Se zapeando na terça-feira, 08/9, casualmente não tivesse assistido na Fox News uma entrevista animadíssima entre o âncora de plantão e dois autores que lançavam livros absurdamente neonazistas, se na quarta, 09/9, não fosse aprovado pela Câmara o Estatuto da “Igualdade” Racial onde, por exigência do DEM, o texto votado exclui referência específica a quilombolas, deixa de fora a regra que previa oportunidades iguais para negros nas áreas de publicidade, televisão e cinema e suprime as cotas dos mesmos nas universidades; se eu não soubesse que o modo tucano de ser amigo do povo (mote da Carta Maior) implica no fato do Serra vender 25% das vagas em hospitais públicos a planos de saúde privados, criar fila de elite em SUS lotado, terceirizar o esporte e a cultura, descer o cacete em estudantes e funcionários da USP, dar opção preferencial pela segurança em condomínios alto padrão, ter sancionado a partir de 4/8 uma lei anti-fumo já considerada anticonstitucional em 25/8 (o advogado geral da união, ministro José Antonio Dias Toffoli, encaminhou parecer ao Supremo Tribunal Federal apontando “conflito de competências”, descrito como violação da “hierarquia normativa”. Isto é, o Estados e Municípios não podem legislar sobre assunto de alçada federal. Há objeções importantes também quanto à proibição de fumar em condomínios residenciais, e não apenas nas áreas abertas, pois se trata de atentado ao princípio constitucional de inviolabilidade do lar), confiram no blog do Guilherme Scalzilli; se eu não soubesse da insistência por parte das elites interessadas em censurar e restringir matéria eleitoral via internet (porque censura e restrição é tudo e é só o que já publicam os jornalões de propriedade de tais elites); se eu não tivesse compreendido o silêncio assustado dos leitores em relação à coluna do Mirisola, “Vamos tocar fogo!”, talvez eu não tivesse dado atenção ao texto de Sara Robinson do Blog For Our Future (traduzido no site Vi o Mundo, do Luiz Carlos Azenha) que trata da ascensão do fascismo nos EUA.
Porque qualquer semelhança não é coincidência.
O artigo comenta que, através da escuridão dos anos do governo Bush, os progressistas assistiram horrorizados ao sumiço das proteções constitucionais, à retórica nativista, ao uso do discurso de ódio transformado em intimidação e violência e a um presidente dos Estados Unidos que assumiu poderes só exigidos pelos piores ditadores da história: “Com cada novo ultraje, nosso grupo, que tinha se tornado expert em cultura e política da extrema-direita, ouvia de novos leitores preocupados: chegamos lá? já nos tornamos um estado fascista? quando vamos chegar lá? Ao investigar a quilometragem nesse caminho para a perdição, nos baseamos no trabalho do historiador Robert Paxton, provavelmente o estudioso mais importante na questão de como os países adotam o fascismo. Ele afirma que as democracias se tornam fascistas por um processo reconhecível, constituído por cinco estágios. De qualquer forma, o futuro fascista dos Estados Unidos aparece bem grande diante do vidro do automóvel.”
Afinal, o que é fascismo? Eis a definição de Paxton: é um sistema de autoridade política e ordem social marcados pela preocupação obsessiva com o declínio da comunidade, com a humilhação e a vitimação, pelo culto compensatório da unidade, energia e pureza, na qual um partido de massas de militantes nacionalistas, trabalhando em colaboração com as elites tradicionais, abandona as liberdades democráticas e busca, através de violência e sem controles éticos ou legais, cumprir objetivos de limpeza interna e expansão externa.
No primeiro estágio, um movimento rural (nos anos 50/60 tivemos a TFP- Tradição, Família e Propriedade, lembram? Fizeram parte da turma que deu o golpe em 64), emerge em busca de algum tipo de renovação nacionalista, usando temas como unidade, ordem e pureza. A razão é rejeitada em favor da emoção. O autor sugere que a Ku Klux Klan, formada em reação à Restauração pós-Guerra Civil, pode ser o primeiro movimento autenticamente fascista dos tempos modernos. Quase todo país europeu teve um movimento proto-fascista nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial (quando o Klan ressurgiu nos Estados Unidos) mas a maior parte deles empacou no primeiro estágio.
O conservadorismo moderno dos EUA foi construído sobre essas divisas. Do “Despertar nos Estados Unidos”, tema de campanha de Ronald Reagan, aos grupos religiosos prontos para a Ruptura, ao nacionalismo branco promovido pelo Partido Republicano através de grupos racistas de vários graus, é fácil identificar como o proto-fascismo americano reagiu aos turbulentos anos 60 ao promover a restauração dos Estados Unidos tradicionais, brancos, cristãos e patriarcais. Essa visão foi abraçada tão completamente que todo o Partido Republicano agora se define nessa linha. Nesse estágio, ele é abertamente racista, sexista, repressor, excludente e permanentemente viciado na política do medo e do ódio. Pior: não se envergonha disso. Não se desculpa perante ninguém. Essas linhas se teceram em todo movimento fascista da História. (os grifos são meus)
No segundo estágio, os movimentos fascistas ganham raízes, se tornam partidos políticos reais e ganham um lugar na mesa do poder. Atualmente, os grupos anti-imigração, apoiados pelo Partido Republicano, tornam a vida dos trabalhadores rurais hispânicos nos Estados Unidos um inferno. Enquanto a violência contra hispânicos aumenta (cidadãos americanos ou não), os esquadrões da direita obtêm treinamento básico a ser usado como intimidação. Hitler e Mussolini assumiram o poder sob essas mesmas circunstâncias: paralisia do governo constitucional (produzida em parte pela polarização promovida pelos fascistas); avanço da esquerda; líderes conservadores que se sentiram ameaçados pela perda de capacidade para manter a população sob controle, se negaram a trabalhar com a esquerda, sentindo-se incapazes de continuar no governo contra a esquerda sem um reforço de seus poderes. E, mais perigosamente: a aceitação, pela elite conservadora, de trabalhar com os fascistas.
Essa descrição parece muito com a situação difícil em que os congressistas republicanos estão nesse momento. Apesar de o partido ter sido humilhado, rejeitado e reduzido a um status terminal por uma série de catástrofes nacionais – a maior parte produzida por ele mesmo – sua liderança considera inimaginável cooperar com os democratas em ascensão. Sem rotas legítimas para voltar ao poder, sua última esperança é investir no que restou de sua “base dura”, dando a ela uma legitimidade que não tem, recrutá-la como tropa de choque e derrubar a democracia americana pela força. Sem eles não podem vencer eleições, uma vez que ambos estão dispostos a levar a disputa política para as ruas e assumir o poder intimidando os americanos a se manterem silenciosos e cúmplices. Quanto esta aliança “não santa” é feita, o terceiro estágio — a transição para um governo abertamente fascista — começa.
Durante os anos do governo Bush, os analistas progressistas da direita se negaram a chamar o que viam de “fascismo” porque, apesar de estarem de olho, nunca viram sinais claros e deliberados de uma parceria institucional comprometida entre as elites conservadoras dos Estados Unidos e a horda nacional de camisas-marrom. Viram sinais de flertes breves – algumas alianças políticas, apoio financeiro, palavras-de-ordem da direita na boca de líderes conservadores tradicionais. Mas era tudo circunstancial e transitório. Os dois lados mantiveram uma distânc
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