O movimento pelo voto distrital puro me parece um grande diversionismo em cima de doces ilusões de quem conhece pouco o funcionamento real da política brasileira. Teria o efeito diametralmente oposto ao pretendido em relação à corrupção e tenderia rapidamente ao tripardidarismo – em vez de ARENA e MDB, teríamos: PT, TUCANOSDEM e… PMDB forever! – e o fim de qualquer espaço para propostas minoritárias ou emergentes.
Que história da carochinha essa de achar que o distrito uninominal dificulta a corrupção eleitoral! A corrupção institucionalizada no Brasil se dá pela escancarada compra de voto, indireta, pelos famosos Centros Assistenciais, e direta, pelos cabos eleitorais que repartem dinheiro vivo. Hoje, o voto já é fortemente distritalizado. Poderia antecipar, com pouca margem de erro, quem seria eleito em distritos na zona oeste e norte do Rio, bairro por bairro. Os mesmos que já o são via seus Centros Assistencias e cabos eleitorais. A diferença é que atualmente ainda há um pouquinho de espaço para o sempre minguante voto de opinião e para “figuras populares”: radialistas, pastores, jogadores de futebol, etc…
Por outro lado, há dificuldades técnicas sérias para se promover a delimitação dos distritos uninominais. Ela nunca é “neutra” politicamente. Acredito que o IBGE poderia, com a Justiça Eleitoral, chegar a uma divisão razoável, mas observamos bem tanto nos EUA quanto na França as consequencias do chamado “découpage”, a técnica de recortar os distritos. Nos EUA, onde é a cargo dos estados, é um escândalo. Aqui vejo como dificuldade suplementar, caso se mantenha a eleição para deputado estadual e federal na mesma data, ter que se trabalhar com duas eleições que coincidem no tempo mas não no espaço. A confusão na campanha seria fatal.
Finalmente, como vemos nos EUA, deputados gestados por distrito uninominal tendem a abordar grandes questões nacionais sob uma ótica paroquial. Por exemplo: um distrito com uma usina a carvão jamais elegerá um deputado preocupado com o aquecimento global e o clima no planeta.
Estou propondo na Comissão da Reforma Política um voto proporcional distritalizado, ou “plurinominal” onde metade seria eleita pela lista e metade por grandes zonas eleitorais (ou grandes distritos) com 4 ou 3 vagas de deputado federal e um número proporcional correlato de estaduais. Essa parte da eleição seria majoritária, na ordem dos mais votados. Os votos dados aos candidatos nessa eleição seriam somados aos dados para a lista fechada e divididos por dois (média aritmética) para calcular o cociente partidário valendo para a outra metade eleita pelo voto de lista. Nesse sentido, sustento que continua sendo um voto proporcional, e não necessitaria de emenda constitucional. Pelo que vejo na comissão, é a única com (remota) chance de reunir uma maioria, de resto a tendência é que mais uma vez nada aconteça.
Reproduzo a seguir para melhor entendimento a emenda que apresentei ao relatório do deputado Henrique Fontana. Minha proposta permite um financiamento público exclusivo que ele persegue como objetivo, mas que não se compatibiliza com o sistema atual que ele conserva parcialmente.
PROPOSTA DA LISTA + GRANDES ZONAS ELEITORAIS, MANTENDO PROPORCIONALIDADE E FINANCIAMENTO PÚBLICO
1 – Metade dos deputados federais e estaduais seriam escolhidos pela lista fechada com base num cociente partidário ponderando a média entre os votos dados à legenda/lista e os atribuídos aos candidatos dos partidos nos grandes distritos.
2 – A outra metade seria eleita nos grandes distritos de 3 a 4 cadeiras de deputado federal e um número correlato, aproximado, de deputados estaduais. A eleição nesses grandes distritos seria majoritária, eleitos os mais votados.
3 – Nos grandes distritos o número de candidatos apresentados por cada partido seria inferior em 1 (uma) vaga ao do número de cadeiras em disputa. Por exemplo: se tivermos 4 vagas para deputado federal, cada partido poderia apresentar apenas 3 candidatos. Os partidos poderiam, a seu critério, apresentar um número de candidatos inferior a esse.
4 – Os candidatos aos grandes distritos seriam eleitos em primárias ou convenções usando os mesmos sistemas propostos pelo relatório Fontana para as listas.
5 – O financiamento das eleições nos grandes distritos seria exclusivamente público, com 70% dos recursos distribuídos igualmente entre os candidatos.
