Cláudio Versiani, de Nova York*
Se os EUA são o país do exagero, Nova York é a capital por excelência. Contrariando Tim Maia, aqui vale tudo, inclusive homem com homem e mulher com mulher. O movimento gay nasceu aqui. A Big Apple, a cidade mais liberal e louca do mundo, é também megalomaníaca: tudo é o melhor, o maior ou o mais qualquer coisa.
A metrópole vive mais um boom imobiliário. O preço médio de um apartamento na ilha de Manhattan ultrapassou a barreira de US$ 1 milhão e não pára de subir. A bolha já tem data para explodir, será daqui a 3 anos, dizem os especialistas. Recentemente, o magnata Rupert Murdoch, dono de uma rede de veículos de imprensa, comprou um triplex na 5ª Avenida. O preço: US$ 42 milhões e uns quebrados das notas verdinhas, o imóvel mais caro da história de NY. O antigo dono era um Rockefeller, família que já foi a mais rica do planeta. Imóvel e petróleo sempre fizeram parte do portfolio das grandes fortunas da América.
Nos anos 80, os japoneses andaram investindo na cidade. Graças ao preço do petróleo que anda batendo na altura dos arranha-céus novaiorquinos, os árabes voltaram a atacar. Uma companhia da família real dos Emirados Árabes comprou um prédio na Park Avenue. O valor da transação foi US$ 705 milhões. Outra companhia de Dubai (cidade dos Emirados Árabes) arrematou um hotel de frente para o Central Park. Foi só US$ 440 milhões.
Na 5ª Avenida, perto do Museu Metropolitan, há outro apartamento triplex à venda, por apenas US$ 45 milhões. Lenny Kravitiz, roqueiro que gosta de investir na ilha de Manhattan, está de olho.
Tudo aqui é exagerado, e como a cidade vive em função da grana, os números impressionam. O consumismo é absurdo e no Natal é pior ainda. A cidade está cheia de turistas dispostos a comprar desde bugingangas até artigos que frequentam a página 3 do New York Times, como por exemplo bolsinhas Channel por US$ 4,5 mil, uma pechincha. A mesma bolsinha em Chinatown não sai por mais de US$ 50, genuína, made in China, Paquistão ou Índia. O New York Times é o único jornal nos EUA e provavelmente no mundo que fatura mais de US$ 1 bilhão por ano só com anúncios.
Os novaiorquinos também não deixam por menos e saem às compras, ávidos por detonar a arma americana mais famosa, o cartão de crédito. Neste Natal, está faltando mercadoria na prateleira e sobrando vontade de gastar.
Em 2002, quando a economia americana ia muito mal por conta dos atentados de 11 de setembro, o presidente Bush foi para a televisão apelar aos compatriotas: confiem no país e, por favor, “keep shopping”, ou seja, continuem comprando.
O trânsito é maluco, buzinar é proibido, mas ninguém respeita, é uma das leis que não pegaram em Nova York. Milhares de turistas fotografando e consumindo, Times Square é a Babel. Em 2005, 40 milhões de pessoas devem passar por Nova York, acrescentando US$ 21 bilhões à economia local. Só vai à Times Square quem precisa ou está de passagem, é a versão terrena do inferno, iluminado pelos neons e telões que poluem o visual do lugar. É over!
A árvore de Natal do Rockefeller Plaza é uma bobagem, mas eles faturam, todo mundo vai lá tirar uma foto com a dita cuja. Neste ano, foi reaberto o mirante do prédio. Nova York vista do alto é mais bonita ainda, fascina. A cidade tem três prédios que um dia já foram os maiores do mundo, sem contar as torres gêmeas, de triste memória.
Os americanos são um povo empreendedor, sem dúvida, mas eles acham que podem tudo e mais um pouco. Geografia e cultura geral não são os fortes deles. Eles se bastam, são o maior país do mundo e ponto final. Os garotos das escolas de segundo grau não sabem onde fica o Vietnã e muito menos o Iraque, para não dizer que não falei da guerra.
Um colega de universidade perguntou à minha filha Laura se ela sabia quem foi John Lennon. Brasil? Onde fica? Futebol não é o forte deles, que, aliás, eles chamam de soccer. Tirando carnaval e mulher pelada, o Brasil é o país que queima a floresta amazônica.
A economia norte-americana é impressionante, os números estão lá na lua, que por sinal também é deles. A bandeira americana ainda está lá, creio.
Mas, voltando à Terra… um ingresso para um simples jogo de basquete do New Jersey Nets, time do outro lado do rio, pode custar até US$ 1.750 na temporada regular. Quem ganha o torneio é chamado de campeão mundial, apesar de ser uma competição nacional. É um campeonato milionário. A NBA, a liga de basquete, vai doar US$ 100 milhões para escolas nos próximos cinco anos. Os jogadores são obrigados, por contrato, a visitarem escolas públicas e incentivarem a leitura. Sem contar as iniciativas individuais de cada jogador, acrescente mais alguns milhões de dólares.
Vá entender porque os novaiorquinos se dispõem a pagar US$ 7 por uma cerveja no balcão do bar, quando seis garrafas da mesma cerveja têm preço igual no supermercado da esquina.
A Bloomindagles é uma loja como nenhuma outra no mundo e a Macy’s é a maior do mundo, é mole ou quer mais? Você já ouviu falar num tal de Howard Stern? É um radialista que depois de 20 anos está abandonando o rádio tradicional e se transferindo para uma estação de rádio via satélite, com assinatura paga pelos ouvintes, no esquema de TV a cabo. Quinhentos milhões de dólares por cinco anos de contrato é quanto ganhou o felizardo, não dá para acreditar!
A Bolsa de Valores de NY, por sinal a maior do mundo, movimenta mais de US$ 45 bilhões por dia. A Nasdaq, a bolsa das empresas eletrônicas e virtuais, movimenta mais US$ 40 bilhões.
Quando só 5% da população mundial consome metade da comida produzida pelo planeta, alguma coisa está errada. Eles comem muito e muita porcaria. Os baldes de pipoca vendidos nos cinemas são absurdamente grandes e podem custar até US$ 10, pouco menos que um ingresso, e todo mundo compra e come. Metade da população é obesa, outro problema grande, sem trocadilho. O ex-presidente Bill Clinton, aquele que fumou mas não tragou e que não sabia que sexo oral era sexo, está em campanha contra as comidas gordurosas dos McDonald’s da vida.
Já que a história deles é recente, poucos mais de duzentos anos como nação, eles cismam que são os melhores e os maiores. Boston tem a ponte mais larga do mundo, a Brooklyn Bridge é a ponte com os cabos de aço mais antigos do mundo. Times Square é a esquina do mundo. Aliás, Nova York é a capital do mundo, resta saber de que mundo. Ou como disse Raul, pare o mundo que eu quero descer.
Os impérios não duram para sempre, a China está logo ali na esquina, em 15 anos a economia chinesa terá o tamanho da americana. Por enquanto, os chineses vão inundando o mercado americano de produtos made in China e roubando milhares de empregos dos norte-americanos. As próprias companhias americanas se beneficiam da mão-de-obra chinesa, que em alguns casos é escrava ou quase. É o chamado tiro no pé. A China, o segundo país mais poluidor do mundo (depois dos EUA), ameaça pular para o primeiro lugar. O mundo industrializado está transferindo suas empresas sujas para lá. E também para não dizer que não falei de Bush, ele é o pior presidente norte-americano de todos os tempos. Se não bastasse o desrespeito pelas liberdades democráticas aqui e acolá, George Walker será lembrado como o homem que iniciou o declínio do império da América do Norte.
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