O Ministério Público de Contas de São Paulo emitiu um parecer contrário à aprovação das contas de 2019 do governo do estado. O problema, segundo parecer prévio do órgão, está na renúncia de receitas. De acordo com o documento (confira íntegra abaixo), falta transparência na gestão de João Doria (PSDB) sobre os critérios utilizados ao conceder benefícios fiscais.
Outro ponto levantado pelo relatório é de que o governo paulista editou 14 decretos normativos prevendo novos benefícios, mas sem previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), um aumento de 25% em relação a 2018.
Segundo a LDO, quando o Estado concede um incentivo a um setor, precisa dizer qual é a renúncia fiscal e o valor do gasto tributário de que está abrindo mão naquelas operações. Além disso, tem de apontar qual a fonte alternativa de receita para cobrir estes gastos e quais critérios foram utilizados para ele conceder determinado benefício fiscal. De acordo com o relatório, no entanto, essas informações não ficam claras e por isso o parecer é desfavorável.
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A prestação de contas do ano fiscal de 2019 do governo de São Paulo será apreciada na próxima terça-feira (30) pelo Tribunal de Contas do Estado (TCESP). As contas anuais, relativas ao primeiro ano de mandato de Doria, serão analisadas pelo colegiado durante sessão extraordinária, às 10 horas.
O Congresso em Foco entrou em contato com a assessoria do governo do Estado de São Paulo e questionou a gestão para entender qual o critério utilizado pela gestão para concessão dos benefícios e se houve alguma mudança neste processo entre das gestões anteriores para o ano base de 2019.
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Outra questão encaminhada pela reportagem foi referente aos decretos normativos editados pelo governo prevendo novos benefícios relativos ao ICMS, sem previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Em 2019, dos 16 atos normativos, apenas dois estavam amparados pela Lei.
Sobre os atos explicou que “dos 14 decretos envolvendo renúncias fiscais editados em 2019, oito tratam de prorrogações de benefícios que já se encontravam estimados nos cálculos das renúncias consubstanciadas nas leis orçamentárias de anos anteriores. Quanto aos seis decretos que instituíram novos benefícios em 2019, ressalta-se que o Art. 14 da Lei Complementar Nº 101, de 4 de maio de 2000, prevê o cumprimento de um entre dois requisitos mutuamente excludentes para a concessão de benefícios fiscais”.
Já sobre os critérios, a secretaria de Fazenda do Estado aponta que são três os parâmetros levados em consideração para a concessão dos benefícios.
“Fazemos uma análise de mérito para ver se eles fazem sentido, ou seja, se vão promover o desenvolvimento econômico do estado ou se o estado vai deixar de ter sua economia ativa porque outro estado vizinho está dando um benefício maior. A partir da análise do mérito, verificamos se é conveniente, analisamos se respeita a Lei de Responsabilidade Fiscal, se sim e se estava previsto, até porque você questiona por que são 14 decretos, na verdade são oito benefícios que vão vencendo ao longo dos anos e que são renováveis, ou seja, ele respeita porque já estava previsto nas leis orçamentárias anteriores, então ele já está contemplado. Se são benefícios novos dai tem de ter uma compensação e adotamos essas medidas, apesar de não parecer, eles não precisam estar na LDO de três anos atrás. A LDO concilia o que foi dado e é isso que a gente faz. Adotamos uma medida de compensação no ano, revertendo um outro benefício ou aumento a alíquota de alguma outra coisa para poder conceder aquela nova isenção ou qualquer outra modalidade.”
O relatório MP de Contas diz ainda que é “oportuno pontuar que, se por um lado o crédito acumulado representa disponibilidade financeira para o contribuinte, por outro trata-se de dívida não reconhecida no Balanço Geral do Estado, o que reforça a necessidade de maior transparência na divulgação de tais dados”.
Para o Ministério Público de Contas, o saldo total desses créditos aumentou 62,77% em 2019, atingindo R$ 1,82 bilhões ao final do exercício. “Com efeito, à medida que o total apropriado aumentou (11,22%), a utilização dos créditos diminuiu (16,96%)”.
A apresentação genérica dos dados pelo Estado paulista é antiga. Neste mesmo relatório, o Ministério Público de Contas questiona os números apresentados por governos anteriores. “Em relação aos pontos do Plano de Ação que não foram cumpridos, chama atenção a existência de benefícios em vigor há mais de 20 vinte anos e com prazo de vigência indeterminado.”
