Marcos Morita*
A morte prematura de Steve Jobs, o gênio da Apple, lançou ao mundo algumas dúvidas. Porém, as recentes desconfianças que pairam sobre os mais assíduos consumidores da empresa, podem ser esquecidas pelo menos pelos próximos quatro anos. Segundo o jornal Daily Mail, Jobs deixou planos para os novos iPod, iPhone, IPad e Macbooks.
Perguntas como “Será que a Apple conseguirá manter-se inovadora e encantadora aos olhos de seus clientes, sem seu principal protagonista? Qual seu real papel na condução estratégica da empresa? Até que ponto sua filosofia, paixão e modo de trabalho estão presentes nas mentes e corações de seus funcionários? Conseguirá a Apple segurar seus melhores talentos?” são inevitáveis para a empresa de maior valor de mercado do mundo.
Para respondê-las, trago as ideias centrais de um livro que li recentemente, intitulado O Mito do Empreendedor, o qual apresenta alguns conceitos que podem ilustrar a situação da empresa de Cupertino. Conforme o autor, as pessoas têm dentro de si três grandes personagens: o empreendedor, o gerente e o técnico, com características bastante diferentes entre si, sendo que haverá sempre um perfil que se sobreporá aos demais. Vejamos.
O empreendedor: irrequieto, sonhador, criativo e visionário, tem por natureza viver sempre no futuro, enxergando oportunidades em locais em que ninguém as vê, transformando possibilidades em probabilidades e caos em harmonia. Em geral, com personalidade forte e centralizadora, controla as pessoas e fatos para poder seguir adiante com suas ideias. Costuma gerar atrito e perturbação ao ambiente de trabalho, levando seus colaboradores ao limite. Os depoimentos dos executivos ligados mais próximos a Jobs corroboram as afirmações acima.
O gerente: com personalidade pragmática, planeja, organiza e coloca ordem no caos deixado pelo empreendedor. Para ilustrá-lo, trago duas alegorias de Gerber, as quais demonstram o contraste entre os papéis. O gerente é aquele que cria fileiras bem arrumadas de objetos. O empreendedor por sua vez é aquele que cria os objetos que o gerente arruma em fileiras. O gerente constrói uma casa e vive nela para sempre. O empreendedor constrói uma casa e, tão logo esteja pronta, começa a planejar a próxima. Esta última frase talvez resuma o ritmo alucinante de lançamentos de produtos e novidades da Apple.
O técnico: individualista, conjuga o verbo fazer com perfeição. Tem como lema o “faça você mesmo”, sempre uma coisa de cada vez. Prefere executar ao invés de pensar. Para o técnico, empreendedor e gerente são sempre fontes de problemas. O primeiro, por interrompê-lo com ideias mirabolantes, as quais nem sempre são factíveis, enquanto o segundo por querer colocá-lo dentro de um sistema, como uma peça de engrenagem. Vale salientar que Jobs começou como técnico, executando com perfeição as ideias por ele criadas. Não por outro motivo, é fonte de inspiração para os engenheiros, mestres e doutores que com ele trabalharam.
Em suma, Jobs conseguia reunir em uma só pessoa os três personagens conflitantes: o empreendedor, o gerente e o técnico, os quais soube utilizar em maior ou menor grau durante toda sua carreira, ligando os pontos como ninguém, conforme histórico discurso proferido em Stanford.
Cabe ao seu sucessor a difícil missão de liderar, motivar e integrar empreendedores, gerentes e técnicos, fazendo com que a soma de suas habilidades ao menos se aproxime da genialidade de Steve. O sucesso da estratégia, só o tempo poderá dizer.
* Mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais
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