Apesar de críticas de diversas associações, ONGs e movimentos sociais, tramitam na Câmara e no Senado, há pelo menos dois anos, dois projetos de lei que buscam alterar a chamada Lei Antiterrorismo (Lei nº 13.260, de 2016). O primeiro, o PL 1595/2019, do deputado Major Vitor Hugo (PSL – GO), já foi aprovado na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e busca regulamentar ações do estado para prevenir e punir atos de terrorismo. Já o PL 272/2016, do senador Lasier Martins (Podemos – RS), está parado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desde abril de 2019 e amplia penas e atos considerados terroristas.
Segundo matéria de Jamil Chade, sete relatores da Organizações das Nações Unidas (ONU) enviaram carta ao governo brasileiro pedindo que as autoridades prestem esclarecimentos e reconsiderem a aprovação de ambos projetos de lei. Para a ONU, as propostas poderiam silenciar críticos e oposicionistas ao governo, além de criminalizar movimentos sociais, greves, e restringir liberdades fundamentais.
No Senado
O PL 272, de Lasier Martins, tem como relator na CCJ, desde abril de 2019, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que ainda não apresentou parecer da proposta. Ao Congresso em Foco, a assessoria do senador justificou o não posicionamento sobre o texto como decorrente da suspensão de comissões que ocorreu no Congresso Nacional por causa da pandemia de covid-19.
Para introduzir dispositivos vetados pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) na Lei Antiterrorismo, a proposta do Senado amplia os atos considerados terroristas pela lei de 2016 e classifica como terrorismo incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado, “com o objetivo de forçar a autoridade pública a praticar ato, abster-se de o praticar ou a tolerar que se pratique, ou ainda intimidar certas pessoas, grupos de pessoas ou a população em geral”.
O texto de Lasier Martins também considera terrorismo “interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados, com motivação política ou ideológica”. A pena estipulada para todas essas condutas seria de 12 a 30 anos de reclusão. O PL também busca punir quem “recompensar ou louvar” práticas terroristas e quem abrigar envolvidos com atos de terrorismo, a não ser que o acolhimento seja feito por parentes, cônjuge ou companheiro estável do terrorista.
Na Câmara
Outros pontos mais criticados pela ONU estão no PL do Major Vitor Hugo, que também autoriza a infiltração de agentes públicos em organizações consideradas terroristas “se houver indícios de condução de atos preparatórios”. O projeto tem proposta semelhante a do Senado, ao propor a ampliação da punição e da repressão, a partir da Lei Antiterrorismo, de atos que sejam “perigosos para a vida humana” ou “potencialmente destrutivos em relação a alguma infraestrutura crítica, serviço público essencial”.
O texto da Câmara se estende ainda aos atos que “aparentem” ter a intenção de “intimidar ou coagir a população civil ou de afetar a definição de políticas públicas por meio de intimidação, coerção, destruição em massa, assassinatos, sequestros ou qualquer outra forma de violência”.
Quanto a esses trechos, os relatores das nações unidas apontam, segundo a matéria, que a expansão da definição do terrorismo poderia limitar o exercício das liberdades fundamentais de opinião, expressão e associação, além de remover a proteção a atores da sociedade civil e a defensores dos direitos humanos. “As mudanças legislativas propostas pelo PL 1595/2019 expandem significativamente o conceito de terrorismo no direito interno”, diz a carta endereçada ao governo brasileiro.
“A indefinição dos conceitos poderia assim incluir manifestações públicas organizadas, tais como protestos e greves, assim como qualquer ação ou manifestação, inclusive individual e digital, que possa “afetar a definição de políticas públicas”, diz um outro trecho do documento, segundo a coluna de Jamil Chade. “Uma definição excessivamente ampla [do crime de terrorismo] pode contribuir significativamente para a criminalização dos movimentos sociais e das manifestações em geral, pois estes frequentemente têm uma motivação ‘política, ideológica ou social'”.
Violação de direitos
A carta da ONU foi enviada ao Itamaraty em 15 de junho, como um alerta de que o Brasil vai violar o direito internacional e suas obrigações assumidas caso os projetos de lei sejam aprovados. À coluna do UOL, o Itamaraty esclareceu que encaminhou ao órgão, no dia 18, informações do Ministério da Justiça e Segurança Pública sobre as propostas. Em sua defesa, o governo diz que ambas respeitam a Constituição e as exigências internacionais, que “consultas foram realizadas sobre as leis” e que as alegações dos relatores da ONU seriam de “natureza prematura”.
O Congresso em Foco também procurou o Itamaraty e o Ministério da Justiça e Segurança Pública para averiguar o recebimento da carta e a resposta enviada às Nações Unidas, mas ainda não obteve esclarecimentos. O espaço segue aberto para manifestações. Também foi procurado, via email e telefone, o autor do PL que tramita na Câmara, deputado Major Vitor Hugo, que não atendeu às ligações.
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