A má notícia é que o PIB estagnou em 2014. A pior notícia é que 2015 começa com ‘forte desacelerada’
Pouco importa se o PIB brasileiro cresceu 0,1% em 2014, como sustenta o IBGE, ou recuou isto ou mais, como percebem as ruas. O certo é que, no caso de um país pobre como o nosso, não crescer no mínimo 4% já equivale a encolher, à medida que novos contingentes chegam ao mercado de trabalho e não encontram empregos à sua espera.
As pressões sociais aumentam em progressão geométrica e, se o quadro negativo perdura por alguns anos, as ruas explodem. É simples assim. Admissão oficial e manipulação de dados à parte, a verdade nua e crua é que o Brasil está em recessão desde o ano passado. E a coisa, infelizmente, vai piorar.
Não porque o derrotista que vos escreve esteja sempre torcendo pelo pior, mas porque o próprio Chicago boy incumbido da gestão da economia no governo de Dilma Thatcher (ou será Margaret Rousseff?) admite explicitamente que estamos passando por uma “forte desacelerada” neste começo de ano.
No burocratês típico dos que não querem ser bem compreendidos pelo cidadão comum, Joaquim Levy atribui o agravamento da recessão ora à existência de “uma série de questões” pendentes no final de 2014, ora à “incerteza que havia na virada do ano”. Os dois eufemismos apontam na mesma direção: estava pendente a substituição do morto-vivo Guido Mantega e a incerteza do mercado era quanto ao perfil do seu substituto.
Bem, para dar fim à era da incerteza, Dilma procurou, procurou, procurou, até encontrar um sacerdote do culto neoliberal disposto a assumir o Ministério da Fazenda. Teve de se contentar com um do baixo clero. Antes, outro mais ilustre respondera ao convite dando a entender que mais valia ocupar uma posição de destaque no Bradesco (trata-se, aliás, de uma avaliação corrente nas altas rodas).
Quando lhe caiu a ficha de que não conseguiria aliciar um discípulo de Milton Friedman mais categorizado, Dilma bateu o martelo: “Vai Levy mesmo!”.
Agora temos um ministro no qual os exploradores confiam plenamente e do qual os explorados desconfiam totalmente. Então, é de supor-se que, doravante, os investimentos produtivos sejam retomados e a geração de empregos recomece a crescer, para em breve sairmos da recessão. É o que se depreende da mal disfarçada ode a si mesmo do Levy.
Se a pajelança ortodoxa não resultar, o tranco que tomaremos será muito maior do que tenta nos fazer crer a vã retórica do Joaquim.
Eu apostaria em que logo toparemos com filas quilométricas em locais de distribuição da sopa dos pobres, como acontecia durante a grande depressão dos anos 30.
Graça estava tão sem graça na CPI que deu pena…
Trabalhei com Antonio De Salvo, um dos pioneiros das Relações Públicas no Brasil. Ele aconselhava os seus clientes a, quando aparecesse na mídia uma acusação totalmente injusta contra eles, lutarem até o fim para o esclarecimento dos fatos. Mas, se a acusação tivesse um pingo de verdade, o melhor era admitirem-na de maneira rápida e sucintamente, pedirem desculpas, pagarem indenizações, tomarem medidas para reparar o malfeito, etc.
Porque, explicava ele, quando alguém está em posição falsa mas se recusa a admitir o erro, os repórteres ficam escarafunchando o caso até encontrarem motivos para colocar tal pessoa no pelourinho da opinião pública. O episódio repercutiria muito mais e o que se tentava esconder acabaria aparecendo e determinando um desfecho desastroso.
Ainda que a mentira ou falha descoberta tivesse sido de pequena monta, seria suficiente para os leitores suspeitarem da existência de muito mais podres por baixo do pano, “cesteiro que faz um cesto, faz um cento”.
Já mea culpa desarma os acusadores, que se retiram comemorando vitória e vão procurar outros alvos.
Foi melancólico o depoimento da ex-presidente da empresa, Maria das Graças Foster, à CPI da Petrobrás, confessando-se “envergonhada” da roubalheira que veio à tona nos últimos tempos. Eis algumas frases:
“Eu entrei aqui nas outras CPIs, em audiências, com muito mais coragem do que entro hoje aqui. [Porque] poderiam ter todas as suspeitas mas não tinha os fatos que estão aí, para serem apurados, evidentemente. Eu tenho realmente um constrangimento muito grande por tudo isso, de olhar pra vocês…
“Gostaria que tudo isso fosse mentira e que não tivesse tido propina alguma…
“A Petrobras merecia um gestor muito melhor do que eu, eu não tenho a menor dúvida disso”.
Deixou a impressão de ser uma mulher digna, que desempenhou um mau papel para ser leal a outrem e hoje se arrepende amargamente disto. Foi ingenuidade dela supor que não acabaria sendo acuada pelas descobertas da Operação Lava Jato. Agora que foi para a rua da amargura e o castelo de cartas desabou, sua sensação deve ser a de quem sofreu perda total.
Assim como no caso de José Genoíno, eu botaria a mão no fogo quanto a Graças não haver tirado proveito pessoal do esquema de corrupção. Deu pena ver um preso e a outra com a reputação em frangalhos por preferirem errar junto com o grupo do que assumir individualmente uma posição correta.
Quem riu por último foi o Paulo de Tarso Venceslau, que, colocado na mesma situação (vide aqui), recusou-se a fechar os olhos às falcatruas. Foi expulso do PT, mas saiu com a dignidade intacta e o moral elevadíssimo.
Agora, se quiser, poderá atirar na cara dos dirigentes petistas que os alertou da existência de um ovo de serpente sendo incubado pelo partido, em tempo hábil para evitarem que o mal crescesse. Os que optaram pelo acobertamento em 1988 são os culpados pelo atual infortúnio de Graças e Genoíno, pela destruição da Petrobrás e pela desmoralização do PT.
Reinaldo Azevedo quer as ruas pressionando pelo impeachment. E o governo, vai só torcer contra?
O boquirroto Reinaldo Azevedo entrega a estratégia dos partidários do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, cujas desconversas, reticências e negaceios a mim nunca iludiram (há uma legião de cínicos hoje questionando o impedimento, mas prontinhos para o respaldarem amanhã):
“…um processo de impeachment requer determinadas circunstâncias políticas, sim, além das jurídicas.
‘Ah, mas você não disse achar que já existem motivos?’ Sim, eu acho. Mas quem também precisa achar —além da maioria dos brasileiros, que pensa o mesmo— é a Câmara dos Deputados. É por isso que, nesse caso, a rua é a serventia da democracia. Entenderam?”
Ou seja, toda essa corja está à espera de que as manifestações de protesto cresçam e apareçam o suficiente para assustarem os parlamentares. No próximo dia 12 o bloco estará de novo na rua.
Até que, de olho na própria sobrevivência política, os 300 picaretas (no cálculo do Lula) ou 300, 400 achacadores (segundo o Cid Gomes) optem por sacrificar Dilma.
E não há pressa, porque a presidenta, avaliam, continuará sangrando enquanto não for defenestrada ou não der a volta por cima.
Como a segunda hipótese depende em muito da recuperação econômica e esta dificilmente ocorrerá antes de 2017, podem continuar esperando durante algum tempo o momento certo para darem o bote.
Quanto ao governo, cavará a própria sepultura se ficar apenas torcendo para que o clamor das ruas não se torne ensurdecedor. Precisa retomar a iniciativa política, e só o logrará com medidas muito mais impactantes do que as trocas de seis por meia dúzia no Ministério.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. Mantém o blog Náufrago da Utopia.
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