Mesmo 33 anos após sua morte, os espanhóis ainda não conseguiram enterrar o fantasma do ex-ditador, eternizado na extinta moeda do país
Cláudio Versiani, de Barcelona*
O fantasma de Francisco Franco Bahamonde, caudilho de Espanha por graça de Deus, ainda assombra os espanhóis.
No dia 8 de agosto, Leticia Giménez-Arnaua, bisneta do ditador, se casou com o salvadorenho Marcos Sagrera Palomo. O casamento foi no Palácio de Meirás, na cidade de Sada, região de La Coruña. Trezentos convidados participaram das bodas.
Do lado de fora, um grupo teatral representou o casamento da bisneta de Franco. Foi a forma de protestar contra a manutenção do palácio pela família do caudilho. O próprio Franco encarnado compareceu. O personagem não assustou ninguém, pelo contrário, foi diversão pura.
O palácio, que tem 2.115 m2 de construção e fica num terreno de quase 7 hectares, é alvo de disputa entre a família Franco e setores da sociedade civil espanhola, tendo à frente a Comisión por la Recuperación da Memoria Histórica (CRMH).
Palácio de Meirás
O dinheiro para comprar o palácio para Franco em 1938 foi arrecadado através de um imposto revolucionário. Quem não contribuía era considerado comunista. A contribuição era compulsória num país devastado pela guerra civil que nem havia acabado ainda.
“Saludo a Franco. Arriba España!”
Assim estava impresso nos bônus daqueles anos. Era obrigatório o nome e domicílio de quem efetuava a “doação para a aquisição e reconstrução da finca Torres de Meirás, dedicada ao caudilho”.
Os funcionários do governo não tinham como escapar. A contribuição já vinha descontada do salário. As prefeituras também “doaram” um bom dinheiro para a compra do palácio.
A comissão encarou o casamento como um ato de provocação dos familiares de Franco, um ato para deixar claro que o palácio pertence a eles, os Franco. O Palácio é do povo galego, declarou Manuel Monge, membro da CRMH. Foi comprado com dinheiro do povo e doado ao chefe de Estado, não ao ditador Francisco Franco, completou.
“Venir a celebrar una boda a este pazo es un escándalo. Estos terrenos se los robaron al pueblo y es al pueblo a quien tienen que devolvérselo.”
A família Franco fez fortuna enquanto esteve no poder. E foram quase 40 anos de ditadura. A mulher de Franco, Carmen Polo, era conhecida como “La señora de Meirás” ou simplesmente “La senõra”. Os comerciantes e joalheiros de La Coruña conhecem bem as histórias de Carmen Polo. Quando estava em Meirás, “La señora” gostava de ir às compras em La Coruña. Acompanhada da mulher do governador do estado, “se metían en las joyerías y arrasaban. Nunca pagaban”.
Ainda hoje se diz na cidade que “La señora” sempre comprava, não pagava e pedia que enviassem a fatura. Ninguém enviava, é claro.
Nos últimos anos da ditadura, que os espanhóis chamam de “dictablanda”, os joalheiros de La Coruña retiravam as peças mais valiosas dos mostruários ou até mesmo fechavam as lojas, quando “La señora” estava por perto.
Os moradores de Sada e de La Coruña querem que o palácio seja transformado em bem de interesse cultural e passe a fazer parte do patrimônio cultural da Galícia. O processo já está em andamento e a família Franco ainda pode recorrer. Se o palácio for considerado bem de interesse cultural, os proprietários serão obrigados a abrir a residência ao público pelo menos quatro dias em cada mês. E estarão proibidos de retirar qualquer objeto de lá e de efetuarem reformas.
A riqueza da família Franco é incontestável, mas, 70 anos depois da chegada do Generalíssimo ao poder, a sociedade espanhola não sabe ao certo o valor da fortuna da família.
Em janeiro de 2008, a cidade de Sada revogou o título de prefeito de honra que havia sido outorgado a Franco décadas atrás. Outras cidades espanholas ainda têm Franco como alcalde honorario perpetuo ou hijo predilecto ou ainda alcalde honorífico.
Centros importantes como La Coruña, Granada, Salamanca, Albacete, Oviedo e Toledo ainda mantêm alguma honraria a Francisco Franco Bahamonde. Em 1947, através de um referendo nacional, o ditador havia sido aclamado chefe vitalício do Estado. Óbvio, o referendo foi uma farsa e uma fraude franquista. Várias cidades espanholas ampliaram a "homenagem" e fizeram de Franco o prefeito honorário.
Em Sada, a memória de Antonio Fernández Pita, último prefeito republicano, será resgatada. Em novembro de 1936, Fernández Pita foi detido, julgado e fuzilado pelo simples fato de ser o prefeito. Ou de ter sido eleito prefeito com os votos do povo.
Em Santander, Franco ainda está montado em seu cavalo na praça onde está a sede da prefeitura da cidade. Ele está ali desde 1964. Deve ir para um museu em setembro. Por enquanto, a estátua segue sendo uma das atrações turísticas da cidade.
Franco é um morto difícil de ser enterrado. E as feridas do período negro da Espanha não cicatrizam assim tão fácil.
A guerra civil da Espanha é considerada a última guerra romântica, se é que alguma guerra possa ser romântica. Além da denominação romântica também é chamada de a guerra justa. Ou uma delas.
A história do mundo passa pela guerra civil espanhola, que começa em 17 de julho de1936 com um levante de militares estacionados na norte da África na cidade espanhola de Melilla. Em outubro, Franco é o novo chefe de governo dos rebeldes e o generalíssimo do exército.
Isolado na África, Franco buscou o apoio de Hitler e Mussolini. A Alemanha enviou homens e aviões, a Itália também. Os nazistas e fascistas também financiaram o exército rebelde.
Guernica é a primeira cidade inteiramente destruída por um bombardeio aéreo. Todos os objetivos eram militares, não importava muit
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