Finalmente consegui ouvir a moça. Anteontem (24), na Band, na hora que a Globo transmitia o Oscar. Até então, havia acompanhado uma semana de histeria, gritos de ordem e chiliques de todas as ordens. Difícil ficar do lado de quem acusava Yoani de traidora e vendida pros “ianques”, a desqualificava por ser uma blogueirazinha desdentada e, sobretudo, a ameaçava em sua integridade física e verbal. Não bastasse, ainda culparam a famigerada “mídia golpista” pela cobertura exagerada dada ao caso. O que os nossos revolucionários, depois de repetir o vexame da Bahia na livraria Cultura de São Paulo, queriam que a tal da “mídia golpista” fizesse?
Mas não ficou só nisso. Yoani não foi recebida no Congresso Nacional pelos heróis da pátria. No lugar de Genoino e Dirceu, Bolsonaro e Caiado fizeram as honras da casa. Outra vez: queriam o quê? Além disso, a traidora da revolução ganhou uma coluna no Globo, foi acusada de servir a Opus Dei e de ser bolsista do Instituto Milennium, ninho de cobras do PSDB, etc, etc.
Falando em Opus Dei, imagino o rock and roll que não deve ser uma reunião com Yves Gandra, Alckmin e agora a sensualíssima Yoani, confrades da Virgem Maria tramando contra o oprimido povo trabalhador e os menos favorecidos.
Será que os manifestantes da livraria Cultura já ouviram falar em lógica e verossimilhança? E de um treco chamado senso de ridículo? Eu desconheço artigo do Código Penal que diz que é crime trabalhar para a família Marinho, ou que é vedado a blogueiras cubanas ganhar prêmios internacionais e/ou pernoitar em hotel cinco estrelas, nem tampouco – creio – constitui ilegalidade ser fotografada ao lado de ruralistas mato-grossenses e tomar água de côco no calçadão de Copacabana. O fato de Yoani estar comunista há 37 anos não quer dizer que ela nem que boa parte dos habitantes de Cuba acreditem em Papai Noel ou no Fidel Castro.
Estranho seria se o Instituto Lula pagasse as passagens da blogueira, e o Mino Carta oferecesse uma coluna na Carta Capital para Yoani desancar a política externa brasileira. Aliás, nesse quesito ela caprichou. Foi enfática na resposta que deu a Fernando Mitre, diretor de Jornalismo da Band: o Brasil é omisso, permanece vergonhosamente calado no que se refere à violação dos direitos humanos em Cuba. Yoani não vai ser exaltada na capa da Caros Amigos, nem Evo Morales será o homem no ano da revista Veja, difícil de entender? Ou será que a lógica, essa traidora da revolução, também se vendeu pros ianques?
Da última vez que tratei desse tema, e retruquei a companheirada nos mesmíssimos termos, devia estar na sétima série do ginásio, e tinha 13 anos de idade. Havia feito uma promessa a mim mesmo que jamais voltaria ao cercadinho das crianças malcriadas. Tô até meio envergonhado, depois de tanto tempo, tirando ranho do nariz, e usando os mesmíssimos argumentos. Quem vai derrubar a ditadura cubana é o sorvete na testa.
O que me deixa perplexo é que, depois de 33 anos, as coisas não mudaram nada… aqui no Brasil! A mesma lenga-lenga. E se o McDonalds estivesse financiando a perigosíssima dissidente? Qual a diferença da grana de Ronald Mc Donald’s pra grana da dona Milu Vilela? Bem, se eu quiser achar diferenças hediondas, eu acho, mas é melhor perguntar: que sentido faz colocar a saúde e a educação de um lado no ringue e, do outro, a liberdade de expressão e a democracia?
