A presidente Dilma tem consciência de que substitui um mito, o ex-presidente Lula, cuja trajetória e experiência política e eleitoral não encontram paralelo na vida política nacional. As comparações entre os dois têm sido administradas, especialmente nos quesitos de carisma, experiência política, influência internacional e controle sobre o PT, mas todo cuidado é pouco.
O estilo discreto, ponderado e formalista da presidente parece ter agradado aos extratos da classe média e setores da mídia. É muito curioso que esses segmentos e parte da oposição, que na campanha tinham atacado a candidata Dilma de forma vil, estejam elogiando a presidente.
O movimento tático desses supostos simpatizantes da presidente tem por objetivo fazer comparação em desfavor do ex-presidente, numa nítida postura de preconceito em relação à origem e formação de Lula.
Na ânsia de estimular mudanças de rumo no governo Dilma em relação aos mandatos presidenciais de Lula e provocar conflito entre os dois, esses setores têm apontado supostas diferenças de concepção da atual presidente na política externa, na gestão da máquina e dos recursos públicos e, principalmente, na defesa da democracia, dos direitos humanos e da liberdade de imprensa.
Também têm exaltado o perfil técnico e o lado durão da Presidente que, ao contrário de seu antecessor, toma decisões com conhecimento de causa e é implacável com incompetência, desvio ético e corrupção.
O ex-presidente tem consciência disso e também tem ajudado, direta e indiretamente, a evitar exposição negativa da presidente. Consta que ele, por exemplo, participou da articulação de três ausências extremamente úteis a Dilma, que evitaram manchetes negativas para o governo dela.
A primeira foi a ausência do líder do PDT, Giovanni Queiroz, na primeira reunião do Conselho Político. O objetivo foi evitar constrangimento à presidente, com eventual cobrança de lealdade do PDT ao governo na votação do salário mínimo. O líder do PMDB, que se empenhou pessoalmente para garantir 100% de votos de sua bancada, certamente faria algum tipo de provocação ao líder do PDT, com repercussão na mídia.
A segunda foi a ausência do presidente da CUT, Artur Henrique, na reunião das centrais com a presidente para esclarecer a votação do salário mínimo e informar da decisão de corrigir a tabela do imposto de renda em 4,5%. Artur, que estava em viagem aos Estados Unidos, foi representado pelo seu vice, Feijó. Caso tivesse ido à reunião, pelo clima de troca de acusações públicas entre ele e Paulinho da Força, certamente teria havido algum tipo de rusga, o que também iria repercutir na mídia.
A terceira ausência providencial foi a do próprio Lula na recepção ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. A presença de Lula teria tido repercussão na mídia, retirando o brilho do evento. Fariam algum tipo de intriga: ou entre Dilma e Lula ou entre ele e FHC. Mas o fato é que teria notícia com viés de fofoca.
A relação entre Dilma e Lula, portanto, merece uma atenção especial. Todo dia surge uma nota plantada para provocar intriga entre eles. Como o capital político da presidente é derivado, uma eventual crise entre os dois poderia abalar sua relação com o PT e com a própria base social. A presidente sabe que o sucesso de seu governo depende da boa convivência entre ela e Lula e cuidará para evitar atrito, equilibrando autonomia e cortesia na relação com seu padrinho político.
Deixe um comentário