Rui Costa Pimenta *
Neste 1º de maio, serão realizados quatro atos pela passagem do dia internacional do trabalhador. São Paulo tornou-se, por circunstâncias muito conhecidas das lutas operárias das últimas três décadas, a capital do 1º de maio e da luta operária no país.
Os dois maiores atos, realizados pela Central Única dos Trabalhadores e pela Força Sindical, são atos de apoio à política do governo, de aberta colaboração com os capitalistas, em troca de algumas migalhas para os trabalhadores. Não são manifestações políticas e de luta, mas seguem o padrão dos atos governamentais estabelecidos pela ditadura semifascista de Getúlio Vargas no Estado Novo e consolidadas pela ditadura militar a partir de 64. Os trabalhadores são chamados para uma festa burguesa, com músicos, distribuição de bebidas alcoólicas e prêmios. Tais atos são financiados pelos inimigos da classe operária, os grandes industriais e banqueiros, e visam entorpecer a consciência da classe trabalhadora, ocultar os problemas políticos e sindicais. São, na realidade, feitos justamente para impedir que a data seja um momento de avanço na luta operária. Nenhum trabalhador honesto e de luta deve, em qualquer hipótese, participar de tais atos porque não apenas tem um conteúdo político equivocado, mas são um escárnio feito por burocratas corruptos sobre os túmulos dos mais valentes militantes e mártires da luta operária.
Um outro ato é promovido pela Igreja Católica, iniciando-se com uma missa na Catedral da Sé, pela Pastoral Operária Metropolitana de São Paulo e outras pastorais sociais da igreja, pelas comunidades eclesiais de base e outras organizações católicas, que em geral trazem a maior audiência para o ato. No último período, formou-se uma frente única entre organizações que se apresentam aos trabalhadores como revolucionárias: PSTU e grupos menores sem partido ou acomodados dentro do Partido Socialismo e Liberdade (Psol).
Esse último partido, que também está convocando oficialmente o ato, é uma mistura heterogênea de políticos burgueses tradicionais, como Plínio de Arruda Sampaio, também ligado à Igreja Católica, parlamentares pequeno-burgueses de carreira, que também são, por definição políticos burgueses, como os deputados federais Chico Alencar, do Rio de Janeiro, mais um elemento da Igreja Católica, Ivan Valente, de S. Paulo, saído do PT e Luciana Genro, filha do atual ministro da Justiça de Lula, Tarso Genro, do Rio Grande do Sul. Esse partido apresentou-se nas eleições com o programa econômico da Fiesp, pedindo a diminuição dos juros como panacéia para salvar a economia nacional, opondo-se às ocupações de terra e defendendo o programa da hierarquia católica para as mulheres, em uma condenação explícita ao aborto, que antecipava a pregação que o papa Joseph Ratzinger vem fazer no Brasil em breve, na contramão da tendência internacional da burguesia de países católicos, como Portugal, que aprovou o aborto. A candidata a presidente da frente eleitoral “de esquerda”, Heloísa Helena, foi uma das líderes do PT no Congresso nos tempos em que aquele partido foi avalista das mais duras medidas contra a classe operária, das privatizações à cassação do direito de greve e é uma notória aliada de políticos e partidos burgueses, inclusive da direita, com ajuda dos quais projetou-se na política nacional.
A frente oscila de apresentar um programa já não diríamos burguês, mas mais propriamente empresarial, nas eleições a fazer demagogia contra as reformas de Lula em encontros sindicais. Caracteriza-se no movimento sindical pela completa oposição entre suas palavras e seus atos. Seus membros sindicais, Conlutas, Intersindical e as organizações católicas, promoveram um encontro contra as reformas de Lula, tendo como um dos seus eixos a reforma trabalhista e sindical. No mesmo momento, o principal sindicato operário da frente, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, aprovava acordos favoráveis à demissão de trabalhadores, bancos de horas, abonos em lugar de aumento salariais e, o que é pior, aumentando a jornada de trabalho como ocorreu recentemente na LG. No mundo artificial de encontros de burocratas, falam contra as reformas, mas são seus executores ali onde têm realmente importância, ou seja, nas categorias sindicais e no chão da fábrica.
