Pedro Ivo Sebba Ramalho*
Desde 1999, com a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a aprovação da Lei dos Genéricos, várias foram as medidas tomadas para o aperfeiçoamento dos critérios de desenvolvimento e produção de medicamentos no país. As exigências regulatórias determinadas pela Anvisa, nas palavras dos empresários do setor, elevaram o parque fabril brasileiro a níveis “de primeiro mundo”.
A entrada dos genéricos mudou significativamente a estrutura do mercado farmacêutico e a possibilidade de acesso da população a diversos tratamentos. Com um início bastante tumultuado, em razão de uma verdadeira “guerra de informações” entre laboratórios na imprensa, a produção e o uso de genéricos no Brasil cresceu de forma assustadora no período.
Os medicamentos genéricos são aqueles produtos que provam por meio de testes que têm as mesmas características terapêuticas que os medicamentos chamados de referência. E têm, por lei, um preço 35% mais baixo que aquele fixado pelo governo para o produto que ele poderá substituir no balcão das farmácias. Mas na venda ao consumidor, são em média 60% mais baratos. O aspecto do preço reduzido é um componente fundamental da regulação do tema, pois a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE tem apontado nos últimos anos que os gastos com a compra de medicamentos correspondem a até 48,6% da despesa média mensal com saúde das famílias brasileiras.
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Apesar de a criação dos genéricos ser evidentemente uma das grandes mudanças no setor, iniciada há 15 anos, durante todo o período o mercado farmacêutico no Brasil vem passando por um conjunto de outras significativas mudanças regulatórias.
Certamente, essa nova dinâmica provocada pela forte regulação do setor, aliada às políticas de desenvolvimento e estímulo à inovação, impulsionou o país para ocupar posição destacada no grupo conhecido como países farmacêuticos emergentes (pharmerging, em inglês), aqueles países com crescimento absoluto em gastos com medicamentos maior que US$ 1 bilhão no período de 2012-16, e que têm um PIB per capita menor que US$ 25 mil. O grupo, que é bastante heterogêneo, inclui China, Brasil, Índia, Rússia, México, Turquia, Polônia, Venezuela, Argentina, Indonésia, África do Sul, Tailândia, Romênia, Egito, Ucrânia, Paquistão e Vietnã. Nesse contexto, o Brasil ocupa hoje a 6ª posição no ranking mundial, sendo o maior mercado farmacêutico da América Latina, à frente do México, que despencou da 9ª posição, em 2003, para a 14ª na classificação mundial.
Dentre todas as decisões regulatórias no período, pode-se destacar uma importante medida, tomada ainda em 2003, a qual vem provocando uma grande expectativa no setor. A partir daquele ano, a Anvisa determinou que os medicamentos conhecidos como similares também realizem testes de laboratório para a comprovação da sua equivalência com outros produtos disponíveis no mercado.
Com um prazo fixado para se encerrar em 2014, a indústria farmacêutica de similares adequou os seus produtos, que agora devem apresentar, tecnicamente, a mesma comprovação exigida para os genéricos. As indústrias farmacêuticas nacionais têm historicamente maior volume de produção de medicamentos similares. E os similares hoje possuem as mesmas características e qualidade do produto de referência, mas ainda não são intercambiáveis com eles.
Assim, foi publicada na edição de desta sexta-feira (17) do Diário Oficial da União (DOU) a abertura de uma consulta pública para chegar a uma proposta de critérios sanitários e econômicos para permitir a intercambialidade de similares. Ou seja, a possibilidade de substituição de medicamentos de referência por medicamentos similares, de acordo com a preferência do consumidor. Igualmente aos genéricos, o preço deve ser reduzido em 35%. A consulta pública deve ser aberta em sete dias e será mantida por um período de 30 dias.
A proposta, ora em debate pela sociedade, aponta para mais uma grande mudança no mercado farmacêutico. Assim como no caso da política de genéricos, a equivalência dos medicamentos similares visa aumentar a concorrência do setor no médio prazo, induzir queda no preço médio praticado no mercado, provocar diminuição das transferências de renda dos consumidores, e proporcionar o aumento do acesso a medicamentos por parte dos consumidores de baixa renda. Ou seja, essa proposta de regulação pretende ampliar as possibilidades de uso racional medicamentos, o acesso a produtos e tecnologias, e o desenvolvimento econômico e social no Brasil.
*Pedro Ivo Sebba Ramalho, farmacêutico e doutor em Ciências Sociais, é membro da carreira de Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), onde exerce atualmente a função de assessor da Diretoria
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