Marcos Magalhães |
|
Levando na bagagem de sua viagem a Nova York os primeiros números do programa Bolsa Família, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve um duplo objetivo durante encontro com representantes de 58 países, na Organização das Nações Unidas: recolocar o tema da fome na agenda mundial e firmar-se como liderança dos países emergentes. A julgar por ampla reportagem publicada há poucos dias pelo The Guardian, porém, a fonte de inspiração para as nações em desenvolvimento encontra-se do outro lado do mundo: mais precisamente, na China. Em caderno especial dedicado às tendências internacionais contemporâneas, intitulado O Mundo em 2020, o influente jornal londrino – de tendência trabalhista – diz que, em todos os lugares do mundo em desenvolvimento, as pessoas estão “sentando e tomando nota do dínamo chinês”. Ainda de acordo com o jornal, as “vertiginosas” taxas de crescimento do gigante asiático, superiores a 8% ao ano, retiram milhões de habitantes da situação de pobreza e são “fonte de inspiração como modelo de desenvolvimento”. Nos diversos artigos do suplemento, sobre temas que vão do futuro da África às novas fontes de energia, o Brasil é citado duas vezes. Da primeira vez, para lembrar que o abastecimento das necessidades de Londres depende de fontes tão distantes como os campos de soja de Mato Grosso e as florestas da Escandinávia. Da segunda, para observar que o modelo chinês está seduzindo líderes de países tão diferentes como o Vietnam e o Brasil, que estaria mandando equipes de estudo a Pequim. O combate à fome certamente merece ser incluído entre os temas de maior relevância da comunidade internacional, como quer o presidente Lula. Ainda mais se estiver acompanhado de medidas para tributar as movimentações financeiras transnacionais. Da mesma forma, programas como o Bolsa Família terão um relevante papel a cumprir na superação da pobreza absoluta. Especialmente se, na prática, se garantir a presença das crianças nas escolas e se evitar o uso eleitoreiro do dinheiro público. O discurso de Lula tem muitas vezes encontrado boa acolhida junto a líderes europeus preocupados com a justiça social. Em diversos países do Terceiro Mundo já começaram a ser adotados programas semelhantes ao antigo Bolsa Escola, divulgado em incansáveis viagens internacionais pelo senador e ex-ministro Cristovam Buarque. O combate à pobreza vem se firmando como um imperativo de consciência em várias partes do mundo, principalmente se associado a programas de educação e saúde. Mas é a superação da pobreza, por meio do crescimento, que parece encantar o mundo em desenvolvimento, pelo que se conclui da leitura do suplemento. É como se esses países sonhassem em se transformar em novas Chinas. Muitos deles nem chegarão perto, naturalmente, por não contar com força de trabalho como a chinesa, ou com os investimentos e recursos necessários ao crescimento. Outros certamente buscarão um novo caminho – nem sempre semelhante ao chinês – para chegar ao clube dos países mais desenvolvidos do planeta. Poucos duvidam, à esquerda e à direita, da capacidade brasileira de integrar o segundo grupo. Mais do que nunca, porém, os candidatos ao clube precisam aproveitar as oportunidades que lhes aparecem. O Brasil é lembrado, no suplemento, pela soja de Mato Grosso. Este é um bom caso de sucesso do país. A extensão das fronteiras agrícolas, aliada à intensa aplicação de tecnologia desenvolvida no país, garantiu a presença brasileira no grupo dos maiores produtores de grãos do mundo. Mas ainda não partem do Brasil novos exemplos de vitalidade para a economia internacional. Boas chances parecem existir. Apenas para citar o setor de novas energias, tema de um dos artigos do suplemento, países como Japão e Alemanha já apostam suas fichas no desenvolvimento da energia solar e outros, como a Inglaterra, apostam nas possibilidades de geração de eletricidade a partir das marés e das ondas. Todos de olho no enorme potencial do mercado de energia deste início de século. O Brasil dispõe dos recursos necessários para se firmar no setor, desde que tenha uma visão de futuro e promova fortes investimentos nas tecnologias apropriadas. Longo prazo, na gíria política nacional, é o mês que vem. Mas, na energia como em outros setores, o país poderia aprender a aproveitar suas oportunidades para que os chineses não tenham o monopólio como fonte de inspiração do mundo em desenvolvimento. |
Deixe um comentário