Brasil, 1895. Chega ao Rio de Janeiro, com vistas a uma visita oficial, o navio italiano Lombardia. E eis que, por força de um mosquito de nome Aedes aegypti, sua tripulação viu-se vítima de uma epidemia de febre amarela.
O que se viu a seguir foi uma humilhação a nível mundial para o nosso país. Dos 340 homens a bordo, 333 adoeceram e 234 morreram. O Brasil foi retratado, pelo planeta afora, como um país sem saneamento básico adequado, no qual as pessoas urinavam pelas ruas e vendiam alimentos em barraquinhas sem qualquer condição higiênica. A vergonha foi tamanha que as agências europeias passaram a anunciar viagens de navio direto para Buenos Aires, sem escala no Brasil.
E eis que, dentro do quadro de um notável esforço para mudar esta realidade, promovido pelo então presidente Rodrigues Alves, entrou em cena a figura ímpar de Oswaldo Cruz. Baseando-se em pesquisas realizadas em Cuba, ele defendia a tese de que a febre amarela era transmitida por mosquitos. A partir daí, organizou até brigadas de mata-mosquitos para combater os focos dos insetos.
Apesar do ceticismo da imprensa – ele era alvo cotidiano dos caricaturistas e humoristas – e da esmagadora maioria da população, a campanha deste grande brasileiro teve êxito: os casos de febre amarela diminuíram consideravelmente.
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Desde aquela época, já quase esquecida pelos livros de História, passaram-se mais de cem anos. O saudoso sanitarista passou a ser lembrado mais pelo instituto especializado na pesquisa de vacinas, que leva seu nome, do que por sua obra propriamente dita. Sim, os tempos mudaram e todos os brasileiros saudaram, com o coração repleto de esperança, a aurora de um novo milênio – aliás, os brasileiros e os mosquitos, os mesmos de 1895! Afinal, estes pequenos insetos também anseiam por paz e mesa farta!
Temos que reconhecer que o século XXI começou bem para eles – apenas em 2007 foram quase 500 mil brasileiros contaminados. Naquele ano, chamou a atenção uma frase do Ministro da Saúde: “121 pessoas já morreram. Eu diria que nós estamos perdendo a guerra para a doença”.
Daí à volta dos “mata-mosquitos” foi um pulo! Só mudou o nome do cargo, que passou a ser “Agente de Saúde” ou “Fiscal de Combate à Dengue” – afinal, o nome original poderia inspirar a população a abrir os livros de História.
Em escala mundial, o nosso já moderno e vibrante Brasil continua humilhado pelo mosquito! Que o diga qualquer passageiro de avião que embarque no Rio de Janeiro ou em São Paulo rumo à Europa, obrigado a ser “desinfetado” a bordo. Coisa triste, a cena das aeromoças passando pelos corredores desinfetando a aeronave após o fechamento das portas…
E continua firme e forte o mosquito! Em 2008, só no Rio de Janeiro, foram quase 250 mil casos de contaminação, com 174 mortes. Apenas entre os dias 1º de janeiro e 13 de fevereiro de 2010, constatou-se que inacreditáveis 108.640 brasileiros foram infectados.
Para conseguir tanto sucesso, a mosquitada conta com um grande aliado: nossa ainda precária rede de saneamento básico, responsável final, segundo consta, pela morte diária de 20 crianças – ou de 600 por mês, o equivalente a dois jatos de passageiros lotados.
Oswaldo Cruz faleceu em fevereiro de 1917 – mas deixou saudades. Da leitura de sua biografia fico a imaginar se, diante do Brasil de hoje, ele não estaria se revirando na tumba…
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