Se disputassem um prêmio de simpatia, o presidente Lula venceria sua sucessora, Dilma Rousseff, de lavada. Todo mundo que conviveu mais de um minuto com a nossa presidente eleita sabe que ela não é lá muito de sorrisos gratuitos. Mas é engraçado como as circunstâncias e outras características dos indivíduos podem às vezes mudar as coisas. Apesar de toda a sua fama de fechadona e antipática, Dilma está se saindo muito mais bem humorada e tolerante com as cotoveladas do jogo político partidário do que Lula jamais foi.
O presidente nunca escondeu sua falta de paciência com os rapapés da etiqueta política. O jogo de encenação, de frases de duplo sentido, de insinuações e gestos comuns à política partidária e parlamentar nunca foi a praia de Lula. Tanto que, como ele mesmo sempre disse, Lula achou um porre a sua experiência como deputado. Foi nela que Lula concluiu que há no Congresso pelo menos “300 picaretas”, e foi pensando assim que ele presidiu. A existência do mensalão é um pouco decorrência disso. Algo assim: “Se o que esses caras querem pra votar conosco é dinheiro, vamos dar dinheiro pra esses caras e tocar a nossa vida”. Lula cresceu no meio sindical – de luta política mais direta, sem rapapés. Além disso, é extremamente vaidoso, coisa que só cresceu com seus acertos e o aumento da popularidade. Assim, ficar fazendo acenos e tentando decifrar recados de políticos sempre esteve longe das suas preferências.
Quando se trata de reagir a esse jogo político, Dilma tem se mostrado menos refratária às suas regras do que foi Lula nestes oito anos. A forma como ela e sua equipe de transição incorporaram na semana passada o apelido “Três Porquinhos” é um claro exemplo disso. Lula fica irritado até hoje quando chamam o avião presidencial que comprou de “Aerolula”, uma piada óbvia. Dilma e sua turma deram um nó naqueles que cunharam o apelido. Não há nada mais matador para um implicante do que você rir também do apelido que ele inventa.
Na hora em que Dilma e seu triunvirato – o presidente do PT, José Eduardo Dutra, e os deputados José Eduardo Cardozo e Antônio Palocci – aceitaram com bom humor o apelido de “Três Porquinhos”, acabou a piada. E acabou também o que a piada representava nas entrelinhas: uma crítica do PMDB ao fato de Dilma ter se cercado apenas de petistas para formar o Estado Maior da sua equipe de transição. Sem cara feia, o recado está dado: “Olha, PMDB. É assim que será, e pronto”.
Em vez de ficar irritada com o apelido, Dilma demonstrou entender qual é o jogo que se inicia. Uma situação que ela terá que ter muito jogo de cintura para administrar, caso não queira ver toda a sua costura política desandar. Em vez dos “Três Porquinhos”, Dilma sabe que tem que se preocupar mesmo é com os “79 porquinhos”. Tomemos emprestada a bancada que o partido elegeu para a Câmara no ano que vem para designar o PMDB.
Os “79 porquinhos” jogam pesado. Não têm medo de Lobo Mau. Não constroem casas de palha nem de madeira. Ao embarcar como fizeram na campanha de Dilma, os “79 porquinhos” conseguiram algo que nunca obtiveram em todos estes anos de país redemocratizado: uniram-se, praticamente todos, num só projeto. Uma coisa dessas,no PMDB,não se faz por decreto. Nem Michel Temer, nem José Sarney, nem ninguém, tem poder, num partido que é uma confederação de interesses regionais, para impor nada. Houve, então, um consenso, um entendimento conjunto desses caciques de que a aposta valia a pena. E de que a aposta valia a pena para os interesses particulares de cada um.
Por isso, o PMDB não hesitará um minuto em lutar por cada espaço que conseguir obter no novo governo. No mínimo, exigirá um governo de fato com lógica de coalizão. Mas não ficará apenas nisso. Disputará cargo por cargo. Pasta por pasta.
Na cúpula peemedebista, a conclusão final para a história do blocão que o líder do partido na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), tentou formar para tentar tirar do PT a primazia da escolha do presidente da Câmara foi de que o movimento foi um tiro no pé. Mas o blocão ter surgido demonstra qual será a disposição dos “79 porquinhos”. E se Dilma não tivesse agido rápido para neutralizá-lo teria problemas lá na frente.
Se os “79 porquinhos” desistirem de engrossar na disputa pela presidência da Câmara, vão exigir uma compensação. E assim será, sempre. O legal da história de ter aceito com bom humor o apelido de “Três Porquinhos” é que a turma de Dilma mostra que também não tem medo de Lobo Mau. Mas que está disposta a enfrentar a cara feia com um sorriso nos lábios. Na política, parece ser uma prática recomendável.