A secretaria de Fazenda afirmou que “no âmbito do Tribunal de Contas do Estado, todos os órgãos técnicos envolvidos na apreciação se manifestaram favoravelmente à prestação de contas apresentada pelo Governo do Estado, inclusive quanto à questão das renúncias fiscais. Todas as informações solicitadas tanto pelo Ministério Público de Contas quanto pelo TCE sempre foram pronta e devidamente ofertadas pela Secretaria da Fazenda e Planejamento, contando também com o aval da Procuradoria Geral do Estado.”
O órgão não tem o poder de rejeitar as contas do governo, função que cabe ao Tribunal de Contas, mas seus pareceres são determinantes nos rumos políticos do país. Em 2015, um dos pontos que culminaram na abertura do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff foi, justamente, a emissão de um documento similar a este emitido pela instituição. Na época, a governante perdeu o posto sob a justificativa de crime de improbidade administrativa, as pedaladas fiscais.
Ainda de acordo com relatório, o MP de Contas pede esclarecimentos sobre a realização de transferências e remanejamentos como se fossem créditos suplementares sem respaldo em lei específica ou na LDO.
O documento também exige mais informações da gestão Doria sobre a aplicação de verbas no ensino. “Verificou-se a aplicação de apenas 24,89% da receita resultante de impostos e transferências na
manutenção e no desenvolvimento do ensino, abaixo, portanto, do percentual de 25% exigido pelo art. 212, caput, da CF/1988”.
O MP de Contas também questiona a utilização do Fundeb, que após fiscalização “verificou-se a aplicação de apenas 96,75% dos recursos, em ofensa ao art. 21, caput e §2º, da Lei nº 11.494/2007 e à jurisprudência consolidada desse Tribunal de Contas.”
Por fim, o órgão aponta que há descumprimento de recomendações, determinações e alertas de exercícios anteriores. E requer “a abertura de processo específico para apuração de responsabilidades e, sendo o caso, aplicação das multas previstas no art. 104, incisos IV e V, da mesma lei”
Confira na íntegra a resposta do Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo:
Dos 14 (quatorze) decretos envolvendo renúncias fiscais editados em 2019, oito tratam de prorrogações de benefícios que já se encontravam estimados nos cálculos das renúncias consubstanciadas nas leis orçamentárias de anos anteriores.
Quanto aos seis decretos que instituíram novos benefícios em 2019, ressalta-se que o Art. 14 da Lei Complementar Nº 101, de 4 de maio de 2000, prevê o cumprimento de um entre dois requisitos mutuamente excludentes para a concessão de benefícios fiscais:
- a consideração da renúncia na estimativa de receita da lei orçamentária,
ou, alternativamente,
- a adoção de medidas de compensação, com reflexo no aumento de receita.
A estimativa de receita (I) da lei orçamentária é aquela realizada na forma do art. 12 da Lei de Responsabilidade Fiscal, logo deve observar os prazos para encaminhamento das propostas orçamentárias, o que foi integralmente cumprido pelo Estado de São Paulo.
As medidas de compensação (II), por sua vez, não dependem das propostas orçamentárias, de acordo com entendimento expresso pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 2238/DF:
“A implementação da condição prevista no art. 14, II, da Lei de Responsabilidade Fiscal somente terá lugar quando os novos gastos tributários não puderem ter seu impacto quantificado e avaliado dentro do orçamento. Nesse aspecto, o art. 14, II, da LRF funciona como uma cláusula de incentivo à conciliação entre as deliberações gerais do processo orçamentário e aquelas relativas à criação de novos benefícios fiscais.”
Desta forma, é conforme ao ordenamento brasileiro a concessão de benefício fiscal do ICMS se, cumprido o estabelecido na Constituição (art. 155, § 2º, Inciso XII, alínea “g”), for editada medida de compensação, nos termos do art. 14 da LRF. Caso a medida de compensação não esteja prevista na LDO em nada será afetada a validade da concessão, pois essa alternativa tem sentido justamente na circunstância em que, nas palavras dos Ministros do STF, “os novos gastos tributários não puderem ter seu impacto quantificado e avaliado dentro do orçamento”.
Importante ressaltar que, no âmbito do Tribunal de Contas do Estado, todos os órgãos técnicos envolvidos na apreciação se manifestaram favoravelmente à prestação de contas apresentada pelo Governo do Estado, inclusive quanto à questão das renúncias fiscais.
Todas as informações solicitadas tanto pelo Ministério Público de Contas quanto pelo TCE sempre foram pronta e devidamente ofertadas pela Secretaria da Fazenda e Planejamento, contando também com o aval da Procuradoria Geral do Estado.
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