Expedito Filho* |
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Nova York – As fotos da prisão de Abu Ghraib, com soldados no papel de torturadores, balançaram a letárgica opinião pública americana que, finalmente, começa a enxergar por que o mundo está vivendo uma onda de anti-americanismo. Do atentado terrorista contra as torres gêmeas do World Trade Center até as fotos dos presos iraquianos torturados, muita coisa mudou e, agora, para melhor. A mídia americana reecontrou-se com seu senso crítico e começou cobrando a demissão do Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, e a mudança de rumos na política de ocupação do Iraque. Como se sabe, Bush não deverá demití-lo porque se vive aqui um ano de eleições presidenciais, mas pagará o preço do desgaste de manter o homem que, em ultima análise, deveria ter coibido a barbárie e o show de abuso. Ao engajar-se na luta de combate ao terrorismo bandido de Osama Bin Laden, a mídia cometeu uma série de equívocos e viveu um período obscuro. É bom lembrar que os principais jornais e revistas americanas defenderam a invasão do Iraque sem o apoio das Nações Unidas, quando o mundo todo alertava para o risco que essa decisão implicava. A imprensa americana acreditou na piada de que o subdesenvolvido país de Sadam Husseim escondia poderosas armas químicas, biológicas e nucleares . O obscurantismo no país mais potente do planeta resistiu, até mesmo, à revelação de que o governo de George W. Bush utilizou-se de informações duvidosas para justificar a invasão – entre elas, a falsa documentação que assegurava que o Iraque tinha comprado urânio de Níger para fabricar a bomba atômica. Tanta cegueira se justificava na crença de que Sadam tinha conexões com a Al-Qaeda. Até aqui, não há provas dessa ligação. Agora, as coisas parecem mudar. Descobriu-se, finalmente, que a invasão do Iraque, sem o respaldo internacional, foi mesmo desastrosa e ocorreu por interesses econômicos nos campos de petróleo. A tortura contra os iraquianos, praticada pelo ditador Sadam Hussein, apenas mudou de lado. Deixou a turma do Sadam para ser incorporada por parte das tropas americanas. A boa notícia é de que o pensamento único está com seus dias contados. Como resultado, pode-se ter uma reviravolta na política americana. Para começar, a reeleição de Bush já não é tida como uma conta de resultado conhecido. Ele vive seu pior momento e está praticamente empatado com o candidato John Kerry, do Partido Democrata. Um outro sinal do desgaste foi a desarticulação da Casa Branca. Condoleeza Rice, principal assessora de Seguranca Nacional, foi obrigada a explicar por que errou o alvo e não atirou na Al Qaeda, depois de avisada que a organização terrorista planejava um grande atentado contra os Estados Unidos. O secretário de Estado, Collin Powell, único a alertar o presidente para o erro que seria a invasão, permanece isolado dentro do próprio governo. Rumsfeld pediu desculpas pelos abusos, mas sua demissão foi pedida em editorial pelo New York Times. A percepção do governo Bush ficou mais próxima da realidade porque a mídia retomou o foco e a pegada. Uma mídia engajada em um pensamento único, ou em um projeto de governo, qualquer governo, é um desastre para o país. Essa é a principal lição que se pode tirar dos abusos na prisão de Abu Ghraib. * Expedito Filho tem 26 anos de profissão, trabalhou no Jornal de Brasília, Correio Braziliense, Jornal do Brasil, IstoÉ, foi editor especial da revista Veja e chefe das sucursais de Brasília da IstoÉ Dinheiro, do Jornal do Brasil e da Época. Tem no currículo três prêmios Esso, um prêmio Líbero Badaró e diversos prêmios Abril. |
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