Antônio Augusto de Queiroz *
A última sessão legislativa da 52ª legislatura foi marcada pela crise política, que praticamente paralisou o processo decisório no Congresso, particularmente na Câmara dos Deputados. Das 140 sessões deliberativas convocadas na Câmara, das quais 25 realizadas durante convocação extraordinária, em 24 não houve quorum e em 92 a pauta estava trancada por medida provisória.
Nesse período, foram aprovadas 178 leis ordinárias, sendo 59 delas oriundas de medidas provisórias, 78 de projetos de lei, apreciados separadamente pela Câmara e pelo Senado, e 41 projetos sobre créditos suplementares (PLN), aprovados em sessão conjunta do Congresso. Dos 78 projetos de lei, 42 foram de iniciativa do Congresso (31 de deputados, nove de senadores e dois de comissões da Câmara), 124 de iniciativa do Poder Executivo, nove do Poder Judiciário, duas do Ministério Público e uma do Tribunal de Contas da União.
O Poder Executivo, portanto, aprovou 124 das 178 leis, correspondentes aos 24 projetos de lei (PL), 59 medidas provisórias (MP) e 41 projetos de créditos suplementares (PLN). Das 54 leis restantes, como já demonstrado, 42 foram de iniciativa do Poder Legislativo e 12 de outros poderes (Judiciário, MPU e TCU).
Analisando apenas os números, fica evidente que o Poder Executivo foi o grande legislador do ano de 2006. Essa leitura, entretanto, exige uma reflexão mais acurada. De fato, o Executivo aprovou 124 leis, mas os temas nelas tratados, em 90% dos casos, são de competência privativa do Poder Executivo, como as 24 MPs sobre matéria orçamentária (99% delas abrindo crédito extraordinário), as 35 leis oriundas de MPs e de projetos de lei sobre administração pública (90% de reestruturação de carreiras), além das 41 sobre créditos adicionais, aprovadas em sessão conjunta do Congresso.
Se, apenas para efeito de raciocínio, excluíssemos do universo das 124 leis de iniciativa do Poder Executivo todas as matérias orçamentárias (29 MPs e 41 projetos de créditos suplementares), que são de competência privativa do presidente da República, sobrariam apenas 46 leis oriundas do governo federal, apenas quatro a mais do que as 42 leis de iniciativa de parlamentares. Se, considerarmos, ainda, que o Congresso modificou quase todas as proposições de iniciativas do Poder Executivo que não havia impedimento de fazê-lo, constata-se que o Legislativo teve grande participação na formulação das políticas públicas.
O Congresso também aprovou, e foram transformadas em norma jurídica em 2006, além das leis ordinárias mencionadas, três leis complementares e cinco emendas à Constituição, todas de iniciativa de parlamentares. Assim, para efeito de número de leis de iniciativa de parlamentares, deve-se considerar, além das 42 leis ordinárias, as três complementares e as cinco emendas à Constituição, que totalizam 50 proposições transformadas em norma jurídica.
Além das leis ordinárias, complementares e emendas à Constituição, publicadas no ano passado, foram aprovadas em 2006, e sancionadas somente em 2007, mais duas leis complementares e sete leis ordinárias, inclusive a que cuida do marco regulatório do setor de saneamento.
Finalmente, como a imprensa chamou a atenção para o “excesso de medidas provisórias”, é importante registrar a média mensal de MPs transformadas em lei em 2006: 4,91, abaixo da média do último ano de FHC, que foi de 6,8. A média mensal de MPs transformadas em lei em 2006, apesar do ano atípico (crise política, Copa do Mundo e eleição), foi muito próxima da média dos três primeiros anos do primeiro mandato do presidente Lula, que foi de 4,76 MPs.
Este pequeno balanço demonstra que as aparências enganam. As manchetes de jornais, as revistas, as tevês e rádios denunciaram o suposto excesso de medidas provisórias e a completa submissão do Congresso ao Poder Executivo, em matéria de produção legislativa. Como estávamos em meio a uma grande crise política, poucas pessoas pararam para analisar friamente os dados e informações, para deles extrair uma convicção própria e real da situação. Como se vê, a performance do Poder Legislativo na produção das leis não foi muito diferente de anos anteriores, apesar da percepção de que foi muito pior.
* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
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