28 de junho: Dia Internacional do Orgulho LGBTI+
A chamada ‘Rebelião de Stonewall’ ocorreu em 28 de junho de 1969, quando frequentadores daquele bar gay em Nova York reagiram e resistirem contra a opressão policial que ocorria na forma de repetidas batidas e prisões no local. Foi o marco histórico que é comemorado desde então como o Dia Internacional do Orgulho LGBTI+. Significa ter orgulho de ser o que é, e não vergonha ou culpa, e ter a coragem de lutar por isso na adversidade. O conflito durou três dias e as cenas relembram os protestos recentes contra a violência racista por alguns policiais nos Estados Unidos. As histórias se repetem e parece que a humanidade não aprende com as lições anteriores.
Quase dez anos depois da Rebelião de Stonewall, e ainda na ditadura militar, o Movimento LGBTI+ brasileiro teve seus passos iniciais por volta de 1978, com o jornal Lampião da Esquina, o Grupo Somos, o Grupo Gay da Bahia e vários outros grupos que surgiram naquela época.
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Na década de 1980 veio a aids. Muitos militantes LGBTI+ foram para o Movimento Aids e por causa disso e por causa de divergências internas, o Movimento LGBTI+ se fragmentou. Em 1990 só havia em torno de dez grupos LGBTI+ em todo o Brasil.
Em 1992, fui cofundador do Grupo Dignidade em Curitiba. No primeiro estatuto já constava como uma de suas finalidades “promover a organização dos grupos homossexuais do Brasil em uma confederação”. Os relatórios dos primeiros Encontros Brasileiros de Homossexuais, realizados no início dos anos 1980, também informam que este foi um objetivo do Movimento dez anos antes, mas que não se realizou àquela época.
Em Curitiba, em janeiro de 1995, o sonho se realizou. Trinta e um dos 35 grupos presentes na assembleia de fundação votaram pela criação da então chamada Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis – ABGLT. Mesmo assim, houve protestos de quem não queria a fundação da organização. Crescemos e no final dos anos 1990, desenvolvemos o Projeto Somos, que incentivava a formação de grupos LGBTI+ para atuarem em prol da cidadania da nossa comunidade e também responder à epidemia da aids. Em meados da década de 2000, a ABGLT tinha mais de 300 grupos afiliados.
Em 2003, paralelamente a outras redes, fundamos o que passaria a ser a Aliança Nacional LGBTI+, na época com o nome Asical, que seria o sonho de uma organização suprapartidária e pluripartidária. Suprapartidária, significando acima de qualquer partido político no sentido de não se deixar pautar por um ou outro partido, até porque em torno de 50% das pessoas afiliadas à Aliança não tem afiliação partidária; e Pluripartidária porque os outros 50% estão afiliados aos mais diversos partidos, somando representação de 27 dos 33 partidos atualmente existentes no Brasil, da esquerda à centro-direita.
Também nesta mesma época (início dos anos 2000), trouxemos para o Movimento LGBTI+ brasileiro o conceito de advocacy, isto é, a estratégia de incidir junto a quem tem poder de tomada de decisão para amenizar problemas enfrentados por determinadas populações. Este conhecimento adquirimos em vários encontros no México, na Colômbia e nos Estados Unidos.
Em 1995 tivemos a apresentação do projeto de lei da então Parceria Civil Registrada entre pessoas do mesmo sexo, proposta pela então deputada federal Marta Suplicy (PT/SP), do qual participei assiduamente da elaboração e nos debates a respeito no Congresso Nacional. Assim como diversas outras proposições legislativas voltadas para garantir a igualdade de direitos e a segurança jurídica da população LGBTI+, o PL 1151/95 encontrou oposição ferrenha e nunca chegou a ser votado em plenário.
Em 2001 a então deputada federal Iara Bernardi (PT/SP) apresentou o projeto de lei 5003/2001 que teve por objetivo a criminalização a violência e discriminação LGBTIfóbicas. Em 2005, o projeto foi aprovado em plenário, sob a presidência de Luís Eduardo Magalhães (PFL/BA). O projeto foi para o Senado, com nome PLC 122/2006. Eu mesmo participei de em torno de dez audiências públicas sobre a proposição e uma infinidade de reuniões também. O PLC 122/2006 nunca chegou a ser votado e “se estacionou” em 2011/2012.
Em 2010, realizamos um seminário em Brasília sobre litigância estratégica, com a participação de vários grupos e a participação especial de Marcela Sánchez, da organização Colombia Diversa, que expôs a experiência naquele país com questões de direitos das pessoas LGBTI+ no judiciário. Em vista da omissão e os entraves no Congresso Nacional, juntos/as decidimos que nossa luta tinha que ir para a litigância, em especial a união estável/casamento entre casais do mesmo sexo e também a criminalização da LGBTIfobia, com o apoio de alguns partidos políticos e muitos/as militantes. Ao lado do já existente Projeto Aliadas, de advocacy no Congresso Nacional, criamos o Projeto Sinergia, de litigância estratégica no Judiciário, às vezes com financiamento, a maioria das vezes sem. Pessoalmente, desde 2005 geralmente pelo menos uma vez por mês fico três dias em Brasília, porque é onde há o poder e os/as tomadores/as de decisão objeto de nossas ações de advocacy. Desde aquela época, tivemos audiências com todos os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, para expor a nossa pauta.
E a litigância estratégica deu certo. Em 2011 o Supremo Tribunal Federal reconheceu unanimemente o direito à união estável igualitária, que por resolução do Conselho Nacional de Justiça se estendeu ao casamento civil em 2013. Em 2015, o STF reconheceu o direito de casais do mesmo sexo adotarem filhos/as. Em 2018 reconheceu o direito das pessoas trans à identidade de gênero. Em 2019, reconheceu a discriminação e violência LGBTIfóbicas como uma forma de racismo punível criminalmente como tal e em 2020 já houve três decisões classificando como inconstitucionais leis municipais que procuravam proibir a “ideologia de gênero” nas escolas em Novo Gama-GO, Foz do Iguaçu-PR e Ipatinga-MG.
Ficamos conhecidos no STF. Tivemos audiências com todos/as os/as ministros/as e como os presidentes e a presidente do STF, com apoio de senadores/as e deputados/as e partidos políticos, muitos/as ativistas e muitos/as advogados/as, com destaque ao Paulo Iotti, Eliseu Neto, Julian Rodrigues, Cláudio Nascimento, Rafael Kirchhoff, Gisele Schmidt e Silva, Maria Eduarda Aguiar da Silva, Andressa Bissolotti, Marcel Jeronymo, Ananda Pucha, entre muitas outras pessoas.
Temos vitórias para comemorar. Temos muito a nos orgulhar. Somos muitos e estamos em todos os lugares. Mas também ainda há muito ainda a ser feito. Precisamos chegar às famílias, às escolas, aos locais de trabalho, às igrejas, enfim, incidir na sociedade para conquistarmos a cidadania plena das pessoas LGBTI+. Muitos serão os desafios para sairmos do gueto e integrarmos a sociedade, formarmos parcerias de resistência para uma frente ampla para a defesa da democracia.
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