária da renda, que deve ter início após a reforma sobre o consumo.
Se aprovado o PL, ainda o presidente poderá vetar, mas aí já será outra história. O “jabuti” corre mais do que lebre! Aguardemos.
* Vilson Antonio Romero é auditor fiscal e jornalista, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), diretor da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), membro da Diretoria Nacional do Dieese e presidente da Pública Central do Servidor no DF.
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