Mário Coelho
O lobby dos clubes de futebol voltou a ter sucesso na Câmara. Na semana passada, o interesse dos comandantes das agremiações esportivas prevaleceu sobre a necessidade de ser dar mais transparência aos gastos dos clubes na votação do substitutivo à Medida Provisória 502/10. Mudanças sugeridas pelo relator e aprovadas pelo plenário favorecem os dirigentes esportivos de duas maneiras: livra-os da possibilidade de responderem na Justiça por terem deixado suas entidades endividadas e da penhora de seus bens pessoais para garantia de pagamento de débitos.
As alterações feitas pela Câmara no texto começam a causar polêmica no Senado, onde o substitutivo tranca a pauta desde quinta-feira (10). As mudanças na Lei Pelé precisam ser analisadas até 28 de fevereiro. Do contrário, perdem a validade. A retirada da responsabilização dos dirigentes atende a pedidos dos clubes, que relutam a qualquer tipo de fiscalização.
Boa parte dos dirigentes defende que só exista punição caso seja comprovada a intenção de lesar os cofres da entidade. ?Nós modificamos porque não é justo fazer os sócios dos clubes serem responsabilizados pela má gestão?, disse o relator do projeto na Câmara, José Rocha (PR-BA), ao Congresso em Foco. Também foi retirada do texto a previsão de alienação dos bens dos clubes em caso de dívidas.
Responsável pelas mudanças na medida provisória, José Rocha presidiu o Vitória da Bahia na década de 1980 e é considerado um dos últimos representantes da bancada da bola na Câmara. Atualmente ele preside o Conselho Deliberativo do clube, que foi rebaixado para a Série B do Campeonato Brasileiro no ano passado. Nas eleições de 2002 e 2006, o parlamentar recebeu um total de R$ 150 mil em doações de campanha da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Com a minirreforma eleitoral, entidades como a CBF foram proibidas de doar para campanhas de políticos.
?Retirar a responsabilização é um retrocesso. Tentamos um maior rigor, isso é negativo?, criticou o senador Alvaro Dias (PSDB-PR). Ele lembrou que as alterações na Lei Pelé, que geraram controvérsias no Senado por conta da disputa entre as redes Globo e Record, foram acordadas entre lideranças do governo e da oposição e o ministro do Esporte, Orlando Silva. ?Não entendi porque isso aconteceu. O líder é o mesmo, o ministro é o mesmo. Houve um desrespeito ao compromisso assumido?, afirmou o novo líder tucano no Senado.
Mudança na Lei Pelé gera polêmica no Senado
A matéria ainda não tem relator no Senado. O texto aguarda a leitura na ordem do dia, o que deve acontecer amanhã (15). O senador tucano espera ser indicado relator novamente e fazer prevalecer a versão aprovada pela Casa no ano passado. ?A tradição é que a matéria volte para o mesmo relator. Vamos conversar para que isso aconteça?, adiantou o Dias.
Para o relator da MP na Câmara, as mudanças não provocam retrocesso, mas avanço na Lei Pelé. ?É um avanço para os atletas, para os clubes?, disse o deputado baiano. De acordo com ele, para barrar o texto do Senado, foram ouvidos atletas, clubes, entidades e o Ministério do Esporte. ?Agradou a todos. Inclusive recebi homenagens do COB, da Faap, de atletas?, afirmou, mencionando o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e a Federação das Associações de Atletas Profissionais (FAAP).
Originalmente, a MP tratava da criação de novas modalidades do Bolsa Atleta, subsídio concedido pelo Ministério do Esporte aos esportistas olímpicos. O relator na Câmara incluiu, porém, conteúdo do Projeto de Lei 5186/05, do Executivo, no texto original. A justificativa do deputado baiano é que, se fosse tramitar somente como projeto, não seria votado em 2011. ?A pauta das sessões ordinárias está trancada por medidas provisórias. E projetos de lei não podem ser votados em sessões extraordinárias. É preciso rapidez?, disse Rocha.
Clubes formadores
O texto aprovado na Câmara aumenta o repasse de recursos para os clubes formadores de jogadores de futebol. Se a proposta for mantida pelo Senado, até 5% do valor pago nas transferências nacionais de jogadores, definitivas ou temporárias, deverão ser distribuídos aos clubes formadores. Os clubes que ajudaram na formação dos atletas dos 14 aos 17 anos de idade terão 1% para cada ano. E aqueles que formarem os jogadores entre os 18 e os 19 anos terão 0,5% por ano.
Uma mudança introduzida pelos deputados dificulta a saída de atletas dos clubes de futebol. As regras de pagamento da indenização a que tem direito o clube formador caso o jogador de futebol se recuse a assinar com essa entidade o primeiro contrato profissional, ou assine com outro clube foram modificadas. Em vez de receber valores vinculados à bolsa paga ao jogador, como ocorre atualmente, o clube formador deverá especificar, no contrato com o jovem atleta, todas as despesas vinculadas à sua formação. A indenização será limitada a 200 vezes os gastos comprovados.
Se o atleta assinar o primeiro contrato profissional com o clube formador, o direito da primeira renovação será exercido com a intermediação da federação regional de futebol, que deverá ter conhecimento da proposta e da resposta do atleta. Na prática, as mudanças dificultam a troca de clube por parte do jogador. Especialistas ouvidos pelo Congresso em Foco veem na alteração uma aproximação com o antigo passe, mecanismo existente quando as equipes eram donas dos jogadores.
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