Eunício Oliveira*
Os escândalos amplamente divulgados pelos meios de comunicação e a recente confusão gerada pelas dúvidas da verticalização deixaram escancarada uma enorme dívida deixada pelo atual Congresso: não ter feito uma reforma política adequada à dinâmica da democracia e aos interesses do país no momento. Estamos às vésperas das eleições e não temos regras que impeçam o uso da máquina pública nas campanhas eleitorais pelo Brasil afora, que garantam uma disputa em condições de igualdade entres os candidatos aos mais variados cargos eletivos, ou que exijam fidelidade partidária de quem vai se eleger.
Um dos sintomas mais visíveis da desigualdade é a permissão para que candidatos no exercício do cargo possam concorrer à reeleição sem qualquer regra de desincompatibilização. Por mais incompreensível que seja, um governador não precisa desincompatilizar-se para concorrer à reeleição, mas tem que deixar o cargo se for disputar para senador ou deputado. É uma das grandes incongruências da legislação eleitoral atual.
Líder do PMDB no início da atual legislatura, preguei a necessidade de uma reforma política em grande parte das reuniões que participei ao lado de outros dirigentes de partidos políticos no Congresso Nacional. Meus colegas preferiram outros temas, a dinâmica dos acontecimentos desviou o processo político para outros rumos e o tempo passou. O andar dos acontecimentos acabou confirmando que eu tinha razão. Há poucos dias o país dormia com permissão de coligações livres nos Estados e acordou com uma interpretação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) exigindo que o partido que se coligasse a um candidato a Presidente da República só poderia se unir ao candidato do mesmo partido nos Estados. Todos lembram a confusão que se instalou e o TSE, sensível, voltou atrás. A verticalização pura e simples, sem que se mexa em outras regras, engessa os partidos e se transforma em casuísmo eleitoral.
Estamos em campanha e não há mais tempo para mudar nada do que está estabelecido para as eleições de outubro. As mudanças só poderão ser feitas pelas legislaturas que vão se instalar na Câmara e no Senado no ano que vem. Há poucos dias apresentei, em forma de Projetos de Lei e de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), algumas mudanças que julgo importantes para o aperfeiçoamento do sistema político.
Defendo que o primeiro item da pauta do Congresso no ano que vem seja a reforma política e, entre as alterações que devem ser implementadas, vejo como fundamentais a necessidade de desincompatibilização de todos os detentores de cargos no executivo seis meses antes das eleições; lista partidária fechada e voto distrital misto como instrumentos de fidelidade partidária; um parlamentar deve se sujeitar às decisões partidárias e quem deixar o partido pelo qual se elegeu deve também entregar o cargo; financiamento público para as campanhas eleitorais; e, entre outras modificações, a entrega da primeira e segunda suplências de senador aos candidatos não-eleitos para o cargo.
É um absurdo constatar que grande parte dos que assumem no lugar do titular, no Sendo, não tenha subido em palanque para defender propostas e nem se dado ao trabalho de pedir voto ao eleitor. Essa e outras anomalias que deturpam o processo eleitoral e perpetuam os vícios políticos históricos, ainda tão em pauta, só se corrigirão com uma reforma ampla e que modernize o sistema eleitoral. Precisamos afastar do caminho o que ainda resta de entulho herdado do período autoritário. Esse é um débito com a sociedade, que o próximo Congresso deverá pagar com prioridade e urgência.
* Eunício Oliveira (PMDB-CE), deputado e ex-ministro das Comunicações.
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