Chico Alencar*
Olimpo, na Grécia Antiga, era a morada dos deuses. Olímpico, no sentido figurado, quer dizer majestoso, sublime. Os Jogos Olímpicos modernos existem desde 1896. Foram inspirados por um educador francês, o Barão de Coubertin, conhecido pela frase pouco praticada: “o importante não é ganhar, mas competir”. Os esportes, que alguns caracterizam como forma suave de canalizar a tendência à guerra, devem promover saúde, disputa saudável, torcida, superação.
Hoje eles estão dominados pelo “business”, pelos investimentos capitalistas para gerar lucros. Os espetaculares Jogos Olímpicos, que todas as grandes cidades do mundo pleiteiam abrigar, tornaram-se um grande negócio multinacional.
Mas não perderam sua dimensão de confraternização de povos e desafio à superação de limites. Torcemos para que o Rio conquiste o direito de sediar as Olimpíadas de 2016, algo inédito na América do Sul. E vamos fiscalizar para que qualquer centavo de recurso público empregado na preparação da cidade, com esses sete anos de antecedência, obedeça a dois imperativos “olímpicos”: a absoluta transparência e o pleno sentido social do investimento.
Tudo o que faltou no caso dos Jogos Panamericanos, que sediamos em 2007! Com promessas de crescimento econômico, equipamentos esportivos modernos, novas escolas, melhoria do sistema de transporte, infraestrutura nas favelas e despoluição das lagoas e da Baía de Guanabara, a verdade é a massa da população carioca não percebe nada do que supostamente foi deixado pelo Pan.
Com o passar dos meses, o ideal e o espírito de confraternização representado pelos Jogos transformaram-se numa sucessão de denúncias, inquéritos, processos administrativos e judiciais. O orçamento feito em 2002 estourou em quase dez vezes!
Os aportes de capital privado não apareceram na hora de construir um Estádio Olímpico. Os patrocinadores declinaram do apoio à instalação de um velódromo e de um parque aquático onde outrora existia parte significativa da pista do Autódromo Nelson Piquet. Uma concessão foi renovada por 50 anos para que a Marina da Glória e o Aterro do Flamengo fossem transformados numa área num complexo turístico e comercial privado. Grandes construtoras não se revelaram capazes de assumir, sozinhas, a construção de uma Vila Olímpica.
Houve conflitos abertos entre o Poder Público e comunidades situadas em locais próximos às principais intervenções. Duas delas foram sumariamente removidas e outras tantas ameaçadas de remoção. Os transportes públicos, como metrô e barcas, não melhoraram: nem novas linhas, nem Veículo Leve Sobre Trilhos. A educação e a saúde continuam mal, e a segurança pública precária. As duas últimas foram objeto de uma cínica ‘operação de excelência’, apenas nos quinze dias em que o evento, exitoso em si, ocorreu.
O saldo das atividades de desenvolvimento dos esportes olímpicos no Rio, segundo avaliação de renomados atletas, é desanimador. As federações esportivas seguem insatisfeitas com as instalações e a preparação dos atletas, e não houve incremento massificador dos esportes nas escolas. A atleta de saltos ornamentais Juliana Veloso questiona se o Brasil pretende que seus atletas fiquem, por falta de investimentos, do lado de fora das competições olímpicas, apenas assistindo e batendo palmas…
Por absurdo, o remodelado Parque Aquático Júlio Delamare, no complexo do Maracanã, e que atende a quase mil pessoas diariamente, vai ser destruído para, por exigência da Copa do Mundo de Futebol, em 2014, virar estacionamento… Planejamento, previsão, zelo com gasto público estacionado!
Os vereadores do Rio, por iniciativa de Eliomar Coelho (Psol), bem que tentaram passar a limpo as contas do PAN, no final de 2007, numa avaliação séria e abrangente do processo de organização e realização. Mas a bancada do então prefeito Cesar Maia (DEM) boicotou a CPI aprovada para este fim.
Para comemorar com grandeza cidadã a conquista dos Jogos Olímpicos, que tanto esperamos, não podemos repetir esta história!
A verba orçada para organização das Olimpíadas de 2016 no Rio – nossa bela e problemática cidade – é cinco vezes maior do que a de Madri, três vezes maior do que a estimada por Chicago e o dobro de Tóquio. Isso demandará de todos os que defendem o controle social e projetos duradouros, confirmada a sede, a constituição um “Comitê Social Rio 2016”. Para marcar em cima e exigir uma plataforma de compromissos a serem cumpridos nestes sete anos que temos pela frente. Um megaevento só de grandes negócios, apenas para ganhos privados, não dará futuro!
Uma outra Olimpíada é possível e necessária, desde já. O povo do Rio, estimulado, conquistará esta medalha.
*É professor universitário, historiador e deputado federal pelo Psol do Rio de Janeiro.
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