O diretor de construção do consórcio Norte Energia (Nesa), Luiz Fernando Rufato , responsável pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, disse em entrevista ao site G1 publicada ontem (6), que questionamentos contra Belo Monte são “ideológicos”. Na avaliação de Rufato, o processo de licenciamento de Belo Monte “não tem nada errado” e os questionamentos seriam “pêlo em ovo”.
Na tarde de ontem, o Ministério Público Federal do Pará entrou com a 11ª ação civil pública por problemas no licenciamento de Belo Monte. No documento, procuradores da República apontam onde estão os pêlos no grande e polêmico ovo de Belo Monte. Os dois maiores, segundo o MPF, estão na “grave violação dos direitos humanos” e na “falta de rigor do Ibama com o empreendedor de Belo Monte”, a empresa Norte Energia.
A violação dos direitos humanos fica, especialmente, por conta de dois pontos, sendo o primeiro de grande repercussão internacional: a questão indígena e a situação da população dos municípios atingidos. Entre as condições para a empresa conseguir a licença para iniciar as obras de construção de Belo Monte, estava a demarcação de terras indígenas da região e a remoção de não-indígenas dessas áreas. Pouco foi feito. Ainda assim, a Funai declarou um “sem obíce” e garantiu a licença definitiva de Belo Monte, ignorando a pressão fundiária que recairá sobre as terras indígenas.
Em relação à população diretamente atingida, uma das principais violações aos direitos humanos, segundo procuradores da República, se refere à falta de garantia de água potável para a população onde será instalada a hidrelétrica. Atualmente, em Altamira, principal município da região de Belo Monte, apenas 30% das moradias são beneficiadas pelo sistema de abastecimento de água do município. Desses, 100% não recebem água com condições de consumo, pois não há tratamento de água no município, nem inclusão de cloro e fluor na água.
Durante o processo de licenciamento, uma das condicionantes para que a empresa Norte Energia recebesse a autorização para começar as obras seria construir um sistema de abastecimento de água que garantisse a qualidade da água para a população que reside no local e para os mais de 100 mil migrantes que são esperados na região. Isso não foi feito e o prazo para realizar a medida foi prorrogado. Assim como foi prorrogado o prazo para elaboração do projeto básico de engenharia relativo à remediação da área do lixão de Altamira.
O processo de licenciamento ambiental, de acordo com a legislação brasileira, é composto de três tipos de licença: prévia, de instalação e de operação. Na ação civil pública, o MPF aponta que 40% das ações antecipatórias – previstas na licença prévia, e condição para a licença de instalação -, impostas pelo próprio Ibama, não foram cumpridas. Mas o Ibama considerou que menos da metade das medidas necessárias para minimizar os impactos sociais e ambientais foram “satisfatórias”, o que garantiu a licença definitiva de Belo Monte.
Os questionamentos da mais polêmica usina hidrelétrica do país não se referem apenas ao plano “ideológico”. Estão em jogo a qualidade de vida e a sobrevivência de milhares de brasileiros que terão suas vidas atingidas diretamente pela construção da hidrelétrica. Mas, pelo que tudo indica, infrigir direitos humanos e faltar com rigor no cumprimento da legislação não é motivo suficiente para impedir o que chamam de “progresso” e barrar a construção de empreendimentos de caráter duvidoso para o país.
Garantir água com qualidade para os 200 mil moradores de Altamira não importa, quando o “bem maior” é garantir energia elétrica para atender exportadoras de minério. É em nome desse “bem maior” que a vida de milhares de brasileiros é atropelada pelo poder econômico. Infelizmente, os questionamentos de Belo Monte não deveriam ser tratados como “pêlo em ovo”, mas como pontos relevantes a serem fielmente cumpridos. Há muito ainda que ser feito para dar a Belo Monte o título de empreendimento sustentável.
Deixe um comentário