Dia desses, lendo um jornal da distante China, encontrei uma notícia curiosa: em um rio próximo a Shanghai descobriram algumas carcaças de porcos boiando – umas duas dezenas, para ser mais exato.
Não dei, naquele dia, a devida importância a esse fato. Mas eis que o desfile de suínos falecidos, além de não parar, não parou de aumentar! Em poucos dias eles já eram quinhentos. Em uma semana, cinco mil. Imaginem cinco mil porcos mortos boiando pelo rio afora…
Continuei a acompanhar os acontecimentos. Pois bem: no dia em que escrevi estas linhas eles já eram 16 mil! Enquanto isso, por incrível que pareça, as autoridades chinesas ainda não tinham conseguido localizar a origem precisa de todos aqueles suínos – repito, 16 mil boiando pelo rio abaixo…
Enquanto isso, lá em Gana, 40 milhões de toneladas de lixo tóxico aparecem todos os anos. Recentemente decidiram fazer alguns testes em uma escola localizada perto de um “lixão” e constataram que as crianças apresentavam índices de contaminação por chumbo e cádmio 50 vezes superior ao máximo tolerável. Só para que se tenha uma ideia, o solo ao lado continha chumbo em índices doze vezes superiores ao máximo admitido.
Dizem alguns que tal “montanha” de lixo tóxico, em sua maioria eletrônico, lançada todos os anos sobre aquele pobre país africano vem da Europa ou dos Estados Unidos. Mas a verdade é que, assim como os porcos lá de Shanghai, não se sabe ao certo de onde aparece.
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A Albânia também tem sido “contemplada” com lixo desta natureza – de eletrônicos a medicamentos vencidos, passando por resíduos de óleo. Um único carregamento, interceptado em 2009, continha 1.500 toneladas de óleo usado, meia tonelada de baterias e duas toneladas de componentes químicos comprovadamente cancerígenos.
Discute-se sobre a origem deste lixo. Alguns acusam a Europa, e há até quem aponte organizações mafiosas como culpadas. Porém, exauridos os ânimos investigatórios, o fato é que, assim como ocorre com os porcos de Shanghai, ainda não se entendeu muito bem o que está acontecendo.
No não tão distante ano de 2006, só a California (EUA) despachou para a “lixeira” (alguns países do resto do mundo) mais de nove mil toneladas de lixo eletrônico, rico em resíduos perigosos como o chumbo e o mercúrio. Desse total, cerca de 1.190 toneladas vieram parar aqui no Brasil.
Uma vez mais, assim como acontece com os porcos lá de Shanghai, ninguém consegue saber ao certo o que está havendo.
Após algumas pesquisas, descobri uma sinistra denúncia do Greenpeace: “A cada ano milhares de toneladas de lixo tóxico dos Estados Unidos da América são lançados em fazendas, praias e desertos no Bangladesh, Haiti, Somália, Brasil e dezenas de outros países”. Consta que até poluentes capturados por filtros de chaminés entrariam neste “coquetel”, quase sempre rotulado como “fertilizante” para iludir a fiscalização – aliás, já descobrimos no Porto de Santos um desses carregamentos.
Assim como os chineses em relação aos porcos de Shanghai, os ocidentais ainda não conseguiram descobrir quem exatamente está espalhando tanto lixo tóxico pelo planeta afora, em contraste com tantas políticas de defesa da natureza – sobre as quais ninguém, absolutamente ninguém, discorda.
Enquanto isso lá se vão, rio abaixo, as carcaças dos 16.000 suínos chineses. Anônimas, silenciosas, carregam em seus lombos a advertência eterna de Ernest Hemingway: “Por quem os sinos dobram? Eles dobram por nós”.
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