Pretendo questionar a realização da famosa sessão da CCJ, na última quinta-feira, com a presença de apenas dois deputados e que aprovou 118 matérias diversas, sem discussão. O motivo do meu questionamento é o parágrafo primeiro do artigo 46 do regimento interno da Câmara dos Deputados:
Art. 46. As Comissões reunir-se-ão na sede da Câmara, em dias e horas prefixados, ordinariamente de terça a quinta-feira, a partir das nove horas, ressalvadas as convocações de Comissão Parlamentar de Inquérito que se realizarem fora de Brasília.
§ 1º Em nenhum caso, ainda que se trate de reunião extraordinária, o seu horário poderá coincidir com o da Ordem do Dia da sessão ordinária ou extraordinária da Câmara ou do Congresso Nacional.
Na manhã em que se deu a sessão da CCJ em questão havia uma sessão extraordinária no plenário onde estávamos discutindo e votando matérias relevantes como o tratado de extradição Brasil-Israel, o regime especial fronteiriço entre Brasil e Guiana, o acordo Brasil-Espanha sobre informações sigilosas, o acordo de cooperação cultural entre o Brasil e a OLP, um acordo educacional com a Guiné Equatorial e outras matérias, ao todo quinze.
Como membro efetivo da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, priorizei minha presença no plenário e intervim duas vezes na tribuna e duas nos microfones de apartes. Na tribuna, discuti o tratado de extradição Brasil-Israel à luz de um projeto de lei que apresentei para modificar o artigo 84 da Lei de Estrangeiros, de 1981. Embora os tratados de extradição firmados pelo governo brasileiro contenham salvaguardas em relação a perseguição política, esse artigo, ao prever obrigatoriamente prisão fechada ao extraditando em qualquer circunstância até o STF julgar o pedido – em geral mais de um ano -, justifica a preocupação de que governos onde o Judiciário não é independente, como a China, ou envolvidos em agudos conflitos, como Israel, possam apresentar pedidos de extradição alegando crimes comuns para punir dissidentes ou opositores. É um tipo de represália que pode ocorrer, pois na prática o simples pedido de extradição já pune o acusado com um ano e meio de prisão no Brasil. Não encaminhei contra a ratificação da tratado, já firmado pelo governo brasileiro, mas para fazer essa ressalva e chamando a atenção para a urgência da aprovação do meu projeto, que dá ao STF a liberdade para decidir entre a prisão fechada ou a liberdade vigiada do extraditando.
Discuti ainda o tratado educacional com a Guiné Equatorial e o progresso que julgo ter havido na política externa do governo Dilma em relação ao de Lula. Ao terminar a ordem do dia, voltei à tribuna para falar sobre a Comissão da Verdade. Eu havia sido privado de poder fazê-lo, na véspera, quando fora votada, porque o deputado Protógenes, do PCdoB, solicitou o encerramento da discussão – aproveitando para falar duas vezes-, assim privando a mim e ao Chico Alencar, que estávamos inscritos, da possiblidade de discutir a relevante matéria antes de sua votação.
Voltando às 118 aprovadas na CCJ, vejo a imprensa estigmatizar os deputados que assinaram a presença mas não estavam na comissão quando deu-se a votação em 3 minutos. Penso que não é por ai a crítica. Poderia ter acontecido a qualquer um. Como há muita justaposição de sessões, os deputados passam seu tempo correndo entre comissões e entre elas e o plenário. É, aliás, a razão do disposto no artigo 46 do regimento interno. Eu, por exemplo, estou nas comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional, da Reforma Política, presido a subcomissão da Rio + 20 e sou o vice da bicameral do Clima além de suplente na CCJ. Além disso, posso participar da sessão de outras comissões quando um projeto meu está sendo avaliado por elas. Se fosse titular da CCJ, teria que ter assinado o livro naquele dia, mas teria também que estar no plenário, porque estávamos votando matérias importantes que vinham da comissão onde sou o membro titular, a de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Assim, poderia também ter facilmente entrado naquela lista pela qual o O Globo submete à execração pública parlamentares supostamente preguiçosos ou negligentes.
Não é por aí. O erro na CCJ deve ser claramente identificado: 1 – quem presidia aquela sessão não poderia ter deixado que corresse em paralelo com o plenário; 2 – deveria ter tido a sensibilidade para perceber que, embora eventualmente regimental, não é politicamente nem institucionalmente adequado votar sem discutir 118 matérias com apenas um outro deputado presente; 3 – poderia ter mandando convocar os parlamentares pelo celular; 4 – qualquer um dos dois presentes poderia ter solicitado uma verificação de quórum de óbvia constatação e fazer cair a sessão.
Resumo da ópera: houve um erro regimental e político que a imprensa até agora não identificou com precisão, uma estigmação aleatória dos deputados que tiveram o azar de assinar o livro e não estar ali nos 3 minutos em que a coisa se deu. Por outro lado, não houve nenhuma cobertura, nenhum noticiário para uma discussão e votação relevante que tivemos, na mesma hora, no plenário, sobre tratados de extradição e outras acordos internacionais relevantes. Claro, na cultura jornalística vigente, nada disso é notícia…
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