6 – Seriam criados dois tipos de grandes distritos: os estaduais e os municipais. Os estaduais serviriam para eleger metade dos deputados federais e estaduais, e os municipais metade dos vereadores. O desenho territorial desses distritos seria feito nos estados e municípios sob a responsabilidade da Justiça Eleitoral, com concurso do IBGE, buscando a maior proporcionalidade possível entre eleitores e cadeiras nos distritos. Como resultado desse trabalho, seriam remanejadas as zonas eleitorais para se adequarem aos novos distritos.
Vantagens:
a) Viabiliza o financiamento público porque em cada distrito um partido teria, no máximo, três candidatos a deputado federal. No componente lista aberta do relatório Fontana mantinha-se uma situação parecida com a atual com dezenas de candidatos por todo o estado o que dificulta ao extremo o financiamento público.
b) Introduz um componente de regionalização que aproxima um pouco mais os eleitos da população, barateia custos de campanha e facilita o acompanhamento dos mandatos pelos eleitores.
c) Mantém o sistema proporcional na medida em que o voto dado nos grandes distritos continua contando para a eleição proporcional. No entanto, limita o alcance e o poder de transferência dos “fenômenos” eleitorais, tipo Tiririca, pois seus votos, embora contando para o cociente partidário da lista, são limitados ao eleitorado do respectivo distrito.
Eis o texto da emenda:
“Art. 105-A. Nas eleições proporcionais será facultado ao eleitor votar duas vezes: na primeira, dará o voto de legenda na lista partidária preordenada; na segunda, o voto nominal em candidatos.
Parágrafo único. Serão considerados votos válidos os votos de legenda dados às listas partidárias preordenadas e os votos nominais atribuídos aos candidatos. (NR)”
“Art. 107. Para o voto na lista partidária preoordenada determina-se para cada partido ou coligação o quociente partidário dividindo-se pelo quociente eleitoral a soma aritmética dos votos de legenda atribuídos à lista partidária preordenada e dos votos nominais dados aos candidatos desprezada a fração. (NR)”
“Art. 108. Estarão eleitos tantos candidatos por partido ou federação partidária quantos o respectivo quociente partidário e eleição nominal indicar, segundo a ordem da lista final definida neste artigo.
Parágrafo único. A Justiça Eleitoral elaborará a lista final de eleitos do partido ou coligação, obedecendo às seguintes regras:
I – cinquenta por cento dos lugares serão preenchidos pelos candidatos da lista partidária preordenada, na ordem em que forem registrados;
II – cinquenta por cento dos lugares serão preenchidos pelos candidatos eleitos em grandes zonas eleitorais preenchidas as vagas na ordem da sua respectiva votação nominal;
III – A Justiça Eleitoral, com apoio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) promoverá a divisão de estados e municípios, com número de eleitores acima de cem mil, em grandes zonas eleitorais;
IV – As grandes zonas eleitorais, para efeito da eleições para deputados federais e estaduais, serão formadas de forma a eleger 4(quatro), como regra, ou 3 (três), como exceção, deputados federais e um número proporcional aproximado de deputados estaduais.
V – As grandes zonas eleitorais, para efeito de eleições para vereadores serão formadas em municípios com mais de cem mil eleitores de forma a eleger 4(quatro), como regra, ou 3(três), como exceção, vereadores.
VI – Nos municípios com menos de cem mil eleitores a grande zona eleitoral será formada pelo próprio município elegendo-se 50% dos vereadores na ordem dos mais votados e os demais 50% pela lista partidária preordenada cabando a primeira vaga à eleição nominal e assim alternadamente.
VII – As grandes zonas eleitorais terão, necessariamente contiguidade territorial e a maior proporcionalidade possível, no âmbito do estado ou dos municípios com mais de cem mil eleitores, entre eleitores e vagas.
VIII – Cada partido ou federação poderá apresentar em cada grande zona eleitoral um número de candidatos máximo correpondente ao total de cadeiras em disputa menos uma.
IX – a lista final dos eleitos será constituída por 50% de eleitos pela lista partidária de acordo com o número de cadeiras conquistado por cada partido levando em conta a divisão dessas cadeiras pela média artimética entre os votos de legenda e os votos nominais e 50% de eleitos nas vagas preencidas nas grandes zonas eleitorais pelos candidatos nominalmente mais votados.
“Art. 109……………………………………………………………
II – ………………………………………………………………….
§ 1º O preenchimento dos lugares com que cada partido ou coligação for contemplado far-se-á segundo a ordem da lista final a que se refere o parágrafo único do art. 108.
§ 2º Poderão concorrer à distribuição dos lugares no voto por lista partidária os partidos e coligações que não tiverem obtido o quociente eleitoral. (NR)”
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