Gilson Luiz Euzébio da Silva *
O pai leva o filho, de 11 anos, e outro de três, para passear no zoológico. Mas o alegre passeio com a família acabou em tragédia: o menino, pré-adolescente, provoca um tigre no zoológico, como se fosse o Tarzan, invade o espaço do animal e acaba perdendo um braço na brincadeira. Foi isso que aconteceu no zoológico de Cascavel, no Paraná. Uma desgraça que se abateu igualmente sobre o menino, o pai, a mãe e familiares: o braço esgarçado pelo tigre, o filho deficiente. Nesses momentos, todos se sentem culpados e sofrem a mesma dor.
Se não bastasse todo o sofrimento, o Estado faz sua parte para aumentar a desgraça da família: o pai está sob investigação da polícia, que cogita a possibilidade de incriminá-lo por lesões corporais.
Mesmo que tenha errado, falhado no cuidado com o filho, esse pai já está sofrendo o suficiente. A intervenção do Estado em casos semelhantes é devastadora: o filho carregará a culpa da condenação do pai, da vida do pai transformada num inferno de acusações, policiais, acusadores do Estado, advogados, juízes, até a prisão.
Temos um Estado bem estruturado para a repressão, perito em punir e destruir, mas pouco interessado em construir. E sem nenhuma racionalidade: o que a sociedade ganha condenando um pai pela mordida do tigre?
Nada. E perde muito. Na hipótese de o pai ser condenado, o país perde um trabalhador e ganhará um criminoso, com aprendizado e especialização nas penitenciárias, conhecidas como escolas do crime.
Cito o exemplo do tigre por ser o mais recente, mas os casos são corriqueiros. Lembram-se do incêndio da Boate Kiss, em 2012, quando até os músicos foram presos? Os músicos e os proprietários também saíram feridos e perderam amigos e familiares. Será que eles queriam isso, para serem tratados como criminosos?
Talvez seja mais fácil prender músicos e ocultar o principal responsável pela tragédia, o Estado, que não cumpriu seu dever de fiscalizar os estabelecimentos nem de vigiar o zoológico.
Hoje, o Estado dispõe de um enorme poder destrutivo. Guardas de trânsito, policiais, promotores e procuradores contam com uma superestrutura para, em nome do Estado, reprimir o cidadão. O mesmo cuidado não foi observado quando se trata de defender o cidadão: as defensorias públicas continuam desestruturadas na maior parte do Brasil.
Talvez seja a hora de pensarmos um Estado que caminha ao lado do cidadão, apoiando-o em seus tropeços, mas jamais o empurrando para o despenhadeiro. Talvez seja hora de sairmos dessa sociedade vingativa e intolerante com os erros dos outros.
Os erros dos outros são imperdoáveis.
Tudo que acontece tem que ter um culpado a ser execrado publicamente, numa catarse, numa histeria coletiva, como nas execuções públicas em tempos remotos. Esse desejo de punição é apenas um sinal de atraso.
* Gilson Luiz Euzébio da Silva é jornalista e candidato a deputado federal pelo PT-DF.
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