Cícero Ulkowski Corrêa Filho*
O mercado de vídeo games tem um alcance restrito na sociedade brasileira em virtude de tratar-se de bem supérfluo e de alto valor, acessível apenas a poucos. No entanto, é justamente do mercado de vídeo games que vem uma das maiores lições que o povo brasileiro pôde aprender em 2013 e um grande golpe em uma bem montada falácia dominante no mercado brasileiro de quaisquer bens de consumo: a de que é a carga tributária a principal responsável pelos altos preços praticados no Brasil.
Vamos ao caso: o PlayStation 4, produzido pela Sony, tinha lançamento previsto para 15 de novembro de 2013 no Brasil. Quando foi feito o anúncio do preço a ser praticado no país, no entanto, os consumidores ficaram escandalizados. Seria cobrada a escorchante quantia de R$ 4 mil pelo console. À onda generalizada de protestos por parte dos consumidores do produto, a Sony respondeu da forma como o mundo corporativo brasileiro normalmente se livra de perguntas inconvenientes sobre os preços de seus produtos: culpou a carga tributária nacional.
Seguiu-se a costumeira enxurrada de críticas à carga tributária nacional, até que alguém se deu conta de algo muito singelo. O XBoxOne, da Microsoft, concorrente de mesma geração do PS4, e que nos EUA, país de importação de ambos os consoles, custa mais do que o PS4, chegou ao Brasil custando pouco mais de R$ 2 mil. Ora, o mesmo produto, advindo do mesmo país, sobre o qual incidem os mesmos impostos e alíquotas, e que tem seu preço de origem mais alto, chegava aqui por metade do preço do PS4. Que matemática tributária foi esta da Sony? Os executivos da empresa japonesa insistiram em atribuir a culpa à carga tributária, mas ninguém ficou convencido de que a razão que leva à abusividade do preço, e de sua abissal diferença em relação ao concorrente, seja outra que não a mais escancarada ganância. Citando Luís Fernando Veríssimo, a Sony aplicou o índice normal utilizado pelo empresariado brasileiro para fixar seus preços, o MQD (ou Mais Qui Dé), porém ao que parece errou na dose, e terá que explicar o inexplicável.
Os veículos nacionais seguem a mesma regra. Enquanto as montadoras choram por causa dos 45% do preço de cada veículo, que representa a carga tributária incidente sobre esses produtos, os 55% restantes ainda são mais caros do que seus similares em países do Primeiro Mundo, onde as exigência de segurança são muito maiores. E as filiais brasileiras são as que apresentam maior lucratividade por veículo vendido, na comparação com mercados muito mais endinheirados.
Não estou dizendo com isto que a carga tributária brasileira é baixa, e que não comportaria uma racionalização e redução. Digo apenas que ela, nem de longe, é a única responsável pelos preços exorbitantes que nós, brasileiros, pagamos por produtos e serviços no país. Nossos empresários, estes heróis do capitalismo, têm boa parte desta responsabilidade também.
* Cícero Ulkowski Corrêa Filho é diretor do Sindicato dos Servidores da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul (Sindispge)
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