Alexandre Cardoso
A estabilidade da economia e o horizonte que se abre com as recentes descobertas no setor energético colocam o Brasil numa boa posição no ranking das economias mundiais. Por mais animadores que sejam, esses indicadores deixam como subproduto a necessidade de se refletir sobre as condições do país para enfrentar as demandas que certamente serão geradas no campo do trabalho. Esse desafio está conectado ao sistema educacional e ao futuro da juventude brasileira.
As estatísticas revelam que a evasão no ensino médio é altíssima e que, dos alunos que alcançam a educação superior, a maioria não consegue concluir a universidade. O último censo escolar, de 2006, mostra que a situação no ensino médio é ruim em todos os estados. Dos 3.651.903 alunos matriculados no período, apenas 50,9% concluíram o curso, o que significa dizer que um contingente de 1.858.615, por diferentes razões, abandonou as salas de aula.
A situação do estado do Rio de Janeiro nesse contexto é preocupante e requer uma avaliação mais detalhada. Segundo dados do MEC, apenas 44,5% dos alunos matriculados terminaram o ensino médio em 2006. É um índice de conclusão inferior ao de alguns estados da região Nordeste, como a Bahia (48,2%) e Pernambuco (45,8%) e o pior de todo o Sudeste.
Igualmente preocupante é o destino dos universitários que conseguem concluir o ensino superior no país. Para ficar apenas em um exemplo, é prudente lembrar que cerca de 80% dos estudantes que saem das universidades com diploma de bacharel em direito não conseguem aprovação no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Além de sugerir que o processo educacional precisa ser sacudido por mudanças, as estatísticas levam a uma inevitável pergunta: de que serviram os 12 anos de estudo até a conclusão do ensino médio e os 16 ou 17 anos para encerrar o superior – com tempo e gastos financeiros pesados – se ao final do período o jovem não tem sequer uma alternativa para ingressar no mercado de trabalho? Não serviram para nada, mas apontam para respostas que podem ser encontradas na fase intermediária da educação, ou seja, no ensino médio. Mais que se adequar à realidade atual, o ensino precisa oferecer garantias de futuro aos jovens, sobretudo aos nunca alcançarão o ensino superior ou um diploma universitário.
Um dos caminhos é incluir cursos profissionalizantes no ensino médio. Resultado de amplo debate no meio acadêmico, apresentarei na Câmara dos Deputados proposta de mudança na Lei das Diretrizes e Base (LDB). Quero críticas e sugestões (dep.alexandrecardoso@camara.gov.br). Pela proposta, as escolas serão obrigadas a oferecer, nos últimos dois anos, cursos profissionalizantes segundo as vocações regionais. Serão seis meses de preparação em cada um dos anos para que o jovem tenha acesso ao primeiro emprego.
Também estou exortando os homens públicos em geral, com ênfase nos futuros dirigentes do país, para um debate mais aprofundado sobre o assunto. A troca de ideias com o meio acadêmico e a intimidade com pesquisas sobre o setor me dão a certeza de que este é um tema de alta relevância para o país. O programa de governo de quem irá comandar os destinos da nação nos próximos quatro anos deve ter a educação como prioridade e, dentro dela, cursos profissionalizantes no ensino médio. Esse debate é um imperativo.
O estudante e a família terão, democraticamente, a alternativa de optar ou não, mas os estabelecimentos públicos ou privados devem construir estruturas adequadas, que viabilizem os cursos e abram janelas, inclusive, para estágios no mercado. A simples constatação de que mais da metade dos estudantes abandona a escola compromete o futuro da juventude brasileira e revela um enorme desperdício de mão de obra num país que tem pressa crescer com solidez.
Uma pesquisa recente da Fundação Getúlio Vargas (ver em www.fgv.r/cps/proedu) avaliou o bom desempenho dos cursos profissionalizantes no mercado de trabalho e confirmou que eles não apenas capacitam, mas são, também, saudáveis iniciativas para garantir melhores chances de inserção no mercado e de maiores salários.
O estudo também chama a atenção para os riscos de um apagão de mão de obra em decorrência do crescimento econômico do país e da falta de profissionais capacitados. As empresas já não encontram trabalhadores em quantidade e qualificação exigidos pelo mercado. Como agravante desse quadro, o número de jovens matriculados em alguma instituição formal vem caindo. De 2006 a 2008, a queda foi de 3,5% entre os jovens de 18 a 24 anos de idade. E nada indica que a queda tenha sido contida.
O ensino profissionalizante firma-se como alternativa a um sistema educacional genérico – de qualidade e foco questionáveis –, à crescente evasão escolar e a um diploma que se tornou inalcançável para a maioria dos estudantes que atingem a educação superior. É também um dos caminhos para ajudar o Brasil a enfrentar e superar o flagelo das drogas. Ele apresenta resultado em prazo mais curto, permite que o estudante concilie estudo e trabalho, e é direcionado às necessidades dos diferentes nichos de negócio. O que proponho é um modelo que combine a educação formal com a busca de uma profissão.
Principal personagem desse processo, o jovem deve ser o alvo das políticas públicas. A ele devem ser ofertadas as informações sobre a eficácia dos cursos e as vantagens do ensino profissionalizante. Um jovem consciente saberá adotar o caminho correto.
Os cursos profissionalizantes têm alcance maior que os técnicos, numa proporção de 43% contra 6% das vagas no mercado. Uma vez incluídos no ensino médio, portanto, podem oferecer mão de obra capacitada a setores como turismo, construção civil, comércio, gestão, indústria automobilística, finanças, petróleo e gás – área que terá saudável impulso com as descobertas do pré-sal –, gastronomia, estética ou mesmo no pujante agronegócio.
A rede que precisa de serviços profissionais é vasta e crescente. Uma vez tratada corretamente, com qualificação adequada e contingentes voltados para as exigências do mercado, pode ajudar a corrigir as distorções regionais, fortalecendo o papel dos estados e municípios.
É fundamental repensar a escola, criando um sistema que priorize a preparação do jovem para a vida. Não faz mais sentido estimular a busca do diploma universitário como única alternativa ou alimentar o sonho de buscá-lo na capital. Uma escola voltada para a nova realidade do país, com cursos profissionalizantes, pode oferecer alternativas para mudar a vida das pessoas. Nós, homens públicos, precisamos ter a coragem de enfrentar esse debate.
* Deputado federal, é presidente do PSB do Rio de Janeiro e vice-presidente nacional do PSB.
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