Cláudio Versiani, de Nova York*
Os norte-americanos não são bobos. Eles gostam de talentos, não importa em que área, muito menos a nacionalidade do sujeito. Basta ver a lista dos ganhadores do prêmio Nobel que o país acumula. Vários deles são estrangeiros que por aqui se estabeleceram e encontraram boas condições de trabalho.
A cultura não poderia ficar de fora. Uma vez por ano, os americanos organizam um festival de dança para descobrir talentos daqui e de qualquer lugar do mundo. O concurso Youth America Grand Prix é voltado para o balé clássico, mas tem espaço para outras tendências. Além dos novos talentos da terra, eles convidam dançarinos e grupos de dança de várias partes do mundo. Em 2006 vieram alguns grupos do Brasil, entre eles, a Cia. de Frevo do Recife.
A Escola de Frevo é um projeto da Secretaria Municipal de Cultura do Recife. A idéia é valorizar a cultura da cidade e do estado. A escola é freqüentada por cerca de 300 meninos e meninas. O pré-requisito é estar cursando uma escola do ensino tradicional.
Os meninos do Recife abafaram em Nova York. Durante a apresentação de avaliação, até os membros da comedida comissão julgadora não se contiveram e aplaudiram no fim da dança, algo inusitado. O grupo conquistou o segundo lugar (empatado com a Academia Cristina Cará, de São José dos Campos), e atrás de outro grupo brasileiro, o Balé da Cidade de Santos, que arrebatou o primeiro lugar. Como se vê, o Brasil brilhou. Mas, na apresentação de gala no encerramento do festival, só a Escola de Frevo foi convidada para se apresentar no mesmo palco das estrelas do festival.
Quem vive no exterior sabe que o Brasil é um sucesso, mas também é obrigado a conviver com as notícias ruins, corrupção, violência etc., sem falar nos Larry Rothers da vida. A carnificina iniciada no último fim de semana no estado de São Paulo produziu mais mortos do que em Bagdá e gerou manchetes em todo o planeta. Uma vergonha e uma tragédia bem brasileira.
Nesse contexto, a passagem da Escola de Frevo do Recife foi só alegria e orgulho. Aliás, alegria é a palavra mágica. Os meninos e as meninas contagiaram a platéia com sorrisos escancarados, um astral parecido com o que Ronaldinho Gaúcho espalha nos campos da Europa.
Alexandre Macedo, coreógrafo da escola, não ficou surpreso com a premiação. A dança popular pernambucana é muito forte, diz ele. "Tenho viajado pelo mundo e a recepção é sempre muito boa. Eu acredito muito no jeitinho brasileiro, não no sentido pejorativo. Acredito na alegria. Somos um povo amistoso, só temos 500 anos, temos a mistura das raças, acho que isso encanta os estrangeiros. Nos comentários da comissão julgadora, as expressões mais usadas eram ‘maravilhoso, vibrante, lindo’. A dança começa aí."
Fernando Lima, diretor de gestão da Fundação de Cultura do Recife, acredita que o prêmio e a viagem a Nova York abrem uma nova perspectiva de vida para os meninos, pessoal e profissionalmente. "São meninos que vivem em comunidades carentes e até em situações de risco. A gente aposta numa mudança de vida para eles. O prêmio é importante, mas poder vislumbrar uma carreira profissional é o que vai marcar essa viagem. É nisso que a gente aposta. Pernambuco e Recife têm investido muito na diversidade cultural. Amadurecemos muito. Investir em cultura não é gastar dinheiro, é ganhar respeito, é abrir fronteiras."
Para quem saiu da periferia do Recife e desembarcou na grande metrópole nova-iorquina, a experiência é definitiva. Antes e depois de Nova York, assim é a nova vida dos meninos e das meninas do Recife .
Confira a seguir alguns depoimentos:
Bruno Farias, 19 anos, ficou encantado com a cidade e assustado com o frio primaveril de Nova York. Por aqui ele não ficaria. Bruno se sentiu um profissional no palco do Youth America.
Já Diógena Carla, 18 anos, gostou muiiito de Nova York, e gostaria de morar na Big Apple. Para ela, ganhar o segundo lugar num concurso de balé foi o máximo. Times Square encheu os olhos de Carla.
Edison Couto, 17 anos, adorou se apresentar em Nova York. "Ir para Bahia ou São Paulo ja é uma vitória, imagina ganhar um segundo lugar num dos concursos mais importantes do mundo." E completa: "Nova York é tudo! Tudo de bom! Se eu pudesse eu morava aqui, apesar de que não tenho nada que reclamar do Recife."
Davidson Ferreira Alves, 16 anos, adorou Nova York, gostou dos prédios, dos parques, de tudo. "Eu adorei. Isso aqui é um sonho! Eu queria muito ficar aqui."
A palavra frevo vem de ferver, de efervescência, explica Alexandre. Sem dúvida alguma, os meninos e as meninas do Recife ferveram Nova York. Eles são a cara alegre do triste Brasil.
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