Edson Sardinha |
Para o cientista político José Alves Donizeth, o número reduzido de leis de iniciativa dos parlamentares que entrou em vigor este ano revela a hipertrofia do Executivo sobre o Legislativo e a necessidade de uma reforma da estrutura jurídico-política do país. Segundo ele, a Constituição brasileira é confusa, ao misturar prerrogativas do parlamentarismo num sistema presidencialista. Na avaliação do professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), uma das razões do desequilíbrio de forças está no poder desmedido dado ao presidente, que pode editar medidas provisórias conforme sua conveniência. “Desconheço qualquer país em que vigore o presidencialismo que o chefe de governo tenha esse poder. Medida provisória é para país parlamentarista”, ressalta. A supremacia do Executivo na formulação de leis, segundo Donizeth, é característica de regimes autoritários. “A inoperância do Legislativo e do próprio Judiciário está sendo sobrepujada pelo Executivo”, observa. Segundo ele, esse desequilíbrio também abre margens para questionamentos sobre o custo operacional do Legislativo. “Para o observador comum dá a impressão que os parlamentares têm muito privilégio para produzirem muito pouco. Em muitos casos, o Legislativo acaba não se posicionando sobre questões importantes para o país e transfere para o Executivo toda a responsabilidade”, considera. De acordo com o cientista político, para identificar as causas dessa desproporção de forças seria preciso analisar o conteúdo de todas as leis originárias do governo e do Congresso desde a adoção da Constituição de 1988. “Se as decisões dos parlamentares nesse período tiveram pouco peso econômico, devemos ficar ainda mais preocupados”, adverte. Pior do que decreto-lei Para o constitucionalista André Ramos Tavares, as medidas provisórias têm um caráter mais autoritário do que o decreto-lei, largamente utilizado durante a ditadura militar. “O decreto-lei se tornava nulo por decurso de prazo se o Congresso não o votasse rapidamente, ao contrário da MP, que pode ser renovada”, diz o professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Desde o início do ano, o governo federal editou 62 medidas provisórias. Pela Constituição, elas podem ser utilizadas pelo presidente da República para apressar o processo legislativo desde que tenham urgência e relevância. “Mas isso é subjetivo e o conteúdo da maioria delas, independentemente de governo, é equivocado”, afirma Tavares. Segundo ele, a responsabilidade pelo desequilíbrio na função de legislar deve ser compartilhada pelo Legislativo e o Executivo. “O Congresso não tem se comportado como uma instituição da República. Os parlamentares acabam agindo mais por interesses políticos e partidários. E o governo comete abusos”, diz. |
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