Neste 1º de maio mulheres brasileiras têm pouco a celebrar em termos de sua inserção no mundo profissional. O trabalho doméstico não remunerado consome um quarto das horas úteis de seu dia. O tempo que gastam com trabalho não pago (inclusive o doméstico) é quase três vezes maior do que o dos homens. Persistência da diferença salarial, necessidade de seguir trabalhando mesmo com o avanço da idade e discriminação aceita como normal. Esses são alguns dos indícios que se apresentam em uma exploração da plataforma Nosso Mundo em Dados.
O trabalho doméstico não remunerado, aquele que compõe a dupla jornada das mulheres, consome delas, em média, quase seis horas diárias. Quando se considera todo o trabalho não pago, que inclui o trabalho doméstico não remunerado, as mulheres dedicam quase o triplo (2,7 vezes) de tempo do que os homens. A dupla jornada é tangível.
As mulheres estão precisando trabalhar até idades mais avançadas. Quando se compara o ano de 1990 com o de 2017, percebe-se nitidamente o envelhecimento da força de trabalho feminina.
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Mulheres com mais de 65 anos trabalhando eram 1,01% em 1990 e passaram para 2,45% em 2017 (mais que dobraram). Aquelas entre 55 e 64 anos foram de 4,67% para 8,97% no mesmo período (também praticamente dobraram).
Mesmo nas faixas etárias de 45 a 54 anos e 35 a 44 anos também houve evolução (11,6% para 18,56% no primeiro caso e 21,42 para 24,99% no segundo caso). Esses aumentos foram confirmados por reduções nas faixas etárias mais baixas (de 30,2% para 27,19% na faixa de 25 a 34 anos e de 31,1% para 17,84% na faixa de 15 a 24 anos). O dado sobre a faixa etária mais nova revela outro aspecto ruim: o desemprego entre as mulheres mais jovens. Ou seja, mulheres mais velhas empregadas trabalham mais anos enquanto as mais jovens não encontram emprego.
PublicidadeQuando se trata de um tema espinhoso, a diferença salarial, o Brasil fica em uma posição ruim.
O gráfico apresenta a diferença entre ganhos de homens e mulheres como percentual dos ganhos médios de homens. O tamanho dos círculos reflete o tamanho das populações. No Brasil (os dados são de 2017) os homens ganham, em média, 15,97% a mais do que as mulheres (para as mesmas ocupações).
Finalmente, percebe-se que as mulheres ainda são explicitamente discriminadas quando se pensa em trabalho. Quando confrontados com a seguinte afirmação: quando o trabalho é escasso, os homens devem ter mais direito a um trabalho do que as mulheres, 37% dos pesquisados respondem afirmativamente.
Legislativo
Do ponto de vista do Congresso, pouco se pode esperar também. Tornou-se tradição que a Semana da Mulher (a do dia 8 de março) seja dedicada às pautas femininas. Questionável a reserva de uma janela tão estreita para discussão de temas concernentes às mulheres, que são maioria na população brasileira.
Ainda assim, este ano, a semana da mulher no Legislativo foi comprometida com as discussões da PEC Emergencial. Temas concernentes às mulheres foram deslocados para a semana seguinte, que, por sua vez, foi ocupada por votações de uma Medida Provisória e por sessão do Congresso Nacional. A pauta feminina ficou restrita ao dia 18 de março, em uma sessão que acabou sendo atrapalhada pela tentativa do governo de colocar na pauta um projeto estranho, sobre composição do leite nas merendas escolares. A semana da mulher vai se convertendo em mais uma daquelas tradições brasileiras criadas para inglês ver.
Entretanto, uma das conquistas dessa semana foi a criação formal da figura de líder e vice-líder da bancada feminina no Senado. A iniciativa teve apoio das 12 senadoras e o grupo passou a contar com a estrutura e as prerrogativas oferecidas para líderes de partido ou bloco parlamentar, como preferência para uso da palavra, possibilidade de orientar votações e de participar do colégio de líderes do Senado.
No entanto, mesmo com este avanço, a CPI da Covid, que investiga ações e omissões do governo federal, estados e municípios durante a pandemia, uma das mais importantes comissões dos últimos anos, não conta com uma representante feminina entre os 11 membros titulares, tampouco entre os suplentes.
Durante sessão para eleição de presidente e vice do colegiado, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) respondeu à fala de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), ao afirmar que “as mulheres já foram mais respeitadas e mais indignadas” ao comentar a falta de representação feminina na CPI.
“Não vamos admitir ironia machista contra as mulheres. […] Não usamos o argumento da autoridade. Usamos a autoridade do argumento”, disse Eliziane.
As mulheres da Casa organizaram uma escala para participar presencialmente de todas as sessões da CPI com ao menos uma senadora. “Já íamos participar da CPI diuturnamente, porque nada é mais importante para a bancada feminina que entender os erros mortais que mataram centenas de milhares de brasileiros, e continuam matando. Agora, provocadas, estaremos de plantão 24 horas”, disse Simone Tebet (MDB-MS).
Manobra do governo
Após dez anos de tramitação no Congresso, o Senado aprovou o PL 130/2011, que prevê multa a empresas que pagarem salários diferentes a homens e mulheres que desempenhem a mesma função.
A aprovação foi considerada uma vitória da bancada feminina na Casa, no entanto, em transmissão pela internet, Jair Bolsonaro chegou a dizer que se sancionasse o projeto sofreria críticas dos empresários e se vetasse, sofreria pressão das mulheres. O presidente disse ainda que tomaria uma decisão com base em comentários deixados em uma rede social.
A solução do Executivo foi um pedido feito pelo primeiro-secretário do Senado, senador Irajá (PSD-TO) para driblar a sanção e retornar o projeto para a Câmara. No ofício, o parlamentar afirma que a medida foi adotada após pedido do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e com o argumento de que a versão aprovada pelos senadores alterou o mérito da proposta.
A mudança feita pelo Senado ajustou trecho do PL para prever que a multa em favor da empregada será de “até cinco vezes” a diferença salarial verificada em todo o período da contratação. O texto aprovado pela Câmara previa multa “de cinco vezes”.
Na quinta-feira (29), deputados aprovaram urgência para apreciação do projeto. Durante a discussão, Gilson Marques (Novo-SC), vice-líder da bancada do Novo na Câmara, foi o único a orientar de forma negativa.
Entre os argumentos, o deputado citou diferenças biológicas de gênero, já superadas pela sociedade. “Os empreendedores pagam conforme o resultado, e não conforme o sexo ou a cor. Essa é uma realidade dura que precisamos encarar. Não fosse assim, os empreendedores só contratariam homens, e isso não é verdade porque os empreendedores querem sempre economizar, obviamente. Mas eles contratam, sim, mulheres porque muitas vezes elas são competentes, são merecedoras e têm habilidade diferentes”, apontou.maiores na média de estatura; as mulheres são mais cautelosas, os homens correm mais riscos”, disse.
As declarações do parlamentar causaram repúdio das mulheres da Casa. A deputada Lídice da Mata (PSB -BA) disse que os argumentos usados por Gilson são “mitologias criadas pelo machismo no nosso país que nós queremos superar. O Congresso Nacional e a Câmara dos Deputados cumprem esse papel de superar mais esta dificuldade, esta inconstitucionalidade da prática no meio do trabalho em nosso país”.
Mesmo aprovada urgência, o projeto ainda não tem data para ser votado.
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