Para salientar o caráter contraditório dessa política, vai participar do ato promovido pela frente, que supostamente seria contra o governo Lula, a Corrente Sindical Classista, dirigida pelo curiosamente chamado Partido Comunista do Brasil, o PCdoB, partido da tropa de choque da base de sustentação do governo Lula.
O PCdoB sempre compôs a ala direita da CUT, sendo até 88 o mais feroz inimigo das oposições sindicais, das greves, da política classista e da idéia de construir uma central operária no Brasil. É um notório aliado dos partidos de direita em todas as partes do país, tendo composto o secretariado da ex-governadora Roseana Sarney na sua última administração no Maranhão. O PCdoB está, ainda, no Congresso Nacional montando um bloco parlamentar apelidado comicamente de “bloco de esquerda” , que comporta o PSB e o PDT, dois partidos fisiológicos criados por políticos carreiristas tradicionais.
Essa frente que deixaria o famoso monstro do doutor Frankenstein parecendo uma imagem da harmonia entre as partes, pretende ser uma oposição classista à burocracia lulista e ao governo Lula.
Diante deste quadro, pela segunda vez, o Partido da Causa Operária decidiu convocar um ato de 1º de maio classista. Seria um crime político apoiar tais contrafações grotescas. O princípio de toda luta operária revolucionária é que ela se desenvolve sobre a base de princípios claros de independência do regime político burguês e da defesa dos reais interesses da classe.
Participar de atos que ou mancham a memória e tradição das lutas sacrificadas da classe operária e dos seus verdadeiros dirigentes operários, financiados pelos mais implacáveis inimigos dos trabalhadores ou que, sob uma mera retórica semi-revolucionária, ocultam uma vergonhosa política de colaboração com a burguesia, com a Igreja Católica ou com o próprio governo e a sua “oposição” de direita, é trair e enganar os trabalhadores, erguendo um enorme obstáculo a qualquer verdadeiro desenvolvimento classista.
O ato promovido pelo Partido da Causa Operária, a Corrente Nacional Sindical Causa Operária e seus sindicatos e oposições afiliadas, não é um show, nem de música, nem de retórica vazia, mas personifica a defesa de um programa para a próxima etapa.
Esse programa pode ser resumido em cinco questões-chave: a defesa dos interesses imediatos da classe operária por meio de um conjunto de reivindicações transitórias; a luta pelas reivindicações das camadas oprimidas da população e as reivindicações democráticas que tenham sentido revolucionário; a luta pela independência da classe operária diante da burguesia; a luta por um governo operário; pela revolução proletária mundial e pelo socialismo.
As reivindicações imediatas e transitórias devem ser defendidas na luta nas categorias, no ativismo sindical e, sobretudo, nos locais de trabalho. Não em shows políticos em Brasília ou outros lugares, para proveito eleitoral. Combater a reforma trabalhista em marcha, envergonhadamente, é combater todos os mecanismos que unem a burocracia sindical ao governo e aos patrões para roubar os trabalhadores através da política de demissões “voluntárias”; o trabalho precário dos acordos temporários; o salário mínimo de fome e a destruição do mínimo nacional pelos mínimos regionais; o congelamento salarial disfarçado com abonos e a farsa absurda da “participação nos lucros”; o aumento sem fim da jornada de trabalho, com os “bancos de horas” e acordos fraudulentos como o da LG. Lutar pelas reivindicações imediatas e transitórias é levantar, sem ter medo da opinião pública burguesa, a bandeira do salário mínimo vital de R$ 1.900,00; a redução da semana de trabalho para 35 horas, com um máximo diário de sete horas, sem redução dos salários; pelo estrito cumprimento de todos os direitos operários garantidos na CLT como mínimo inegociável; pela recuperação de todas as perdas salariais dos governos FHC e Lula, entre outras reivindicações.
