Édison Freitas de Siqueira*
No sentido econômico, estar com as contas equilibradas diz respeito a empresas ou governos que possuam valores a receber e a capacidade de endividamento em valor maior ou igual ao do passivo já contraído para ser pago em curto, médio ou longo prazos. Por esta razão, ao avaliarmos a situação econômica, é importante verificar se os valores a receber correspondem, em quantidade e periodicidade de vencimento, às dívidas já contraídas somadas àquelas que ainda devem ser contratadas e/ou repactuadas.
Consequentemente, se diz que a situação econômica é ruim quando o patrimônio, a capacidade de produção e os recebíveis de curto, médio e longo prazos são menores do que as despesas e o valor dos empréstimos a pagar em igual prazos. Este desequilíbrio nas contas indica provável “default”, circunstância que encarece ou torna impossível a captação de novos recursos. Não por outro motivo que o Brasil paga a seus credores a Taxa Selic, o maior juro do mundo.
No caso da economia brasileira, os valores a receber correspondem: (1) a arrecadação total de tributos; (2) os valores recebidos pela União como distribuição de lucros de empresas privadas das quais o governo é sócio; (3) os valores obtidos em leilões de concessões governamentais nas áreas de transporte, comunicação, correio, produção de energia, exploração de recursos minerais etc; (4) as receitas provenientes da venda de ações de empresas antes controladas pelo Estado; (5) os recebíveis de royalties de exploração de petróleo, gás e minerais; e – quando não dão prejuízo – (6) os valores ganhos pelas empresas pública .
As despesas governamentais, por outro lado, correspondem ao dinheiro necessário para custear o Estado como um todo, ou seja: para (1) construir estradas, portos, aeroportos, hospitais; (2) promover segurança pública; (3) manter o Exército, a Marinha e a Aeronáutica; (4) socorrer e investir nos Estados e Municípios; (5) pagar salários a todos os funcionários e autoridades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; (6) pagar os benefícios previdenciários e indenizações devidas pela União; (7) pagar os juros e o valor principal dos empréstimos que vencem diariamente, em face das dívidas contraídas pelo governo junto aos bancos por meio de empréstimos diretos ou no mercado por meio da emissão de títulos da dívida pública, uma espécie de nota promissória que a União dá em garantia aos credores de todo o mundo, quando toma dinheiro emprestado na atrativa promessa de pagar juros selic “pro-rata” dia .
Ignorando estes fundamentos, o Poder Executivo, sem atender ao pressuposto constitucional da “urgência”, emitiu a MP n. 472, que, há pouco mais de 30 dias, foi convertida na Lei n. 12.249/10, que estabeleceu nova emissão de títulos públicos para lastrear um empréstimo de “202 bilhões de reais”. Estes recursos, na sua maior parte, destinaram-se ao BNDES, ao Banco do Nordeste, ao Fundo de Marinha Mercante e à Caixa Econômica Federal.
Só essa emissão de títulos, em junho de 2010, correspondeu a 12% do PIB, aumentando a dívida pública mobiliária nacional que, segundo dados do próprio Banco Central, já alcançava, dias antes, cifra superior a 64% do PIB, sem incluir neste cálculo, as dívidas diretas contraídas pelo Governo junto a bancos . Esses números, isolada ou conjuntamente, acompanhados da sequência de mais de 25 anos de baixos índices de crescimento econômico, indicam que existe um verdadeiro abismo nas contas governamentais . Essa condição fica mais grave ainda quando se verifica que na mesma lei em que foi autorizado este enorme empréstimo, também criou-se financiamento aos assentados do MST, no qual 50% do valor é doado aos devedores; perdoou-se 100% das dívidas de crédito rural inferiores a R$ 35.000,00; criou-se o Programa “Um Computador por Aluno” e os regimes especiais de isenção fiscal para as “pobres” empresas dos setores Petrolífero, da Informática e da Aviação.
Estas operações, às vésperas do processo eleitoral, agigantaram a dívida pública para mais de 912 bilhões de dólares, passivo que gera obrigação de pagar 600 milhões de reais de juros “ao dia”. E pasmem: o valor principal dos títulos públicos emitidos para buscar estes recursos, quase todos, vencem no prazo médio de 05 anos, enquanto que o BNDES, a Caixa e até o Banco do Brasil, para os quais foi transferida a maior parte do valor do empréstimo, cedem a mesma importância com prazos de pagamento entre 10 e 20 anos, com carência para início de pagamento entre 02 a 05 anos.
Este “default”, desequilíbrio entre entradas e contas a pagar, é uma bolha pronta para explodir nossa frágil economia, principalmente porque a arrecadação tributária, maior fonte de receita da União, já se encontra 100% comprometida com o pagamento das despesas nacionais correntes. A partir destes números, não se vislumbra hipótese real de como pagar a dívida pública se não houver crescimento econômico igual ou maior que 10% ao ano e/ou se o Banco Central não desvalorizar a moeda a tempo de aproveitar os ganhos cambiais obtidos sobre o estoque de dólares e reservas acumulados durante os Governos Lula e FHC (hoje 260,5 bilhões de dólares), únicas medidas que tornam possível a redução da dívida mobiliária nacional e o provável impacto que possa causar a fuga dos dólares de nossas reservas caso nosso mercado seja exposto pelo desequilíbrio de seus próprios números.
Enquanto esperamos, só nos resta torcer para que esta bolha não estoure. Quem viver verá!
*Presidente do Instituto de Estudos dos Direitos do Contribuinte
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