Na semana passada, participei de um debate importante sobre clima e a conferência COP 17, em Durban, no final do mês e tive oportunidade de falar no plenário do Parlamento Europeu, o famoso hemiciclo. O encontro denominado: The Green race to Durban and Beyond contou com a presença da Secretária executiva da ONU para o Clima, Christiana Figueres; de Kumi Naidoo, diretor executivo do Greenpeace; do presidente do IPCC, Rajendra Pachauri (por teleconferência), e da Comissária para o Clima da Comissão Européia, Connie Hedegaad, entre outras personalidades.
Veja abaixo o primeiro vídeo do debate:
E aqui outro vídeo da minha participação no Parlamento Europeu:
Participei da mesa especificamente direcionada para o que pode resultar da conferência COP 17 de Durban. Procurei estabelecer uma ponte entre o que intuí a partir da (decepcionante) reunião do Basic, em Pequim, na semana anterior , e o que pode, realisticamente, ser obtido em Durban. No final do encontro tive uma conversa importante com Chistiana Figueres, que presidiu a conferência COP-16, em 2010, em Cancún, que acabou representando um avanço em relação ao quase desastre de Copenhagen no ano anterior. Das conversas sobre a atuação futura em relação ao clima, foi a mais importante que tive, junto com aquela com Maurice Strong, em Pequim, porque senti por parte dessas duas personalidades super-experientes e visionárias, com um grau de conhecimento acumulado impar e uma aguda visão política, concordância em relação a algumas teses polêmicas que venho defendendo.
A mais importante delas, e que foi o eixo da minha exposição no Parlamento Europeu, é a necessidade de revermos o significado do conceito de “responsabilidades comuns porém diferenciadas” dos países desenvolvidos e dos emergentes. No paradigma de Kyoto, isso significa que apenas os desenvolvidos deveriam ter obrigação de reduzir suas emissões.Ora, isso fazia sentido em 1997, quando da negociação de Kyoto, pois os EUA, a Europa e o Japão representavam a parte do leão das emissões. Atualmente, o mundo em desenvolvimento já ultrapassou largamente o desenvolvido em emissões. A Europa, por exemplo, representa aproximadamente 15% apenas. A China ultrapassou os EUA. Em 2020, mais de 60% das emissões virão de países emergentes. Portanto, qualquer esforço no sentido de atender o que a melhor ciência diz ser necessário para limitar a concentração de Gases do Efeito Estufa (GEE) na atmosfera em 450 ppm e limitar o aumento da temperatura média do planeta em 2 graus, dependerá de cortes nas emissões totais também dos países emergentes.
O futuro será determinado pelas emissões absolutas, não pelas per capita nem pelo histórico de emissões acumuladas na atmosfera desde o início da era industrial. Nessas, a participação dos países desenvolvidos segue absolutamente preponderante. São responsáveis, grosso modo, por 70%, e um chinês, per capita, emite sete vezes menos que um norte-americano. Isso tem que ser levado em consideração no mesmo nível de importância que as emissões totais futuras. Mas essa “responsabilidade diferenciada” precisa se expressar já não mais isentando os países em desenvolvimento da mitigação de emissões, mas aplicando aos países desenvolvidos o princípio “poluidor-pagador”: se são responsáveis por 70% do acúmulo de GEE na atmosfera, devem pagar 70% da conta, ou seja do financiamento do Fundo Verde do Clima, que a partir de 2020 seria de US$ 100 bilhões por ano.
Essa mudança de foco encontra muitos obstáculos, mas terá que ser seriamente enfrentada para que os países em desenvolvimento, particularmente a China, se disponham a num primeiro momento aceitar metas de redução legalmente vinculadas (legally binding) a partir – realisticamente falando – de 2020 e depois, de forma também diferenciada, (o Brasil já o faz) buscar uma data para estabilizar e, depois, para começar a reduzir, em números absolutos, suas emissões. Senão, não haverá a menor chance de vencer o abismo que hoje separa o máximo que todos países juntos acenam como redução de emissões em relação ao mínimo que a ciência julga indispensável.
Esse é o novo paradigma que será necessário estabelecer. Junto com isso cabe a discussão que levantei diante do Parlamente Europeu sobre uma métrica mais clara e unificada e do G-Clima, que já mencionei nos textos sobre a reunião do Basic em Pequim.
Do debate do Parlamento Europeu confrontando-se como o que se discutiu na reunião do Basic, ficou claro o que realisticamente pode se esperar de Durban, na melhor das hipóteses: 1) Uma aceitação por parte da União Européia e alguns outros países do Anexo I, o estabelecimento de um segundo período de compromisso do Protocolo de Kyoto. 2) Um gesto do Basic em relação a aceitar metas legalmente vinculantes a partir de 2020,desde que os EUA o façam também, em data anterior, no mínimo em relação àqueles objetivos anunciados – mas depois abandonados por pressão do Senado – em Copenhagen, em 2009, por Barack Obama. 3) Uma métrica unificada no marco de um sistema de contabilidade robusto e confiável 4) A aceitação por parte do mundo desenvolvido de compromissos financeiros compatíveis com seu histórico de emissões. 5) O detalhamento para implementação concreta de diversos dispositivos já acordados nas várias COP de Bali a Cancún.
Isso é o plausível, embora difícil, em função dos inúmeros obstáculos políticos e da notória desfuncionalidade do sistema da ONU. Essa melhor das hipóteses fica a uma grande distância do mínimo de fato indispensável para lidar objetivamente com o problema do aquecimento global. Mas permitiria, pelo menos, manter a bola em jogo na diplomacia do clima. Como disse durante o nosso debate Christiana Figueres: “A dificuldade é que não estamos aqui tratando simplesmente de um problema ambiental e sim de uma mutação que significa uma nova revolução industrial”.
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