Entrar numa discussão dessas, jogar com pesos e medidas viciados, fazer analogias, é voltar aos 13 anos de idade, malditos ianques! Querem ver? Se eu dissesse que saúde, vacinação e capim são prerrogativas pra boi que engorda no pasto, e que dar educação pro gado é indicar o caminho do matadouro, estaria apenas confrontando nada com coisa nenhuma. Pois foi exatamente esse o debate que se estabeleceu aqui em nossas plagas:
Yoani Sánchez é mensageira de um passado que ela mesma sabe que não existe mais. Caiu de podre. Por outro lado, advogar a favor de uma liberdade de expressão que mente, manipula, demite por delito de opinião, desqualifica, julga, condena e aplica censura a seus desafetos como se fosse um tribunal de exceção, é outra roubada. Viva Yoani! A deusa da morte em vida. Mensageira dos zumbis. Caros amigos, queridas leitoras e leitores: não serei eu a defender uma “liberdade de expressão” que não é outra coisa senão matadouro. Portanto, o mínimo que podíamos ter feito era ouvir educadamente o que a moça tinha a dizer, e fazer lá nossas avaliações independentemente das cangas oficiais.
Sinto simpatia e solidariedade por Yoani. Não sou disso, mas ela merece o trocadilho e uma chance. Yoani Chances. Guardadas as proporções, porque também me estrepo de verde e amarelo por aqui, também estou ilhado, cercado de bons moços e oficinas literárias por todos os lados. Essa moça é de uma audácia e de uma coragem estimulantemente suicidas, deve ser o DNA deles lá em Cuba. Coisa rara aqui no Brasil: conheço muita gente que é capaz de entregar as pregas da alma por um ticket-refeição mais um vale-transporte rumo a Paraty.
Pensem que Yoani deixou a família em Cuba, que se ela fosse Julian Assange, inimiga pública número 1 dos EUA, estaria milionária e protegida num castelo indevassável. Não é o caso, Yoani é minoria, presa fácil. Ela voltará a morar em Cuba! Porra, eu quero ouvir o que essa mulher tem a dizer, tô cansado do blablabá de castrado brasileiro metido a intelectual. Yoani é de verdade.
Ademais, pensem nisso: qual a diferença entre assassinar milhares de inimigos do regime e liquidar milhões de almas vendendo empréstimos de financeiras num Domingão Sertanejo? Quem é mais nefasto: Stálin, Fidel, Fausto Silva ou Milú Vilela?
Nefastos todos, porém o pior deles é, a meu ver, o agiota que não perdoa as dívidas e cobra juros e biografias que transcendem a própria morte. Né, Loyola?
Em breve, o pesadelo vai virar outra coisa, e Yoani que se cuide até que os irmãos Castro caiam de podre, pra ela não cair junto. Entrementes, os filhos do Colégio Equipe acendem velas pra supracitada dona da Taií, agiota, madrinha e benfeitora dos barzinhos da Vila Madalena e culturais afins. Há muito não se via tanta agitação e escárnio, nunca se vendeu tanta vaselina e sanduíche de jontex. Escarneceram da desdentada blogueira e o carnavalzinho desses bostas, que devia ser fechado com chave de ouro, encerrou-se com as barbas de molho. Só por isso já valeu a visita de Yoani.
O bloco de Higienópolis se esbaldou. Estou de olho nos foliões, e uma coisa o profeta que baixou aqui vos diz: quem ama, nesse caso, é tão promíscuo e sórdido como aquele que odeia.
Em 1979, quando eu tinha 13 anos de idade, Lula incendiava os metalúrgicos de São Bernardo do Campo com seus discursos alucinados e cheios de testosterona (pro consumo dos puros), e Gabeira desfilava suas anistias de tanga de crochê nas areias igualmente escaldantes de Ipanema, enquanto o cavalinho sem medo levava pra Brasilia o presidente Figueiredo. Upa! Upa!
E eu já era carta fora do baralho, e já estava cansado de ouvir redundâncias de ambos os lados. Na entrevista que rolou simultaneamente à entrega do Oscar, Yoani disse que Cuba não é nenhum paraíso nem o mundo é o inferno que os ditadores octogenários de sua ilha querem fazer crer.
Acabei não sabendo quem levou o Oscar de melhor filme, torcia pra “Lincoln” – mataram ele no final. A ilha de Yoani está cercada de mundo por todos os lados. Seja bem-vinda Yoani, e volte sempre com notícias do inferno ou do paraíso. Pra gente aqui, do lado de fora, é tudo a mesma coisa.
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