Rudolfo Lago*
Os assessores do presidente Lula fizeram chegar aos jornais e revistas a seguinte notícia na última segunda-feira: ele resolveu que não concederá entrevistas à imprensa escrita como candidato à reeleição.
No mesmo dia, à noite, a TV Bandeirantes exibiu a eloqüente imagem da cadeira vazia de Lula no primeiro debate da campanha presidencial. Todos os demais candidatos usaram boa parte do seu tempo no programa da Band criticando Lula por sua ausência.
A decisão de não comparecer aos debates já havia sido tomada há algumas semanas pelo conselho político da campanha do presidente. A de não dar entrevistas a jornais e revistas segue a mesma linha de raciocínio. Reforçada pelo desastroso resultado da concessão que o presidente fez a essa lógica, ao ser inquirido pelos apresentadores do Jornal Nacional, da TV Globo.
Depois de fugir durante mais de um ano, o presidente foi pela primeira vez confrontado com as denúncias que atingiram seu governo. Foram apenas dez minutos, mas foi um massacre. O presidente cometeu enganos ou atos falhos que os demais certamente explorarão na campanha ("faço um combate diário contra a ética", "a única coisa que cai no meu governo é o salário"). Disse que demitiu José Dirceu e Antonio Palocci do seu governo quando todo mundo sabe que por várias vezes ele elogiou os dois publicamente e que ambos foram exonerados, como de praxe, "a pedido". Ao dizer que o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, que ele nomeou, está certo na denúncia que apresentou, indiretamente reconheceu a existência do mensalão, coisa que o governo, o PT e seus envolvidos sempre negaram, trocando tudo por um caso menor de financiamento irregular de campanha.
É bastante possível que nenhum outro jornalista ou veículo fizesse entrevista tão contundente. Os apresentadores da Globo estavam com carta branca para bater, porque ali estava em jogo a credibilidade da emissora. Fizeram uma entrevista ao vivo, na qual o presidente ou seus assessores não podiam reagir e desligar o gravador (sim, as autoridades fazem isso muitas vezes). Agora, feita a entrevista da Globo, o padrão estava posto. Nenhum outro jornalista admitiria ser mais condescendente. Se o presidente enrolou-se assim em dez minutos, avalie-se o que não aconteceria em uma hora de conversa.
A performance determinou: Lula será o candidato invisível desta eleição. Com a vantagem que conquistou nas pesquisas, o melhor para ele é falar o menos possível, envolver-se na menor quantidade possível de polêmicas. Dizer o menos possível o que pensa sobre as coisas. Aparecerá apenas nos programas de TV e nos comícios, ocasiões em que prevalecerá não o verdadeiro Lula, com as suas fraquezas, dúvidas e convicções. Mas o Lula devidamente embalado para presente do marqueteiro João Santana. Que, ninguém se engane, é o mesmo Lula fake criado por Duda Mendonça na campanha passada, com pouquíssimas diferenças cosméticas.
Para as próximas eleições, os deputados e senadores deveriam estabelecer na legislação eleitoral a obrigatoriedade da presença de todos os candidatos em pelo menos um debate eleitoral e uma entrevista. Esses eventos poderiam ser organizados em pool pelas emissoras de TV e rádio, com a participação de outros órgãos de comunicação. Sabatinas em que os candidatos fossem obrigados a falar de improviso e não repetir as frases feitas boladas por seus marqueteiros.
Não vale a desculpa dos assessores de Lula de que ele seria o alvo de todos num debate. O natural é isso mesmo. A reeleição é uma espécie de plebiscito, no qual se pergunta ao eleitor se ele deseja que o presidente permaneça ou não por mais quatro anos. O que está em discussão é mesmo o governo de Lula, seus erros e acertos. Se Lula não está preparado ou disposto a enfrentar esse debate, então que não tivesse disputado a reeleição. Porque, o certo é que o verdadeiro presidente está sendo devidamente preservado por seus assessores e marqueteiros.
* Jornalista há 20 anos, Rudolfo Lago, Prêmio Esso de Reportagem em 2000, foi repórter político de algumas das principais redações de Brasília. Hoje, é editor especial da revista IstoÉ e produz o site http://www.rudolfolago.com.br/.
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