A ideia central de melhorar qualitativamente uma economia buscando, no curto prazo, crescimento econômico, só faz sentido se – e somente se – esse ganho não ficar restrito aos aspectos econômicos; ou seja, é necessário que se estendam as benesses para o lado social, a partir da adoção de uma agenda social com significativos compromissos que fomentem, na essência, a melhoria da qualidade de vida, codinome do desenvolvimento econômico.
Para tanto, na esteira desse crescimento econômico, é de fundamental importância atingir, de imediato, alguns pontos: 1. Eliminar a pobreza absoluta; 2. Melhorar a qualidade do capital humano; 3. Destruir os mecanismos que permitem concentrar a renda, e, 4. Romper sistematicamente com o círculo vicioso da pobreza (baixa escolaridade, subemprego, baixo nível de investimento).
Além disso, é indispensável universalizar o acesso aos serviços sociais, em especial à educação e ao sistema de saúde. O nome disso tudo, é importante reiterar, é “qualidade de vida”; nos dizeres dos economistas, desenvolvimento econômico.
Conquanto, há caminhos a serem trilhados para se chegar lá. Um deles aponta para a clara necessidade de saber algo imperioso: crescer economicamente, reduzindo, em paralelo, os graves níveis de desigualdade social é uma condição dada, no curto prazo, pela disponibilidade física dos recursos; até mesmo porque “crescer” significa “destruir”. Em outras palavras, não há crescimento econômico se não houver utilização dos recursos; faz-se omelete somente com os ovos quebrados. Entretanto, não há recursos em quantidade ilimitada.
Dessa forma, é interessante pontuar algo que passa, por vezes, despercebido: os formuladores de política econômica por aqui ainda não se deram conta o suficiente de que há uma relação sintomática (de causa e efeito) entre a economia e o meio ambiente. Há um considerável grau de dependência por parte da economia em relação à natureza. Toda e qualquer produção advém de recursos extraídos da natureza.
Acontece que no afã de se buscar a qualquer preço as “consagradas” e elevadas taxas de crescimento, pois, com isso, a economia tradicional identifica erroneamente progresso material como sendo sinônimo de riqueza, pouca atenção tem sido dada aos aspectos físicos; ou seja, não se reconhece, ao menos como se espera, a existência de limites naturais.
O fato, claro e certeiro nesse caso, é que a economia brasileira, ainda que esteja avançando do lado econômico, consolidando suas variáveis macroeconômicas (mantendo o nível de preços controlado, administrando a taxa de câmbio, olhando atentamente para o comportamento dos juros domésticos e apontando para aumentos significativos da taxa de produtividade) só adentrará com eficiência pelos caminhos que levam à real melhoria da qualidade de vida de todos quando, finalmente, promover a democratização social, gerar emprego com renda suficiente e aumentar o tempo médio de estudo da população que hoje não passa de 8 anos.
Ainda sobre esse último aspecto, se desejamos, de fato e de direito, consolidar nossa posição como um país moderno e de qualidade, não podemos aceitar que apenas (e tão somente) 15% da população tenha mais de 12 anos de estudos.
Uma nação próspera, capaz de atenuar seus vários desequilíbrios socioeconômicos, principalmente do ponto de vista das conquistas sociais (baixar a taxa de mortalidade infantil, universalização do ensino, renda per capita compatível, mercado de trabalho eficaz e meio ambiente respeitado) se faz com a universalização das condições adequadas para a promoção dessas melhorias: incentivar o ensino de qualidade, a pesquisa em áreas cruciais do conhecimento, a ciência e a tecnologia, além de gerar bons empregos que exerçam a justa distribuição de renda. Sem a generalização dessas premissas, nada avança, exceto os índices de miséria e pobreza crônicas.
Em outras palavras, o que aqui estamos reverberando é que não adianta, por exemplo, ocuparmos a sexta posição no ranking mundial de produção de veículos (em 2010, foram produzidos 3,6 milhões de unidades) se não melhorarmos as vias e as rodovias para essa circulação (temos mais de 1,7 milhão de km de malha rodoviária, mas apenas 170 mil km estão pavimentados e há uma relação de seis habitantes por carro). De nada adianta sermos o quarto país que mais vende automóveis no mundo (3,5 milhões, somente em 2010); o maior produtor de aço da América Latina; de sermos detentores da 3° maior frota aérea do mundo (mais de 11 mil aeronaves e 32 mil pilotos em atividade) se 1/3 (absurdamente 30%) de nossas residências ainda não têm acesso a encanamento (esgoto) e muitos não têm acesso à água potável.
Não adianta prosperar de um lado, se, do outro, de cada mil crianças nascidas, 14 morrem antes de completar um ano de vida. Não adianta vendermos aviões ao mercado externo se ainda nem mesmo sabemos ao certo como tratar os 43 milhões de toneladas de lixo que são produzidos ao ano.
Em que pesem os avanços do lado social – e foram muitos –, principalmente os que respondem pela expectativa de vida – hoje é de 75 anos ante os 31 anos registrados em 1900 – acrescido do aumento na renda per capita e na possibilidade de se construir um mercado de consumo de massa amplo, o fato concreto é que se faz necessário promover, de forma rápida, taxas de crescimento econômico que se convertam em dignidade, em respeito à vida dos que mais sofrem.
Que saibamos, contudo, que crescer só por crescer não faz sentido; até mesmo as células cancerígenas assim agem. O que precisamos é fazer, sim, a economia crescer, mas crescer com dignidade, resgatando nesse ato os mais necessitados e dando-lhes oportunidades de melhoria contínua. Esse é o verdadeiro tipo de crescimento que importa. A economia, enquanto ciência e atividade produtiva tem esse dever; aliás, nasceu, enquanto corpo sistemático de conhecimento, justamente para isso: para melhor a vida dos mais necessitados.
*Economista e professor de economia da FAC-FITO e do Unifieo (São Paulo). Especialista em Política Internacional pela Fesp e mestre pela USP. Blog – http://blogdoprofmarcuseduardo.blogspot.com
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