Fábio Góis
Ano de eleição é ano de adiamento dos embates no Poder Legislativo. Boa parte das discussões e dos projetos que constavam da agenda parlamentar deste ano, especialmente os mais polêmicos, ficaram para ser concluídos em 2011. Vão se somar à nova agenda que será proposta pelo próximo governo. Assim, não serão poucos os desafios e pendências da legislatura a ser iniciada em 1º de fevereiro. A legislação relativa à exploração da reforma do pré-sal. O novo Código Florestal. O fim da votação da PEC que determina o piso salarial dos policiais militares e bombeiros. A reforma política. Esses são alguns dos temas espinhosos herdados da atual legislatura que estarão na agenda dos próximos deputados e senadores.
Ainda neste ano, antes da posse dos novos parlamentares, após o segundo turno, os deputados e senadores voltarão a enfrentar um dos mais fortes lobbies que o Congresso viu nos últimos anos: o dos profissionais de segurança pública em torno da PEC 300, que fixa o piso para os agentes da segurança pública e da defesa civil. À PEC 300 vai se somar a discussão da PEC 308, que cria a polícia penitenciária, entre outras disposições. Polêmica, a PEC 300 tramita na Câmara desde o início do ano. Sua maior dificuldade é que os policiais e bombeiros pressionaram para estabelecer valores para o piso: R$ 3,5 mil para praças e agentes e R$ 7 mil para delegados e oficiais de polícia. Uma situação que oneraria imensamente os orçamentos da maior parte dos estados. Sem conseguir negociar uma saída, os deputados adiaram a discussão o quanto puderam neste ano. O texto-base da PEC 300 foi aprovado em primeiro turno em julho, mas, desde então, nada aconteceu. No último esforço concentrado, durante o período eleitoral, o pesado lobby dos policiais perdeu a paciência com os adiamentos.
Leia aqui tudo sobre a confusão no Salão Verde da Câmara em torno do adiamento da votação da PEC 300
Leia tudo sobre a tramitação da PEC 300
Já no Senado, o esforço concentrado só levou à aprovação de quatro medidas provisórias e um projeto de resolução, embora quase a totalidade dos 81 senadores tenham comparecido à Casa para analisar a pauta de votações. Pauta que, aliás, precisa de avanço: 108 proposições estão à espera de deliberação (excluindo-se as que tramitam nas diversas comissões temáticas).
Pré-sal
Outro tema que tem chance de ser retomado ainda neste ano é o conjunto de propostas do governo para a exploração de petróleo na camada submarina do pré-sal. Como a perspectiva é de um volume imensamente superior de petróleo no pré-sal, o governo quer estabelecer um novo regime de exploração, baseado no fato de que os riscos de insucesso do explorador seriam muitos menores. Com isso, propõe-se uma alteração no sistema de partilha da produção, adotando-se um modelo semelhante ao que é usado em países como Arábia Saudita, Irã e Venezuela.
Pelo sistema, a Petrobras será a operadora de todas as jazidas exploradas. Mesmo onde houver contratos com outras empresas, a Petrobras terá uma fatia mínima de 30% em cada bloco. Foi para permitir à Petrobras esse aumento da capacidade de operação que o governo realizou, há duas semanas, um procedimento de reforço do capital da empresa junto ao mercado. Uma nova estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia será criada para realizar e autorizar as licitações para a exploração do petróleo. Os recursos obtidos com a extração do minério na camada pré-sal comporão um fundo social, que financiará investimentos em áreas como educação, inovação científica e tecnológica e combate à pobreza.
O ponto mais complicado é a distribuição dos royalties pela exploração. Hoje, os estados que concentram a maior parte dos poços de petróleo, como Rio de Janeiro e Espírito Santo, recebem um volume maior de recursos. A discussão no Congresso alterou essa lógica. Na Câmara, emenda do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) estabeleceu uma distribuição nacional desses recursos. No Senado, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) tornou ainda mais nacionalizada essa distribuição equitativa dos recursos. O governador Sérgio Cabral, do PMDB, chegou a promover, no início do ano, uma passeata de protesto no Rio contra a mudança. Com as modificações feitas por Simon, o assunto terá de ser novamente apreciado pela Câmara.
Menu legislativo
Segundo o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), ainda há muito a ser feito nos três últimos meses deste ano, além da obrigação de aprovar o orçamento do ano que vem. “Vamos ter de escolher alguns temas para aprovar ainda neste ano. Não temos nenhum tema concluído sobre consolidação de leis, por exemplo. Vamos ter de resolver a Emenda 29, tem o segundo turno da PEC 300”, emendou o deputado petista.
Em relação à PEC 300, o impasse tem a ver com a fonte de custeio dos repasses implicados na fixação do piso salarial para as classes trabalhistas. “Tem que ver quem vai pagar a conta”, resignou-se o deputado, destacando a necessidade de discussão entre o Executivo federal e os governadores – a quem caberia, a princípio, o ônus da aprovação da proposta.
Já a Emenda Constitucional nº 29 estabelece que a União deve aplicar em ações e serviços públicos de saúde, anualmente, valor igual ou superior a 10% de suas receitas correntes brutas. Os estados ficam responsáveis por aplicar 12% da arrecadação de impostos, enquanto os municípios devem concentrar montante igual ou superior a 15% da arrecadação tributária. A eventual aprovação da matéria causará gasto adicional de cerca de R$ 24 bilhões para o setor da saúde, em quatro anos.
Para o cientista político Paulo Kramer, o problema da não aprovação da emenda vai além da falta de empenho governista – cuja maioria no Congresso serviria para impedir o êxito de matérias não convenientes para o Executivo – ou da obstrução oposicionista. “O que dificulta essas medidas não é o fato de o Congresso estar dominado por coalizões partidárias. Isso se deve ao fato de a situação fiscal não ser muito folgada. O Estado arrecada muito, mas gasta muito com despesas de custeio com a própria máquina, em detrimento dos investimentos em áreas como educação, saúde, segurança pública”, declarou o acadêmico.
Além das pautas pendentes, a legislatura a ser iniciada em 2011 reserva alguns desafios que merecem destaque. Os parlamentares terão que aprovar a legislação relativa à realização da Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016. Há situações exigidas pelos organizadores que implicam isenção fiscal e outras situações que só podem ser alteradas por lei. Além disso, a agenda proposta pelo próximo presidente deve incluir reformas nas ordens política, tributária, previdenciária, trabalhista e eleitoral.
Leia nas matérias seguintes, de forma detalhada, as principais discussões que sacudirão o Congresso no ano que vem:
Lula pretende pressionar por reforma política
Novo Código de Processo Penal na agenda
Comissão no Senado discute sistema eleitoral
Deixe um comentário