Cleber Lourenço *
Contra a democracia
Deltan Dallagnol anunciou um novo pacote de medidas contra o Estado de Direito que é para deixar qualquer legalista e democrata espantado.
Para que vocês entendam a gravidade da coisa, vou direto ao assunto, uma das “medidas” prevê a prisão preventiva de parlamentares e a possibilidade de criação de PECs via clamor popular.
Em míseros 33 anos, a nossa Constituição já foi alterada 111 vezes! São quase quatro alterações por ano. Isso sem falar das interpretações casuísticas e tendenciosas.
É flagrantemente um caso de constitucionalismo abusivo, termo criado pelo professor e PhD pela escola de Harvard David Landau, uma manobra que se baseia em sucessivas e capciosas alterações na Constituição de uma sociedade visando subverter a ordem democrática.
As novas medidas buscam “a possibilidade de iniciativa popular para a apresentação de proposta de emenda à Constituição. Possibilitam também a iniciativa popular para a apresentação de emendas a projetos de lei ou propostas de emenda à Constituição”.
E embora os primeiros parágrafos sejam cheios de boas intenções, é aí que está o pulo do gato! Vejam o seguinte trecho:
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“Institui regras específicas que conferem maior celeridade à tramitação das propostas que se originam da iniciativa popular”.
Ou seja, é mais um caminho para o Ministério Público e sua gigante máquina de lobby e publicidade atropelarem o voto popular para a imposição dos seus objetivos.
Já assistimos ao poder de persuasão e mobilização que o MP possui para atacar de maneira vil e induzir a população ao erro com qualquer PEC que decida colocar limites na instituição.
Infelizmente, sem uma PEC 37, o MP parece ter entendido que seu papel é estritamente acusatório. Deixando de lado a defesa dos interesses fundamentais da sociedade.
E geralmente essa gritaria se dá sempre que o MP é instado a prestar contas para a sociedade ou é aventada a ideia de submetê-lo ao controle da sociedade e aumento da representatividade em seus conselhos.
Já a prisão preventiva de parlamentares dispensa comentários, é uma pincelada de AI-5 escancarada e que dentro do pacote de medidas ainda ganha um aditivo com a continuidade de investigações conexas àquelas de foro privilegiado, algo que é nada além do que um jeitinho para driblar o “terrível” foro privilegiado.
E como se não bastasse, “sugere maior punição contra deputado que seja alvo de instauração de processo criminal no STF ou outra instância, perdendo o cargo de membro da Mesa Diretora, de líder de partido ou bloco parlamentar, de presidente ou vice-presidente das comissões da Casa ou de membro do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar”.
E é claro, como todo projeto autoritário, não poderia faltar um projeto de doutrinação dos jovens nas escolas!
As medidas preveem um “o engajamento de crianças e adolescentes no combate à corrupção, por meio da integração de forma interdisciplinar desse tema em seu currículo estudantil”.
Quem vai definir essa formação? Quais serão os critérios? Teremos também disciplinas para ensinar a não matar, roubar e/ou cometer outros delitos? Não faz sentido.
O pacote possuí inúmeras medidas, mas vejam só como quatro ou cinco medidas “bem-posicionadas” podem colocar representantes eleitos pelo povo de joelhos aos que não chegaram ao poder através do voto.
Some essas medidas ao flagrante conflito que o Ministério Público vive com a democracia e você terá um novo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) com a única finalidade de sobrepujar a política e os votos de milhões de eleitores.
Vale lembrar que assim como as antigas dez medidas contra a corrupção que contavam com o endosso de inúmeros setores do MP, essas também contam com o largo apoio dos mesmos setores da instituição.
Veja as demais medidas clicando aqui.
Contra a sociedade
A tal aclamada independência funcional virou um pretexto para fazer-se o que bem entende, inclusive, política e ignorar a sociedade.
Eu já apontei em outras colunas que o Ministério Público não se interessa em realizar o controle externo da atividade policial, mas nos últimos dias esse desinteresse extrapolou qualquer sensatez quando.
No último dia 22, uma matéria da Ponte Jornalismo mostrou que o MP definitivamente renunciou à sua obrigação de controle externo da atividade policial a ponto de ser leniente com abusos!
O Ministério Público de São Paulo denunciou uma mulher negra que teve o pescoço pisoteado por um PM, depois acusou o advogado da vítima de má-fé por não mencionar vídeos que estavam disponíveis há um ano!
Inclusive, a prática de atacar advogados e criminalização da advocacia era algo comum na Lava Jato em Curitiba. O fato de o MP de outro estado adotar a mesma postura reforça ainda mais a dificuldade da instituição em se encontrar na sociedade.
Já no Rio Grande do Sul, o Ministério Público atua de maneira incisiva para tentar prender dois homens que levaram alimentos vencidos do lixo de um supermercado.
Sim, num país onde as pessoas compram ossos, carcaças de frango e reviram latas de lixo em busca de alimentos, os promotores estão empenhados em punir quem comete furto famélico.
Em outro caso, um condutor levemente embriagado causou um acidente, a vítima ficou com uma lesão leve no pé. O condutor parou, prestou socorro, ficou no local e chamou a polícia, ele também não tinha nenhuma passagem na polícia. O que o MP fez? Pediu prisão preventiva.
Não faltam casos em que o rigor da lei pesou para pobres e miseráveis enquanto a instituição bradava com discursos pedantes sobre a corrupção. Só falta ressuscitarem o crime de vadiagem.
E eu não vou nem mencionar a postura do MP no caso Mariana Ferrer.
Hoje os desatinos da instituição são tratados da mesma maneira que os sucessivos casos de violência policial e seus diários casos “isolados”. Então, sim, vale uma reflexão sobre a instituição como um todo.
Essa dificuldade em se controlar os atos de membros do MP que volta e meia coloca a nossa democracia e membros do poder Executivo (municipal, estadual e federal) em uma situação delicada.
E o que fazer quando a instituição que é chamada de “guardião da democracia e da sociedade” pelos seus próprios membros, avança contra aquilo que teoricamente estaria sob a sua “guarda”?
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* Cleber Lourenço é pós-graduando em Jornalismo político.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Dallangnoll incomoda muito corrupto e seus prepostos.