Márcia Denser*
Tem aquele negócio do relançamento da obra do Jorge Amado pela Companhia das Letras: soube que o investimento total é de um milhão de reais, um investimento e tanto, com Chico & Caetano, os Amado’s boys (que nos lances – me disseram – aparecem rapidinho e se mandam ou então permanecem colateralmente, se fazendo de esquerdos e modestos espectadores) incluídos. Tudo muito lindo e maravilhoso e de frente para o mar, especificamente para a Lagoa do Abaeté ou Itapuã ou Arembepe, aquele mesmo onde é doce morrer chez Caymmi, à sombra dos coqueiros, garçons e macacos incluídos.
Tudo muito exótico, baby. Mas o problema é esse, baby, Jorge é – foi vendido como – um escritor pitoresco, um produto rigorosamente honesto. Na época. Yes, nós tínhamos.
Então assim é uma boa ocasião, balangandãs à parte, para uma releitura, uma revisão da obra do Jorge Amado (naquelas impressões chiquérrimas da Companhia das Letras). Que na época vendia milhões, era um fenômeno literário dos anos 40 a 60.
Como Carmen Miranda, Oscarito, o trio Iraquitã, as chanchadas das Atlândida. Época de carnavais, boleros, dor-de-cotovelo donde Nora Ney. De rock balada e dá-lhe versões linha Fred Jorge & Cyl Farney, o Sinatra versão nacional, & outras macaqueações infinitas. Também tinha Ary Barroso & calouros & Aquarela do Brazil. Do quê nos ufanávamos.
Como do Jorge, cujo pornoerotismo de cama & mesa era apreciadíssimo pelo nosso inconsciente colonial – o mulato inzoneiro, não é mesmo? O professor Antonio Candido diz algumas coisinhas nada lisonjeiras a respeito. Quer dizer, nada lisonjeiras para nós, todos nós. Se nos pretendemos povo, país, nação – civilização, macaqueações à parte.
Pornoerotismo que hoje qualquer aspirante a escritor de quinta (mas com vários jabutis e petrobrases no curriculum) da internet executa com louvor e dá dez a zero no Jorge. Bom. Nos romances dele, as mulheres ou são putas ou cozinheiras ou ambas, porque todas são mucamas ou yayás ou ambas. Legal. Até aí, nada contra. A grande arte está acima dos modismos filosóficos idiotas da vez, politicamente corretos, esteticamente nulos. Se ele escrevesse como Cortazar ou Borges ou Faulkner ou Clarice Lispector.Como Henry Miller ao menos! Nada. Negativo.
De forma que a recepção da reedição da obra do Jorge será um bom sismógrafo, não para a Crítica Literária (que essa já está careca de saber que não deu), talvez para a Sociologia conferir o que persiste no Brasil de Casa Grande & Senzala, ou seja, a quantas anda o nosso inconsciente colonial tão exótico e proxeneta.
Garçons e macacos incluídos.
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