Cristina Roberto *
A realidade é constrangedora: de acordo com pesquisa “Estatísticas de gênero – Indicadores sociais das mulheres no Brasil”, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em março deste ano, o Brasil é o país da América do Sul com menor presença feminina na Câmara dos Deputados. Ocupamos 10,5% das 513 cadeiras e estamos na 152ª posição, entre 190 nações pesquisadas, no ranking mundial da participação das mulheres na política.
Nossa representação é nada menos do que a metade da representação feminina na Arábia Saudita (20,3%), país onde a mulher conquistou o direito de dirigir recentemente e ainda usa véu e burca! Estamos atrás, muito atrás de Ruanda, país com maior representação de mulheres no Parlamento com 61,3%, do segundo lugar, a Bolívia (53,1%) e de Cuba (48,9%), o terceiro colocado no ranking.
No Brasil as mulheres representam 51% da população e 52% do eleitorado, mas esse percentual não é o mesmo encontrado nos espaços legislativos e de poder: além da ínfima representação na Câmara Federal as mulheres ocupam menos de 10% nas assembleias legislativas, 16% no senado e 12% nas câmaras municipais. São apenas 628 prefeitas e nenhuma governadora.
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O mais grave, contudo, é que a sub-representação da mulher no parlamento brasileiro é apenas o reflexo das dificuldades enfrentadas pelas mulheres ao disputarem espaços de poder. A mesma pesquisa do IBGE constatou que nos lares brasileiros as mulheres dedicam 18,1 horas semanais aos cuidados de pessoas ou afazeres domésticos – cerca de 73% a mais de horas do que os homens. Não bastasse isso, ganhamos em média três quartos do salário dos homens, mesmo que tenhamos escolaridade superior à dos homens.
Não é fácil conciliar dupla ou até tripla jornada de trabalho, vida pessoal e familiar com ação política. No Brasil, atuar em qualquer esfera de mando é muito difícil para qualquer mulher, a organização da sociedade não dá suporte e não raro elas abdicam de suas aspirações em prol da vida familiar. Criadoras da vida e cuidadoras que somos, assumimos uma tarefa que devia ser coletiva, de homens e mulheres e do Estado brasileiro.
Mesmo com tantas dificuldades a cada dia mais mulheres adentram no universo político, porque percebem que se não fizerem isso estarão sempre sub-representadas na elaboração das leis que podem ajudar a mudar essa realidade de desigualdades. Se mais da metade da população brasileira é formada por mulheres, está mais do que na hora de ocuparmos representação correspondente no Parlamento. A cota mínima de 30% de mulheres entre os candidatos está sendo superada em muitos partidos – no caso do PT, por exemplo, das 16 candidaturas pré-aprovadas para disputarem a Câmara Federal, sete são de mulheres.
Mas é preciso dotar as instituições de mecanismos que permitam que a mulher possa exercer plenamente sua cidadania, participando em igualdade de condições nas disputas eletivas. Mais creches, políticas de apoio às mulheres trabalhadoras, o combate à segregação de gênero no meio profissional são ações que cabem ao Estado promover e que com certeza impactariam no número de mulheres dispostas a enfrentar os desafios de uma candidatura.
Neste momento em que a humanidade carece como nunca de mais solidariedade, harmonia, tolerância e respeito, é ainda mais necessária a visão feminina na tomada de decisões públicas. É preciso que a sociedade incentive, apoie e, claro, vote nas mulheres para os cargos eletivos. Para que mais mulheres possam mostrar sua força nas urnas, mais igualdade em toda a sociedade, é essa a simples equação.
* Cristina Roberto, cozinheira, empreendedora e ativista cultural, é defensora da alimentação segura e saudável.
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