Márcia Denser
Uma revista pediu a vinte escritores brasileiros (eu incluída) a lista dos dez melhores livros de contos. Escritos em qualquer época, em qualquer língua. No fundo é aquela bibliografia de sustentação do escritor – os livros que ele relê – e que possui um caráter quase imutável, permanente, eterno. Falando francamente nem sempre posso atender a esse tipo de solicitação – e para mim já são muitas, vocês nem imaginam – contudo alguma mola secreta deve ter sido acionada porque parei, pensei puxa, dez livros de contos? eu me amarro em livros de contos! De forma que uma hora depois estava feito.
A lista:
1 – Todos os Fogos, o Fogo de Júlio Cortázar.
Este livro é a suma da contística cortazariana – e JC contista se insere entre os melhores do mundo na literatura contemporânea – sobretudo quanto ao exercício duma técnica refinadíssima posta a serviço da originalidade, o que dá textos como A auto-estada do sul, Senhorita Cora, A Ilha do Meio-Dia, o conto título.
2 – Ficções de Jorge Luís Borges.
Bom, este é outro. Suma da contística borgiana que, por sua vez, é um dos melhores do mundo, etc. Maravilha da ficção posto que escrita em forma de ensaios. Apócrifos. Hilariantes. Impagáveis. Divinos.
3 – Música Para Camaleões de Truman Capote.
Neste livro, TC, talvez sem o saber (sem premeditar), dá o melhor de si, confiram Mojave, Pequenos Ataúdes,Um dia de trabalho ou Olá, Desconhecido: simplesmente brilhantes!
4 – Nove Histórias de J.D. Salinger.
Quando se é mais jovem, mais inexperiente, se gosta mais. Depois, hum, nem tanto. Salinger tem umas obsessões, umas exclusões, um jeito ianque e judeu demais de ser mascarado. Mas continua terrivelmente eficiente, podem apostar. Irretocável. Foi a “tecnologia do futuro” em matéria de diálogos. Ainda é. Foi também a evolução de Hemingway que, devido a J.D., saiu da minha lista.
5 – Feliz Ano Novo de Rubem Fonseca.
Zé Rubem é, de longe, o grande contista brasileiro contemporâneo. Beneficiando-se da leitura acumulada dos”tough writers” – os escritores durões – constitui o esplendor da nossa prosa urbana em sua intensidade máxima. A merda que, graças ao mercado editorial, depois só produziu romances idiotas, vazios, tijolaços cheios de nada. Desses que só servem para escorar os outros livros na estante. Meu Zé, meu Rubem.
6 – O Aleph de Jorge Luís Borges.
Por que nessa coletânea se inclui aquele que considero a obra-prima de JLB: O Imortal.
7 – Três Contos de Gustave Flaubert.
A leitura de Herodíade é absolutamente necessária para qualquer um que se julgue escritor.
8 – Alguém Que Anda Por Aí de Júlio Cortázar.
Um dos últimos do grande mestre. Experimente Queríamos tanto a Glenda e o conto título. Dum refinamento abissal.
9 – Notas da Arrebentação de Marcelo Mirisola.
Mirisola é o grande prosador brasileiro que surge nos anos 90, genial, intuitivo. Sua proeza maior? Elevar o clichê, o banal, todo o lixo verbal produzido pela cultura de mercado à categoria de fenômeno estético. Por mim, o sujeito já podia quebrar o lápis e parar!
10 – Histórias dos Mares do Sul de Somerset Maugham.
Para quem gosta de literatura, a escolha é óbvia. Pensem em Chuva, Mackintosh, Honolulu! Mas para quem não gosta, azar, não vou ter saco de explicar!
Muita gente vai estranhar as ausências de William Faulkner – meu favorito mas um desastre como contista – e James Joyce por Retrato dum artista quando jovem, seu único livro de contos – que não inclui mesmo porque não quero me fazer de besta, nem posar de culta.
Deixe um comentário