Como reivindicação especial é preciso levantar a bandeira de direito de greve, atacado por FHC e Lula, com a colaboração cínica da burocracia sindical de todas as cores.
Lutar pelas reivindicações dos oprimidos pelo regime burguês é defender de maneira intransigente o ensino público e gratuito para todos e o acesso irrestrito de todos à universidade através do livre ingresso e do fim do vestibular. É lutar pelas verbas necessárias para a saúde e educação e pelo monopólio estatal integral desses setores; pelo transporte gratuito para a população trabalhadora e a juventude; por um plano de moradia popular para todos os necessitados; pela criação de empregos nas áreas devastadas pela fome e auxílio estatal efetivo à população sofredora com a destruição econômica realizada pelos governos capachos do imperialismo; pela nacionalização dos bancos, dos grandes monopólios capitalistas nacionais e estrangeiros e o não pagamento da dívida estatal – nenhum dinheiro para nenhum capitalista e utilização do dinheiro do Estado para atender as necessidades operárias e populares; pelo assentamento imediato de todos os sem-terra, em um plano controlado pelas organizações independentes e de luta dos sem-terra; pelo direito à autodefesa dos sem-terra, fim da perseguição estatal e paramilitar e pelo fim do latifúndio como base para a reforma agrária.
Uma reivindicação que merece o maior destaque possível neste momento é a reivindicação pelo imediato estabelecimento do direito de aborto, sem qualquer restrição, realizado pela rede pública de modo gratuito. Esta é no momento uma das reivindicações centrais da luta de milhões de mulheres brasileiras esmagadas pela política cínica do moralismo reacionário.
O 1º de maio é o dia internacional de luta da classe operária pelo socialismo e, como tal, nosso programa inclui a solidariedade com os povos oprimidos que lutam contra o monstro imperialista, a começar pelos nossos irmãos haitianos, que sofrem, infelizmente, a ocupação militar imperialista sob a bandeira auriverde do Brasil, país também oprimido pelo imperialismo, pela traição hedionda do governo Lula e do PT-PCdoB; defesa incondicional da luta do povo iraquiano e retirada das tropas invasoras; solidariedade incondicional com a luta dos palestinos e de todo o povo árabe, incluindo o direito da nação iraniana de desenvolver a utilização da energia nuclear. Acima de tudo, no entanto, é preciso dizer com clareza que somente através da revolução proletária contra o imperialismo e as burguesias locais que nunca tiveram e não têm coragem nem independência para libertar seus povos do imperialismo é que há uma saída para a atual situação de martírio da maioria da humanidade, da América Latina à África e aos povos do Oriente próximo e distante.
Há na história do mundo apenas um governo capaz de libertar as massas das garras de aço do imperialismo mundial e da burguesia de todos os tamanhos e esse governo é o governo das organizações operárias apoiadas pelos trabalhadores rurais e mais nenhum. Essa experiência foi mais uma vez confirmada pela triste experiência do governo do PT, aliado aos capitalistas, respeitando escrupulosamente os privilégios dos poderosos, inclusive acobertando seus crimes contra o povo.
No 1º de maio, que lembra a memória dos mártires de Chicago e todos os puros e heróicos que lutaram na face da terra pelo socialismo, pela igualdade entre os homens, pelo fim da exploração e da opressão de um ser humano pelo outro, é necessário levantar acima de todas as outras bandeiras, a bandeira do socialismo universal, da fraternidade socialista de todos os povos do mundo, a única verdadeira terra prometida do povo trabalhador e sofredor!
A revolução socialista triunfará, o socialismo triunfará no mundo todo!
* Rui Costa Pimenta, 49 anos, é jornalista e presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO).
Deixe um comentário